Habib´s e Ben & Jerry´s entram na política
O último Domingo foi só a primeira apoteose política brasileira em 2016. Com o seguimento do processo de impeachment, haverá outros dias que serão chamados de “históricos” do ponto de vista político. Com tamanha prevalência do assunto na mídia nacional, e com tamanho envolvimento das pessoas, não há como a política não pautar discussões, inclusive sobre marcas. Ainda que com poucos exemplos, hoje já começamos a perceber algumas marcas que […] Leia mais
Da Redação
Publicado em 20 de abril de 2016 às 08h15.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 07h41.
O último Domingo foi só a primeira apoteose política brasileira em 2016. Com o seguimento do processo de impeachment, haverá outros dias que serão chamados de “históricos” do ponto de vista político. Com tamanha prevalência do assunto na mídia nacional, e com tamanho envolvimento das pessoas, não há como a política não pautar discussões, inclusive sobre marcas.
Ainda que com poucos exemplos, hoje já começamos a perceber algumas marcas que tem tido a ousadia de entrar nessa difícil seara.
Falar de política é tão difícil quanto discutir aspectos raciais ou sociais no passado. Ou até mesmo tomar posição por times de futebol. Qualquer assunto polêmico demora para ser assimilado pelas práticas de mercado, e os primeiros esforços sempre surgem de forma pouco consistente. Basta lembrar das rejeições dos Corintianos à marca Parmalat, e de como a Brahma hoje consegue trabalhar de maneira consistente com diversos times.
Para discutir esse assunto, precisamos separar a maneira como as marcas podem fazer isso. E há duas maneiras bastante distintas: somente usando o fato como contexto para propagandas, ou de fato tomando uma posição política.
O Ben & Jerry´s se enquadra no primeiro caso. Este tipo de movimento não pode ser chamado de novo ou incomum. Acontece há muitos anos, e temos muitos exemplos deles no Brasil. Em uma reportagem recente (veja aqui ) a Exame listou algumas dessas iniciativas de marcas.
No melhor estilo “Isentão”, o vídeo viral da Ben & Jerry´s mostrou pessoas que se conhecem e se amam divergindo sobre o impeachment da Presidente, usando o contexto político apenas para passar a imagem já consolidada de “Paz e Amor” que acompanha a marca desde o seu lançamento nos anos 70, pelos hippies Ben Cohen e Jerry Greenfield. (Veja o vídeo aqui ).
Mas a marca em si não toma nenhuma posição política, bem diferente do que a marca Habib´s, que de maneira incisiva, mas meio atabalhoada, tomou posição a favor do impeachment e fez disso uma campanha tática no dia das manifestações do dia 13 de Março.
Essa atitude pode ser explicada pelas posições políticas de seu fundador, Antonio Alberto Saraiva. Muitos empresários possuem posições políticas claras, e inclusive participam, doam e apoiam governos, como o caso de Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza. No entanto, nenhum até agora havia resolvido usar uma posição política como mote de campanha da marca de sua empresa.
Ainda que incomum até aqui, não podemos dizer que o movimento do Habib´s não possa indicar uma tendência futura. No passado, as marcas raramente se envolviam em questões sociais, ambientais ou raciais. E quando o faziam causavam grande alvoroço e indignação. Mas os consumidores passaram a cobrar das marcas que tomem posições, e muitas delas passaram a defender certos posicionamentos.
Tomar posição social hoje é mais comum, mas não menos polêmico. Basta lembrar da repercussão que o caso do Boticário teve no último dia dos namorados, quando defendeu os relacionamentos homossexuais (veja opinião deste blog aqui ). Fruto de uma série de investidas por setores mais tradicionais da sociedade, o Boticário não arredou pé. Fez dele um valor de sua empresa e lidou com o ganho e perda de mercado que isso pode ocasionar.
Para o caso de posições políticas, podemos inferir que o Habib´s incorreu no mesmo risco. Ao tomar posição pro-impeachment, parte de seus consumidores deve ter se tornado mais simpático à marca. Outra parcela, pode ter deixado de consumir o produto. Mas no caso político ainda ocorre um elemento que não havia sido muito discutido no caso das posições sociais: a posição contrária de parte dos funcionários.
O Branding não é apenas um instrumento de comunicação. Ele deve refletir os valores da empresa para que seja bem sucedido. Para que uma posição seja tomada pela marca, os valores da empresa devem ser compartilhados por toda a organização e estar presentes no dia-a-dia da empresa nos comportamento de seus colaboradores. Neste caso, como fazer com funcionários que são a favor do governo Dilma?
Este risco também ocorre em ações como a do Boticário: e os funcionários que não são a favor das uniões homossexuais? Eles devem ser desligados do grupo? No caso de uma posição estratégica, como a tomada pelo Boticário, esse tende a ser o caminho natural. O colaborador, assim como o consumidor, tem que dividir certos valores com as marcas, e se alguns valores centrais forem antagônicos, não é possível ter esse colaborador no quadro de funcionários. Ele mesmo não vai querer e eventualmente irá se desligar.
Retomando o caso Habib´s, como esse debate ocorreu internamente? Ao que parece, a decisão de fazer a campanha não foi dividida com os funcionários, mas qual foi a repercussão interna disso posterior à campanha? Houve rejeição à posição tomada pelo Habib´s?
O Habib´s acabou não apoiando a manifestação no dia da votação do Impeachment na Câmara como o fez no dia 13 de Março, mas ele continuou a usar o mote político para fazer propaganda. Nesta semana, estreou uma campanha que fazia alusão ao “cair” do mandato da presidente Dilma para falar da queda no preço da Esfirra de Frango. Veja a seguir:
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=T7xKQhgOyLE?feature=oembed&w=810&h=456%5D
Se o fator político vai se tornar frequente na comunicação, e na marca Habib´s, ainda não podemos dizer.
Entretanto, na atual conjuntura, parece inevitável que o debate político entrará no mundo das marcas. Atentemos para que esse debate seja feito olhando todos os impactos que o Branding deve ter, tanto externamente como também internamente.
Marcos Bedendo é professor de marketing e branding da ESPM-SP, e consultor da Brandwagon Consultoria de Branding e Inovação.
O último Domingo foi só a primeira apoteose política brasileira em 2016. Com o seguimento do processo de impeachment, haverá outros dias que serão chamados de “históricos” do ponto de vista político. Com tamanha prevalência do assunto na mídia nacional, e com tamanho envolvimento das pessoas, não há como a política não pautar discussões, inclusive sobre marcas.
Ainda que com poucos exemplos, hoje já começamos a perceber algumas marcas que tem tido a ousadia de entrar nessa difícil seara.
Falar de política é tão difícil quanto discutir aspectos raciais ou sociais no passado. Ou até mesmo tomar posição por times de futebol. Qualquer assunto polêmico demora para ser assimilado pelas práticas de mercado, e os primeiros esforços sempre surgem de forma pouco consistente. Basta lembrar das rejeições dos Corintianos à marca Parmalat, e de como a Brahma hoje consegue trabalhar de maneira consistente com diversos times.
Para discutir esse assunto, precisamos separar a maneira como as marcas podem fazer isso. E há duas maneiras bastante distintas: somente usando o fato como contexto para propagandas, ou de fato tomando uma posição política.
O Ben & Jerry´s se enquadra no primeiro caso. Este tipo de movimento não pode ser chamado de novo ou incomum. Acontece há muitos anos, e temos muitos exemplos deles no Brasil. Em uma reportagem recente (veja aqui ) a Exame listou algumas dessas iniciativas de marcas.
No melhor estilo “Isentão”, o vídeo viral da Ben & Jerry´s mostrou pessoas que se conhecem e se amam divergindo sobre o impeachment da Presidente, usando o contexto político apenas para passar a imagem já consolidada de “Paz e Amor” que acompanha a marca desde o seu lançamento nos anos 70, pelos hippies Ben Cohen e Jerry Greenfield. (Veja o vídeo aqui ).
Mas a marca em si não toma nenhuma posição política, bem diferente do que a marca Habib´s, que de maneira incisiva, mas meio atabalhoada, tomou posição a favor do impeachment e fez disso uma campanha tática no dia das manifestações do dia 13 de Março.
Essa atitude pode ser explicada pelas posições políticas de seu fundador, Antonio Alberto Saraiva. Muitos empresários possuem posições políticas claras, e inclusive participam, doam e apoiam governos, como o caso de Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza. No entanto, nenhum até agora havia resolvido usar uma posição política como mote de campanha da marca de sua empresa.
Ainda que incomum até aqui, não podemos dizer que o movimento do Habib´s não possa indicar uma tendência futura. No passado, as marcas raramente se envolviam em questões sociais, ambientais ou raciais. E quando o faziam causavam grande alvoroço e indignação. Mas os consumidores passaram a cobrar das marcas que tomem posições, e muitas delas passaram a defender certos posicionamentos.
Tomar posição social hoje é mais comum, mas não menos polêmico. Basta lembrar da repercussão que o caso do Boticário teve no último dia dos namorados, quando defendeu os relacionamentos homossexuais (veja opinião deste blog aqui ). Fruto de uma série de investidas por setores mais tradicionais da sociedade, o Boticário não arredou pé. Fez dele um valor de sua empresa e lidou com o ganho e perda de mercado que isso pode ocasionar.
Para o caso de posições políticas, podemos inferir que o Habib´s incorreu no mesmo risco. Ao tomar posição pro-impeachment, parte de seus consumidores deve ter se tornado mais simpático à marca. Outra parcela, pode ter deixado de consumir o produto. Mas no caso político ainda ocorre um elemento que não havia sido muito discutido no caso das posições sociais: a posição contrária de parte dos funcionários.
O Branding não é apenas um instrumento de comunicação. Ele deve refletir os valores da empresa para que seja bem sucedido. Para que uma posição seja tomada pela marca, os valores da empresa devem ser compartilhados por toda a organização e estar presentes no dia-a-dia da empresa nos comportamento de seus colaboradores. Neste caso, como fazer com funcionários que são a favor do governo Dilma?
Este risco também ocorre em ações como a do Boticário: e os funcionários que não são a favor das uniões homossexuais? Eles devem ser desligados do grupo? No caso de uma posição estratégica, como a tomada pelo Boticário, esse tende a ser o caminho natural. O colaborador, assim como o consumidor, tem que dividir certos valores com as marcas, e se alguns valores centrais forem antagônicos, não é possível ter esse colaborador no quadro de funcionários. Ele mesmo não vai querer e eventualmente irá se desligar.
Retomando o caso Habib´s, como esse debate ocorreu internamente? Ao que parece, a decisão de fazer a campanha não foi dividida com os funcionários, mas qual foi a repercussão interna disso posterior à campanha? Houve rejeição à posição tomada pelo Habib´s?
O Habib´s acabou não apoiando a manifestação no dia da votação do Impeachment na Câmara como o fez no dia 13 de Março, mas ele continuou a usar o mote político para fazer propaganda. Nesta semana, estreou uma campanha que fazia alusão ao “cair” do mandato da presidente Dilma para falar da queda no preço da Esfirra de Frango. Veja a seguir:
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=T7xKQhgOyLE?feature=oembed&w=810&h=456%5D
Se o fator político vai se tornar frequente na comunicação, e na marca Habib´s, ainda não podemos dizer.
Entretanto, na atual conjuntura, parece inevitável que o debate político entrará no mundo das marcas. Atentemos para que esse debate seja feito olhando todos os impactos que o Branding deve ter, tanto externamente como também internamente.
Marcos Bedendo é professor de marketing e branding da ESPM-SP, e consultor da Brandwagon Consultoria de Branding e Inovação.