Transformando marcas em espetáculos: o poder dos eventos e dos games
Marcas para serem bem sucedidas devem exceder a capacidade de geração de valor do seu produto funcional. Se o produto ou serviço de uma marca entregar apenas uma relação funcional, ele passa a ser visto como commodity pelos consumidores, que naturalmente passam a procurar uma relação melhor de custo-benefício ou de preço baixo para que o consumo aconteça. Numa época de crise, como a que vivemos, essa “comoditização” de produtos […] Leia mais
Publicado em 12 de janeiro de 2016 às, 11h01.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 07h48.
Marcas para serem bem sucedidas devem exceder a capacidade de geração de valor do seu produto funcional. Se o produto ou serviço de uma marca entregar apenas uma relação funcional, ele passa a ser visto como commodity pelos consumidores, que naturalmente passam a procurar uma relação melhor de custo-benefício ou de preço baixo para que o consumo aconteça. Numa época de crise, como a que vivemos, essa “comoditização” de produtos passa a ser ainda mais intensa, pois os consumidores passam a racionalizar mais para fazer a compra de mercadorias.
A maneira de se evitar este processo de “comoditização” é trabalhar elementos adicionais de geração de valor, com os quais as marcas passam a entregar como valor a emoção que elas produzem quando estão sendo consumidas, além das relações funcionais. Todos os tipos de produtos, com maior ou menor intensidade, são capazes de produzir relações emocionais que agregam valor para seus consumidores. Este processo de agregação de valor via relações emocionais é chamado de “espetacularização do consumo” por alguns autores.
Espetacularização significa transformar um consumo mundano em algo mais interessante, emocionante, divertido. É transformar um consumo simples em um espetáculo. E este espetáculo traz valor aos produtos. Quando compramos um produto Apple, não pagamos apenas pelo seu hardware e software, por mais competente que eles sejam. Pagamos pelo “espetáculo” que a Apple proporciona, ou seja, a possibilidade de nos sentirmos mais inovadores, mais conectados, mais desafiadores do status quo, os valores defendidos por esta marca no mercado.
Da mesma maneira, não compramos apenas um refrigerante quando consumimos uma Coca Cola, mas a possibilidade de nos tornarmos um pouco mais felizes por meio do consumo do refrigerante, “abrindo a felicidade” como diz o seu slogan. Não consumimos apenas uma cerveja Heineken, mas a possibilidade de nos sentirmos mais sofisticados, mais cosmopolitas, mais globalizados com o consumo da marca.
Mas essas sensações são bastante complexas de serem construídas. Afinal, como transformar em algo espetacular uma lata de alumínio sendo vendida num supermercado qualquer? Para criar a magia de uma marca, é preciso tirá-la da racionalidade do ponto de venda, e mostrar as possibilidades espetaculares de seu consumo. Isso é feito pelas manifestações da marca, a maneira como a marca se comunica com os seus consumidores.
As manifestações de marca podem ser muitas, como a embalagem, a publicidade, e mesmo o preço que é cobrado por ela. No entanto, aquelas que de fato transforam a marca num espetáculo são aquelas que tiram os consumidores do seu cotidiano e os levam para um mundo de fato espetacular. Algumas manifestações claramente são assim, como os eventos de marca.
A Heineken no final deste mês inaugura pela segunda vez em São Paulo o seu projeto “Heineken Up in the Roof”, no qual ela cria um bar que deve transmitir os valores da marca num ambiente de espetáculo (veja mais aqui). A Frutare também fez isso recentemente para os seus sorvetes, lançando uma “loja gourmet” com produtos únicos e personalizados (veja aqui). Mais do que ter um outro ponto de venda, essas marcas querem transformar o consumo de seus produtos de algo corriqueiro em algo espetacular, para aqueles que visitam suas lojas exclusivas.
Mas outro tipo de ação tem ganhado destaque na construção de um espetáculo para os consumidores – a utilização da lógica de “games” para a criação deste envolvimento emocional. A lógica de games tem possibilidades de envolvimento entre marcas e consumidores de maneira ainda mais profunda do que os eventos proprietários. Ao jogar um jogo, a pessoa é imersa em todo um universo único e espetacular, onde as regras do mundo “normal” não se aplicam. É possível distorcer as leis da física, alterar a personalidade das pessoas, criar um novo conjunto de regras para relacionamentos e fazer da experiência do jogo algo que transporte os potenciais consumidores para um mundo diferente. Essa experiência de imersão pode ser bastante relevante na construção de uma marca.
Algumas experiências já feitas foram bem sucedidas. A rede de alimentação americana Chipotle é um desses casos. A marca tem crescido enormemente nos EUA com seu conceito de usar matérias primas mais saudáveis e não processadas, e técnicas de cozimento mais tradicionais. Para transmitir esses valores para os consumidores ela criou um jogo chamado “The Scarecrow”, no qual os consumidores lutam para evitar que uma corporação “maligna” tenha o monopólio do mercado de alimentos. Entenda o conceito e jogue o jogo neste link (em inglês).
A Doritos também teve muito sucesso com o seu jogo “Doritos Crash Course”, um jogo de plataforma que esteve disponível gratuitamente para Xbox e que teve milhões de downloads. Neste caso, a marca teve um envolvimento menor, sendo apenas a “patrocinadora” do jogo, que era disponibilizado gratuitamente. Mas o jogo em si tinha tudo a ver com os atributos que a marca gostaria de passar.
O uso de “games” como uma manifestação de marca ainda é novo, e poucas regras foram criadas para essas interações, mas os cuidados básicos incluem aqueles tomados na concepção de eventos ou “product placement” de marcas, ou seja, a exposição da marca deve ser feita de maneira sutil e adequada, para não dificultar a imersão do consumidor no mundo do game. O jogo deve ser um produto em si, que as pessoas tenham desejo de jogar espontaneamente, numa interação prazerosa e, claro, espetacular.
A nossa própria imersão cada vez maior no “mundo virtual” e na conectividade online parece cada vez mais privilegiar os jogos (que não necessariamente precisam ser apenas eletrônicos) como uma plataforma de comunicação e interação entre marca e consumidor. Feitos com uma estratégia bem desenhada e alinhada com os valores da marca, os jogos podem ser uma excelente maneira de criar espetáculos e, consequentemente, valor de marca.
Em tempo: em conjunto com Vicente Martin, um dos grandes especialistas em games do Brasil, estarei ministrando um curso que discute essas interações cada vez mais constantes entre branding e games, no início de Fevereiro, na Escola São Paulo. Quem se interessar e quiser saber mais a respeito, basta clicar aqui.