Marcas das vacinas contra Covid. Quando o branding se torna importante?
A presença do branding no caso das vacinas existe, mas é absolutamente tático
Publicado em 16 de março de 2021 às, 12h02.
Coronavac. CoVacin. Sputinik V. A da Pfizer. A da Sinovac. Oxford/AstraZeneca. A da Moderna. A da Johnson & Johnson. Novavax.
Esses são algumas das maneira como estamos nos referindo às vacinas em diferentes fases de desenvolvimento e aprovação. Mas o nome importa no atual estágio das vacinas? As técnicas de branding são necessárias nesse momento?
Tenho usado esse exemplo em discussões e aulas, pois a corrida pelas vacinas traz um cenário incomum, pouco visto no atual contexto de consumo: a demanda é muito superior à oferta. E isso causa distorções no processo de escolha, o que hoje é raro no nosso super populado mercado consumidor.
O branding e o marketing são pouco relevantes para produtos ou serviços cuja função é tão impactante que a procura por eles acontece naturalmente. O caso da vacina é emblemático, pois a sua relevância torna desnecessária uma estratégia de comercialização ou divulgação. Os governos, especialistas, jornalistas e a população estão fazendo esse papel no lugar das empresas donas das vacinas.
A presença do branding no caso das vacinas existe, mas é absolutamente tático. A vacina precisa ter um nome, precisa ter embalagem, eventualmente possui uma plataforma virtual de comunicação, que foi criado por alguém se valendo de técnicas de branding. Contudo, hoje eles não tem efeito na venda de produto. O CEO dessas empresas tem outras preocupações mais urgentes do que o branding – eles precisam ser capazes de produzir massivamente seus produtos para poder entregar para uma população ávida por consumi-los. O sucesso nesse mercado está em conseguir produzir e vender rapidamente, antes que o mercado se esgote.
Um cenário como esse é tão improvável atualmente que temos que recorrer a um exemplo tão extremo como a vacina, mas não podemos dizer que foi sempre assim. A verdade é que no início do desenvolvimento de muitos mercados havia mais escassez do que abundância. E as categorias tinham incríveis impactos na vida dos consumidores, que passavam a compra-los até o limite dos estoques. Imaginem um produto hoje quase commodity, como um molho de tomate. A diferença de trabalho empregado entre comprar uma lata e fazer o molho é muito relevante. Por isso, o benefício era facilmente percebido e muitos queriam ter acesso ao produto. Faltava, no entanto, um processo eficiente de produção e distribuição para atender a demanda latente. Faltava produto.
Todos os processos administrativos então eram voltados para aumentar as capacidades de produção e distribuição dos produtos. Isso era estratégico para que a empresa crescesse. E o branding? Era visto como uma necessidade tática. Afinal, para embalar o produto era necessário um nome, uma embalagem, uma identidade visual. Mas não eram essas as preocupações do CEO.
Quando então o branding passa a ser importante? Vejamos o caso das vacinas: atualmente ele não é importante já que a procura por elas é tamanha que não estão sendo levados em consideração nem os aspectos funcionais da vacina. Como estamos num momento de alta demanda e baixa oferta, elas serão consumidas independente de suas tecnologias e qualidades.
O mesmo vale para o prosaico molho de tomate. Num momento em que a opção à um molho de qualidade ruim é não se ter um molho, ele passa a ser uma opção aceitável. Mas quando se equaliza oferta e demanda, as escolhas podem ser feitas. Ao se ter disponível dois molhos, pode-se escolher pelo de melhor qualidade.
A vacina segue a mesma lógica. Hoje temos opções mais ou menos eficazes. Todas estão sendo utilizadas. Quando se tiver disponibilidade de mais vacinas, o critério funcional passará a ser utilizado – escolho aquela que é mais eficiente, ainda que possa ser feito um balanço com os custos do uso da vacina (o valor da dose e as dificuldades de armazenamento, por exemplo). Dessa maneira, é natural que com o aumento da oferta de vacinas aquelas de pior qualidade sejam removidas do mercado pelas melhores. Como acontece com qualquer tipo de produto.
Então quando a marca irá fazer diferença? Quando as diferenças funcionais não forem mais representativas. Nesse caso, quando as eficiências são equiparadas, as escolhas de um consumidor podem ser feitas por elementos mais emocionais, ligados à percepção de resultado, e não ao resultado em si.
Com isso, começarão a levar vantagens aquelas que transmitem as sensações mais positivas, ou mais alinhadas às necessidades das categorias. Nesse momento, talvez o renome da Pfizer, ou da Johnson & Johnson nos leve a entender que as suas vacinas são superiores. O prestígio e história da Universidade de Oxford pode emprestar valor à vacina da AstraZeneca. Talvez um nome novo, como do “Laboratório Moderna” possa nos levar a ter uma sensação de tecnologia e superioridade funcional. Nesse caso, as disputas emocionais se tornam relevantes, assim como a necessidade de uma estratégia mais assertiva de desenvolvimento das estratégias de branding.
Para os gestores ou donos de marca, a lição que fica e que é preciso, para cada mercado, para cada situação, entender claramente a importância da marca. Isso levará a empresa a desenvolver as associações corretas de marca. E muitas vezes, para muitos mercados, a marca é estratégica. Mas em outras, ela ainda acaba sendo apenas um elemento tático.
*Marcos Bedendo é professor de branding e marketing da ESPM-SP, FIA, PUC-RS e Ibmec, e sócio consultor da Brandwagon consultoria de branding e pesquisa de mercado.