Onde está o valor da marca Netflix?
A Netflix é o serviço de streaming mais caro do mercado atualmente e não traz outros benefícios num combo
Colunista
Publicado em 6 de setembro de 2023 às 15h50.
Essa semana fui impactado por um dado da Kantar Worldpanel sobre a penetração e churn dos serviços de streaming na visão global, comparando o desempenho das marcas Netflix, Amazon, Disney, HBO, Paramounte outras.
As conclusões da Kantar mostram uma correlação entre penetração dos serviços na população e o “churn” – o quanto pessoas cancelam os serviços de assinatura. E a atribuem isso a uma força de marca como um “antídoto” para o churn. Mas tem uma análise um pouco mais profunda sobre duas marcas específicas que pode ser feita a partir dos dados.
Explicando um pouco o gráfico:
- No canto direito, temos as marcas com maior penetração do mercado: Amazon e Netflix. E elas são também as que tem menor nível de cancelamento entre os seus usuários.
- No canto esquerdo, temos marcas com menor penetração, e essas são casos em que os cancelamentos (churn) são muito maiores.
Existe uma relação direta então entre força de marca, penetração e cancelamento (Churn)?
No caso dos streamings, os dados indicam que sim. Mas não é possível generalizar esses dados para outras categorias, e nem achar que a correção é direta e idêntica para todas as marcas.
Churn é uma medida que indica lealdade à marca. Marcas mais fortes tem clientes mais leais e eles cancelam menos. Marcas mais fracas tem clientes menos leais e cancelam mais. Mas esse é o único motivo? Com certeza não. Existe também o hábito e o preço. E aqui começa a diferença entre Amazon Prime Video e Netflix.
Amazon é o streaming mais barato do mercado. E ele é disponibilizado num “combo” com outros serviços da Amazon, incluindo o “prime delivery” e o “prime music”. Então a análise aqui não é isolada, e o seu custo-benefício ou preço baixo em relação aos serviços oferecidos ajudam a manter a base de clientes. Pelo valor pago, para que cancelar? Então as pessoas se mantêm assinantes
E a Netflix?
São outras razões, já que é o streaming mais caro (varia em alguns mercados, mas sempre na faixa superior) e não traz outros benefícios num combo. Nesse caso, as pessoas pagam pelo conteúdo que está lá. E aqui temos a clara visualização do resultado de uma marca forte: maior volume (penetração), maiores receitas (assinatura mais cara) e maior nível de lealdade (menor churn). Isso é mapeado desde os anos 90.
Mas a relação entre o valor da marca e o valor do produto – o conteúdo – está intimamente conectado. Afinal, a Netflix não tem um valor “de marca” sozinho, ele está atrelado ao valor do seu conteúdo. Foi assim que a marca foi construída e ganhou relevância.
Atualmente ela tem um capital de marca (ou valor de marca) que faz com que as pessoas assinem e “testem assistir” suas séries. Somente essa audiência cativa já é um enorme valor para a marca. Veja o quanto streamings com menos penetração (como o Paramount +, por exemplo) precisam anunciar para tentar gerar engajamento e visualizações para suas séries. Esse custo a Netflix não tem, ou tem num patamar muito inferior. Isso gera ganho financeiro para a empresa.
Mas a Netflix tem outro valor bastante forte, que vem da capacidade das suas séries fazerem sucesso continuamente, gerando uma RELEVÂNCIA CULTURAL. A relevância cultural é muito importante para gerar valor de marca, e foi discutida por muitos pesquisadores, mas ressalto aqui o trabalho de Douglas Holt, antropólogo, consultor e professor de Harvard e Oxford.
Conteúdo original
As séries da Netflix têm conseguido gerar uma relevância cultural pelas repercussões que tem na sociedade – viram notícia na mídia, posts e discussões no cafezinho – igualzinho a rodada do brasileirão ou a novela das 9h da Globo (nas épocas áureas). Elas monopolizam comentários e discussões, levando a um interesse maior nas pessoas de terem acesso à plataforma. Afinal, quem não está vendo, está fora da discussão. E aí, a mera expectativa de novo sucesso (e claro, até o próprio hábito de abrir o Netflix para ver o que há de novo) já causa uma tendência de permanência na plataforma.
Então temos uma força de marca que foi construída desde a época do “House of Cards”, e que foi mantida mais recentemente pelo “Stranger Things”, “Round 6”, e “Wandinha”. A Netflix consegue impulsionar novos sucessos pela “força da marca”, mas depende do sucesso para se manter relevante. E essa é a conexão entre marca (a plataforma Netflix) e produto (as séries que geram engajamento).
Valor da marca
Nesse caso, o valor da marca está intimamente ligado à entrada de produtos bem-sucedidos. Um não vive sem o outro! Já outras marcas podem gerar valor por outros motivos – como a Amazon com o seu “combo” à preços baixos.
E para a sua marca? De onde está vindo o valor? Saber ler os dados e identificar as fontes geradoras de valor é inestimável para gerenciar marcas adequadamente. E isso é mais que desejável - é imprescindível para conseguir criar marcas bem-sucedidas.
*Marcos Bedendo é sócio consultor da Brandwagon, consultoria especializada em analisar marcas e desenvolver conceitos de marca que incrementam valor. Também é professor de Branding e Marketing na ESPM-SP, FDC, FIA e Ibmec.
Essa semana fui impactado por um dado da Kantar Worldpanel sobre a penetração e churn dos serviços de streaming na visão global, comparando o desempenho das marcas Netflix, Amazon, Disney, HBO, Paramounte outras.
As conclusões da Kantar mostram uma correlação entre penetração dos serviços na população e o “churn” – o quanto pessoas cancelam os serviços de assinatura. E a atribuem isso a uma força de marca como um “antídoto” para o churn. Mas tem uma análise um pouco mais profunda sobre duas marcas específicas que pode ser feita a partir dos dados.
Explicando um pouco o gráfico:
- No canto direito, temos as marcas com maior penetração do mercado: Amazon e Netflix. E elas são também as que tem menor nível de cancelamento entre os seus usuários.
- No canto esquerdo, temos marcas com menor penetração, e essas são casos em que os cancelamentos (churn) são muito maiores.
Existe uma relação direta então entre força de marca, penetração e cancelamento (Churn)?
No caso dos streamings, os dados indicam que sim. Mas não é possível generalizar esses dados para outras categorias, e nem achar que a correção é direta e idêntica para todas as marcas.
Churn é uma medida que indica lealdade à marca. Marcas mais fortes tem clientes mais leais e eles cancelam menos. Marcas mais fracas tem clientes menos leais e cancelam mais. Mas esse é o único motivo? Com certeza não. Existe também o hábito e o preço. E aqui começa a diferença entre Amazon Prime Video e Netflix.
Amazon é o streaming mais barato do mercado. E ele é disponibilizado num “combo” com outros serviços da Amazon, incluindo o “prime delivery” e o “prime music”. Então a análise aqui não é isolada, e o seu custo-benefício ou preço baixo em relação aos serviços oferecidos ajudam a manter a base de clientes. Pelo valor pago, para que cancelar? Então as pessoas se mantêm assinantes
E a Netflix?
São outras razões, já que é o streaming mais caro (varia em alguns mercados, mas sempre na faixa superior) e não traz outros benefícios num combo. Nesse caso, as pessoas pagam pelo conteúdo que está lá. E aqui temos a clara visualização do resultado de uma marca forte: maior volume (penetração), maiores receitas (assinatura mais cara) e maior nível de lealdade (menor churn). Isso é mapeado desde os anos 90.
Mas a relação entre o valor da marca e o valor do produto – o conteúdo – está intimamente conectado. Afinal, a Netflix não tem um valor “de marca” sozinho, ele está atrelado ao valor do seu conteúdo. Foi assim que a marca foi construída e ganhou relevância.
Atualmente ela tem um capital de marca (ou valor de marca) que faz com que as pessoas assinem e “testem assistir” suas séries. Somente essa audiência cativa já é um enorme valor para a marca. Veja o quanto streamings com menos penetração (como o Paramount +, por exemplo) precisam anunciar para tentar gerar engajamento e visualizações para suas séries. Esse custo a Netflix não tem, ou tem num patamar muito inferior. Isso gera ganho financeiro para a empresa.
Mas a Netflix tem outro valor bastante forte, que vem da capacidade das suas séries fazerem sucesso continuamente, gerando uma RELEVÂNCIA CULTURAL. A relevância cultural é muito importante para gerar valor de marca, e foi discutida por muitos pesquisadores, mas ressalto aqui o trabalho de Douglas Holt, antropólogo, consultor e professor de Harvard e Oxford.
Conteúdo original
As séries da Netflix têm conseguido gerar uma relevância cultural pelas repercussões que tem na sociedade – viram notícia na mídia, posts e discussões no cafezinho – igualzinho a rodada do brasileirão ou a novela das 9h da Globo (nas épocas áureas). Elas monopolizam comentários e discussões, levando a um interesse maior nas pessoas de terem acesso à plataforma. Afinal, quem não está vendo, está fora da discussão. E aí, a mera expectativa de novo sucesso (e claro, até o próprio hábito de abrir o Netflix para ver o que há de novo) já causa uma tendência de permanência na plataforma.
Então temos uma força de marca que foi construída desde a época do “House of Cards”, e que foi mantida mais recentemente pelo “Stranger Things”, “Round 6”, e “Wandinha”. A Netflix consegue impulsionar novos sucessos pela “força da marca”, mas depende do sucesso para se manter relevante. E essa é a conexão entre marca (a plataforma Netflix) e produto (as séries que geram engajamento).
Valor da marca
Nesse caso, o valor da marca está intimamente ligado à entrada de produtos bem-sucedidos. Um não vive sem o outro! Já outras marcas podem gerar valor por outros motivos – como a Amazon com o seu “combo” à preços baixos.
E para a sua marca? De onde está vindo o valor? Saber ler os dados e identificar as fontes geradoras de valor é inestimável para gerenciar marcas adequadamente. E isso é mais que desejável - é imprescindível para conseguir criar marcas bem-sucedidas.
*Marcos Bedendo é sócio consultor da Brandwagon, consultoria especializada em analisar marcas e desenvolver conceitos de marca que incrementam valor. Também é professor de Branding e Marketing na ESPM-SP, FDC, FIA e Ibmec.