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Admirável mundo novo: Trump impulsiona a reorganização geopolítica global

O impacto de longo prazo será a ascensão da China como parceiro estratégico de vários países

O presidente dos EUA, Donald Trump, embarca no Air Force One na Base Aérea da RAF de Lossiemouth, nordeste da Escócia, em 29 de julho de 2025, no final de sua viagem à Escócia. (Foto de Brendan SMIALOWSKI / AFP)

O presidente dos EUA, Donald Trump, embarca no Air Force One na Base Aérea da RAF de Lossiemouth, nordeste da Escócia, em 29 de julho de 2025, no final de sua viagem à Escócia. (Foto de Brendan SMIALOWSKI / AFP)

Publicado em 3 de agosto de 2025 às 15h12.

Última atualização em 5 de agosto de 2025 às 10h05.

Por Paulo Dalla Nora Macedo*

Trump queria frear a perda de poder relativo dos Estados Unidos, mas está acelerando em uma descida. Como resultado, está impulsionando a velocidade da reorganização geopolítica global, fazendo dos Estados Unidos o grande perdedor.

A ordem mundial em que vivemos foi construída sobre os escombros da Segunda Guerra Mundial, com os Estados Unidos como o grande beneficiário e fiador: regras para o comércio foram estabelecidas em um esforço para abrir e incluir mercados. Foi assim que o mundo avançou em um estágio de globalização, onde as ferramentas e sistemas de comunicação nas mãos de bilhões de pessoas em todos os continentes são predominantemente americanos.

No entanto, Trump acredita que esse sistema “deixou os Estados Unidos para trás”. Para ele, o desenvolvimento de outros países ocorre às custas da América.  O que importa para Trump é a posição relativa, não a posição absoluta dos EUA. Quem tem casa em um condomínio no campo ou na praia entende bem esse efeito em relação ao tamanho da piscina da vizinhança. A diferença é que estamos discutindo formulações geopolíticas para a maior potência econômica e militar do planeta.

Munido dessa crença, Trump utilizou a ferramenta que conhece bem, adquirida no mercado imobiliário de Nova Iorque: a chantagem pela imposição de termos comerciais desfavoráveis para os parceiros. Com os empreiteiros, ele costumava ameaçar a não realização de pagamentos; agora, a ferramenta mais semelhante que tem em mãos são as tarifas.

É assim que está redesenhando a ordem mundial: com um martelo onde as peças de suporte são pinças sextavadas. Com o Brasil, ele deseja influenciar quais candidatos poderão concorrer em 2026; com a Europa, quer forçar vastos investimentos nos EUA. Até a Suíça, que não representa uma ameaça econômica ou militar aos EUA, recebeu uma tarifa de 39%.

A Universidade de Yale calcula que, em 7 de agosto, os Estados Unidos terão uma tarifa média de importação de 18%, oito vezes maior do que era antes de Trump assumir em janeiro deste ano. Isso é equivalente, não por acaso, à tarifa durante a Grande Depressão–o período antes da Segunda Guerra, quando o comércio global declinou, e que Trump sonha trazer de volta como uma era dourada.

O resultado imediato disso será o encarecimento dos produtos para os consumidores americanos. A Goldman Sachs estima que, até agora, as empresas e consumidores dos EUA têm suportado 80% dos custos adicionais gerados pelas tarifas.

O impacto de longo prazo será a ascensão da China como parceiro estratégico de vários países e, mais notavelmente, um esforço para a independência geopolítica da Europa. Depois de 80 anos sem uma política externa totalmente independente dos EUA devido à barganha pela proteção militar da OTAN, a Europa se preparará para amadurecer politicamente. Este movimento é inevitável; hoje, aceita um acordo desfavorável porque não tem meios de se defender sozinha, mas em 10 anos a situação será diferente.

O Brasil também indica que usará essa oportunidade para tentar se consolidar como líder da América Latina, com o Presidente Lula optando por confrontar publicamente Trump, conforme observou na semana passada o New York Times.

Não adianta, do ponto de vista prático, afirmar que não concorda com esse caminho, pois a indicação é de que esse foi o escolhido. Melhor preparar os negócios para uma longa disputa com os EUA, que terá vários rounds e deve piorar. Mas se alguém quer saber minha opinião: politicamente, Lula está certo. Esta é uma oportunidade, passando a cavalo selado, para entrar para a história política brasileira como alguém maior que Vargas. Se ele não agisse assim, seria um sinal de senilidade e não deveria concorrer em 2026. Política é assim.

*Paulo Dalla Nora Macedo é economista e cofundador do Lisboa Connection

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