(Leonidas Santana/Getty Images)
Publicado em 9 de junho de 2025 às 10h22.
Última atualização em 9 de junho de 2025 às 11h24.
*Renata Bley
Em um cenário global de competição feroz, proteger a indústria nacional não é apenas uma escolha estratégica, é uma necessidade econômica. Governos de todos os países adotam medidas econômicas há décadas com firmeza, clareza, transparência e imparcialidade, utilizando os instrumentos disponíveis dentro das regras multilaterais e regida por órgãos, como a Organização Mundial do Comércio (OMC).
E o Brasil, por sua vez, começa a dar sinais de que compreende o papel das tarifas antidumping como uma ferramenta legítima de política comercial. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) desempenha o papel central na condução dessas iniciativas, seguindo rigorosamente os procedimentos reconhecidos pela OMC e alinhando o país às melhores práticas globais, além de defender a economia interna.
É importante lembrar que a tarifa antidumping – diferentemente do que alguns tentam afirmar – não é uma medida protecionista ou arbitrária. Trata-se de um mecanismo legal, previsto nos acordos internacionais de livre comércio, que visa corrigir distorções provocadas por países ou empresas que adotam políticas agressivas para conquistar mercados internacionais de forma desleal. Em outras palavras, não é uma escolha de empresas ou de setores; é uma decisão soberana do Estado brasileiro, amparada por dados técnicos, e que visa garantir equilíbrio e previsibilidade para o ambiente de negócios.
E o Brasil também deve adotá-las, com responsabilidade, coerência e embasamentos técnico, econômico e comercial. O mercado nacional precisa ser impulsionado e com saúde financeira para reparar danos causados por outros países.
Para além do caso brasileiro, vale observar que medidas antidumping continuam sendo adotadas com regularidade por diversas economias desenvolvidas. Um exemplo recente foi a decisão da Comissão Europeia, que impôs tarifas antidumping sobre o PVC importado dos Estados Unidos e do Egito. A medida foi tomada após a identificação de prejuízos à indústria local europeia, causados pela prática de exportações a preços significativamente inferiores ao valor normal. De acordo com a apuração, o volume importado afetou diretamente o market share de produtores europeus, levando à necessidade de uma intervenção formal para restabelecer as condições de competição.
Esse é um claro exemplo de que países de economia avançada utilizam esse mecanismo com seriedade e objetividade, justamente para garantir que suas indústrias não sejam esmagadas por práticas comerciais desleais. Se os Estados Unidos, a União Europeia, a China e tantos outros países defendem seus setores estratégicos dessa forma, por que o Brasil não deveria fazer o mesmo?
Recentemente, a indústria petroquímica nacional tem sofrido os efeitos diretos da concorrência desleal. Com a ampliação abrupta da capacidade produtiva em mercados como China e Estados Unidos, houve uma queda drástica nos preços internacionais de resinas plásticas. Esses países passaram a exportar para o Brasil a valores inferiores aos praticados em seus próprios mercados internos. No caso do polietileno, por exemplo, dados apontam descontos de até 21,4% nas exportações dos EUA e 26,9% nas do Canadá. Como resultado, 70% das importações brasileiras de polietileno em 2024 vieram desses dois países.
O impacto disso vai muito além da perda de market share. Quando uma empresa nacional perde competitividade por conta do dumping, ela também fica sem capital para investir e para inovar, postos de trabalho são eliminados e cadeias produtivas inteiras sofrem com a instabilidade. Tarifas antidumping ajudam a mitigar esse ciclo de prejuízo, restabelecendo condições mais justas de competição.
Importante esclarecer que medidas antidumping não representam subsídios ou transferências financeiras para as empresas nacionais; são recursos direcionados ao Tesouro Nacional, e sua finalidade é apenas corrigir uma anomalia do mercado.
Vale destacar que o MDIC tem atuado com responsabilidade e transparência ao analisar cada pedido de abertura de investigação. As empresas que se sentem prejudicadas por concorrência desleal apresentam os dados - cabe ao governo conduzir a investigação e, se comprovado o dumping e seu dano, aplicar a tarifa adequada. Esse processo é complexo e exige a comprovação de três pilares fundamentais: a existência do dumping, o dano significativo à indústria nacional e o nexo de causalidade entre ambos. Trata-se de uma atuação responsável do Estado em defesa da economia.
Não se trata de proteção incondicional, tampouco de um privilégio setorial. É política comercial com foco no desenvolvimento econômico. Em um momento em que o mundo inteiro busca reindustrializar suas economias e preservar empregos de qualidade, o Brasil precisa ser assertivo e coerente com seus objetivos estratégicos. A indústria de transformação ainda responde por parte significativa do PIB, dos empregos qualificados e da inovação no país. Deixá-la vulnerável a práticas desleais é abdicar do protagonismo econômico que tanto buscamos.
Em suma, medidas antidumping devem ser vistas como o que são: ferramentas sérias de uma política comercial ativa e que visa reparar danos causados pela concorrência desleal oriunda da exportação a preços muito baixos. A atuação do MDIC, nesse contexto, é essencial, e o setor empresarial deve apoiar, com dados e transparência, esse movimento de defesa dos interesses nacionais. É garantir que a competição ocorra em condições justas. Defender a indústria é defender empregos, arrecadação, tecnologia e soberania.
* Renata Bley é Diretora de Relações Institucionais e Global Advocacy da Braskem