A Risqué e a falta de bom senso no marketing
Olhando para alguns novos produtos e campanhas de comunicação que andam acontecendo, me lembrei de uma frase de um dos primeiros planos de marketing com o qual tive contato. No primeiro slide, onde se abordavam as premissas, uma frase dizia “Todas as ações de marketing propostas devem ser a favor da marca”. Eu, inocentemente, ri e pensei: Mas é claro. Quem planejaria ações de marketing CONTRA a própria marca? Mais […] Leia mais
Publicado em 25 de março de 2015 às, 09h16.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 08h06.
Olhando para alguns novos produtos e campanhas de comunicação que andam acontecendo, me lembrei de uma frase de um dos primeiros planos de marketing com o qual tive contato. No primeiro slide, onde se abordavam as premissas, uma frase dizia “Todas as ações de marketing propostas devem ser a favor da marca”. Eu, inocentemente, ri e pensei: Mas é claro. Quem planejaria ações de marketing CONTRA a própria marca?
Mais de uma década depois, vejo que talvez esta frase se faça cada vez mais necessária. São muitos os exemplos de ações de marketing absolutamente contrárias à construção de valor para as marcas. E estes últimos meses tem sido especiais, sobretudo no que se refere à falta de critério de algumas empresas e de seus profissionais ao aprovar produtos e campanhas.
A Skol abriu a temporada dizendo para se “esquecer o não em casa”, o que foi interpretado por muitas mulheres como uma afirmação a favor dos exageros das investidas masculinas durante o carnaval. Depois a UseHuck, a grife de roupas do Luciano Huck, incluiu a estampa “vem ni mim que eu to facim” em uma de suas camisetas, prejudicando a imagem da marca talvez irremediavelmente (o site está em manutenção desde a polêmica, veja aqui). O fato da estampa ter sido incluída em camisetas infantis foi um absurdo a mais em uma ação que já tinha tudo para causar repercussão negativa.
Mas a Risqué conseguiu superar as anteriores em termos de falta de sensibilidade e de bom senso. Na semana passada ela lançou uma coleção de esmaltes que “homenageia” certas atitudes dos homens em relação às mulheres, denominada “homens que amamos”. Se colocado desta maneira, não parece uma má ideia. Afinal, poderíamos aplaudir o homem contemporâneo que decidiu dar um tempo na sua carreira para poder estar mais próximo dos filhos, deixando sua esposa mais livre para perseguir seus objetivos profissionais. Ou o que não se importa com os relacionamentos anteriores da sua atual companheira, para citar outra polemica recente na internet, o “eu não mereço mulher rodada” (veja o caso aqui). Enfim, há atitudes masculinas que, apesar de não serem absolutamente novas ou inesperadas, ainda são de certa maneira incomuns e merecem ser destacadas. Contudo, não foi o caso.
A Risqué tratou sua consumidora como alguém com baixíssima autoestima. A maneira como a nova linha de produtos foi desenhada deu a entender que qualquer tipo de afago por parte do homem, como enviar uma mensagem no celular (!), mandar flores, ou fazer um jantar, deveria ser motivo de comemoração e felicidade para a mulher. E nada mais eficiente para estragar o relacionamento com seus consumidores do que subestima-los desta maneira. A campanha teria tido repercussões negativas nos anos 60. Mas estamos em 2015. A Risquè conseguiu fazer parte da fofoca de todos os salões de cabeleireiro do Brasil, e de todos com uma conta em redes sociais, da pior maneira possível.
Sem dúvida estamos em uma época em que os ânimos estão exaltados. Que pequenos deslizes fazem uma marca virar alvo de, às vezes exagerados, ataques virtuais. E pequenas ações de marketing podem causar impactos negativos incríveis. Um exagero de tom foi a razão da crítica à Skol. Mas foram alguns painéis numa campanha enorme. A UseHuck cometeu um erro grotesco. Mas ainda assim, um erro, que a marca assumiu e pediu desculpas. Já a Risqué, tendo lançado uma linha de produtos de maneira planejada, não tem a prerrogativa de dizer que foi sem querer.
O marketing sempre foi uma área que teve como premissa o olhar cuidadoso sobre a comunicação da marca, com uma ponderação criteriosa sobre os possíveis impactos negativos de cada ação. Ser “inovador”, ou “impactante”, não significa ser descuidado e atabalhoado. Talvez seja a hora de incluirmos no primeiro slide de cada plano de marketing a frase “todas as ações propostas deverão ser a favor da marca”. Parece que ela é cada vez mais necessária. Ou de talvez incluirmos a matéria “Bom Senso em Marketing” nos cursos de graduação e pós-graduação, já que parece que ele anda em falta.