Como crescer sem perder a cabeça e o jeito de startup?
"A verdade é que toda startup nasce com o sonho de se tornar uma grande empresa"
Da Redação
Publicado em 29 de outubro de 2021 às 15h43.
Por Bernardo Carneiro
Quando comecei a empreender, o ambiente para criar uma empresa do zero aqui no Brasil ainda era inóspito. Não havia incentivo, o dinheiro para começar era escasso e os consumidores não tinham confiança nos serviços. Era realmente outro cenário comparado ao que temos hoje. O empreendedorismo cresceu, assim como a disposição do setor financeiro para investir em negócios promissores. Criou-se, assim, um ecossistema saudável capaz de suportar o surgimento de novos negócios. E este modus operandi das startups, com uma gestão ágil e enxuta, contrasta com o modelo mais engessado e muitas vezes inflado das grandes empresas já estabelecidas, que por serem muito grandes não têm a mesma rapidez para tocar as transformações desejadas.
Uma companhia listada em bolsa de valores e com muitos acionistas é sempre pressionada pelos resultados. A cada trimestre há a expectativa do mercado de apresentar um balanço positivo. Esse tipo de consciência cria uma cultura de que novas ideias precisam gerar resultados no curto prazo – caso contrário, são automaticamente vetadas ou despriorizadas. E com isso, a inovação corre o risco de ser colocada em segundo plano. Quem vai correr o risco de apostar em algo novo que pode ou não dar certo em vez de manter e apostar no certo para continuar com as contas equilibradas?
Não por acaso bons profissionais estão renunciando altos cargos em grandes corporações para trabalharem em startups – pois essas gostam de dizer “sim” para os riscos. Estratégias tradicionais, que visam aumentar ganhos mitigando riscos, não são mais tão atrativas para os jovens que estão entrando no mercado de trabalho. Para essa nova geração, incentivos como bônus anual costumam valer menos que o desafio de fazer algo novo e disruptivo. O propósito, aprendizado, ambiente e as pessoas do time estão sendo cada vez mais valorizados e decisivos na definição de carreira.
Ao lado do cliente sempre
Outra característica que difere as grandes companhias das startups é o distanciamento do cliente. Quando uma empresa ganha uma fatia generosa do mercado , é provável que corte a relação direta com seus consumidores finais. As ideias e as estratégias surgem de dentro para fora, com a ajuda de consultorias e dados que servem como base para definir o que o cliente precisa, mas isso tudo sem ouví-lo realmente. A falta de tempo dedicado aos consumidores faz com que as empresas não se antecipem às tendências, pois estão sempre cheias de reuniões internas. É assim que surgem as brechas que permitem que as startups surjam e consigam disruptar o mercado.
CEOs x Fundadores
O comando também faz diferença. Os fundadores de startups têm o propósito e a obsessão em construir algo, na busca de resolver um problema da sociedade. São movidos pelo desejo de realizar e em geral têm mais liberdade de ação. Diferentemente dos CEOs de empresas estabelecidas, que normalmente são contratados por um conselho, cujo maior desejo é ver a curva do crescimento sempre ascendente para as suas ações subirem.
Sei que não dá para generalizar. Há bons exemplos de executivos que têm um grande espírito empreendedor e estão sempre perseguindo a inovação, mas a cobrança por resultados, estrutura de incentivos e posicionamento frequente de mitigar os riscos certamente são um obstáculo a mais nos planos de longo prazo. Em vez de se construir e melhorar, eles são cobrados por realizar uma grande lista de tarefas.
Comunicação facilitada
No quesito comunicação, as empresas recém-criadas também levam vantagem. Quem trabalhou em startup deve saber que, algumas vezes, a equipe se comunica pelo olhar. Essa proximidade facilita e agiliza a comunicação, fortalece o senso de equipe permitindo que problemas possam ser resolvidos em um ou dois dias. De forma direta e pragmática os desafios são resolvidos, o ego fica de lado, pois todos precisam fazer algo acontecer e rápido. Enquanto nas gigantes, é necessário marcar uma reunião, o que, na maioria das vezes, torna-se um evento que demora semanas para acontecer. Além disso, com um número de pessoas envolvidas, que pode chegar a dezenas, não é possível garantir que todos estejam na mesma página quanto ao assunto, o que atrasa ainda mais o processo. Isso tudo acaba gerando excesso de reuniões, encontros improdutivos e uma complexidade muito grande para perseguir um foco ou prioridade.
Hora de mudar
A verdade é que toda startup nasce com o sonho de se tornar uma grande empresa. Ao mesmo tempo, grandes empresas desejam ter o jeito de ser e de fazer de uma startup. Esse é um grande dilema! O ponto de equilíbrio é achar uma forma de criar processos de tal modo que não massacrem os talentos, afinal eles podem criar, a qualquer momento, uma grande oportunidade para a companhia.
Empresas estabelecidas lucram bilhões e, por isso, não sentem a urgência de mudar. Isso pode funcionar agora, mas no longo prazo, muitas vezes é fatal. Walter Longo tem uma frase que diz que “no novo ambiente pós-digital, as empresas não morrem por fazerem coisas erradas, morrem por fazer a coisa certa por um tempo longo demais”. Para não cair nessa armadilha, um bom primeiro passo é redesenhar o design organizacional, através de um organograma horizontal e com pouca hierarquia, fazendo com que as informações corram sem ruído. Dividir a empresa em times menores, com lideranças e missões claras, também é bastante eficiente para descentralizar o processo de tomada de decisão, pois as pessoas não dependerão só dos diretores para iniciar novos projetos.
Outro passo necessário, talvez o mais importante, é fazer com que a essência permaneça igual independentemente do tamanho e do passar dos anos. Com certeza, o fundador criou o negócio com um propósito, e é dever das próximas gerações de líderes não deixar que o lucro se torne mais importante que essa missão. Um jeito de fazer isso é desenhar e manter rituais de cultura que disseminem o jeito de ser, fazer e a forma de pensar da companhia. Assim, a empresa cresce, mas continua com a cabeça e o mindset de startup.
Por Bernardo Carneiro
Quando comecei a empreender, o ambiente para criar uma empresa do zero aqui no Brasil ainda era inóspito. Não havia incentivo, o dinheiro para começar era escasso e os consumidores não tinham confiança nos serviços. Era realmente outro cenário comparado ao que temos hoje. O empreendedorismo cresceu, assim como a disposição do setor financeiro para investir em negócios promissores. Criou-se, assim, um ecossistema saudável capaz de suportar o surgimento de novos negócios. E este modus operandi das startups, com uma gestão ágil e enxuta, contrasta com o modelo mais engessado e muitas vezes inflado das grandes empresas já estabelecidas, que por serem muito grandes não têm a mesma rapidez para tocar as transformações desejadas.
Uma companhia listada em bolsa de valores e com muitos acionistas é sempre pressionada pelos resultados. A cada trimestre há a expectativa do mercado de apresentar um balanço positivo. Esse tipo de consciência cria uma cultura de que novas ideias precisam gerar resultados no curto prazo – caso contrário, são automaticamente vetadas ou despriorizadas. E com isso, a inovação corre o risco de ser colocada em segundo plano. Quem vai correr o risco de apostar em algo novo que pode ou não dar certo em vez de manter e apostar no certo para continuar com as contas equilibradas?
Não por acaso bons profissionais estão renunciando altos cargos em grandes corporações para trabalharem em startups – pois essas gostam de dizer “sim” para os riscos. Estratégias tradicionais, que visam aumentar ganhos mitigando riscos, não são mais tão atrativas para os jovens que estão entrando no mercado de trabalho. Para essa nova geração, incentivos como bônus anual costumam valer menos que o desafio de fazer algo novo e disruptivo. O propósito, aprendizado, ambiente e as pessoas do time estão sendo cada vez mais valorizados e decisivos na definição de carreira.
Ao lado do cliente sempre
Outra característica que difere as grandes companhias das startups é o distanciamento do cliente. Quando uma empresa ganha uma fatia generosa do mercado , é provável que corte a relação direta com seus consumidores finais. As ideias e as estratégias surgem de dentro para fora, com a ajuda de consultorias e dados que servem como base para definir o que o cliente precisa, mas isso tudo sem ouví-lo realmente. A falta de tempo dedicado aos consumidores faz com que as empresas não se antecipem às tendências, pois estão sempre cheias de reuniões internas. É assim que surgem as brechas que permitem que as startups surjam e consigam disruptar o mercado.
CEOs x Fundadores
O comando também faz diferença. Os fundadores de startups têm o propósito e a obsessão em construir algo, na busca de resolver um problema da sociedade. São movidos pelo desejo de realizar e em geral têm mais liberdade de ação. Diferentemente dos CEOs de empresas estabelecidas, que normalmente são contratados por um conselho, cujo maior desejo é ver a curva do crescimento sempre ascendente para as suas ações subirem.
Sei que não dá para generalizar. Há bons exemplos de executivos que têm um grande espírito empreendedor e estão sempre perseguindo a inovação, mas a cobrança por resultados, estrutura de incentivos e posicionamento frequente de mitigar os riscos certamente são um obstáculo a mais nos planos de longo prazo. Em vez de se construir e melhorar, eles são cobrados por realizar uma grande lista de tarefas.
Comunicação facilitada
No quesito comunicação, as empresas recém-criadas também levam vantagem. Quem trabalhou em startup deve saber que, algumas vezes, a equipe se comunica pelo olhar. Essa proximidade facilita e agiliza a comunicação, fortalece o senso de equipe permitindo que problemas possam ser resolvidos em um ou dois dias. De forma direta e pragmática os desafios são resolvidos, o ego fica de lado, pois todos precisam fazer algo acontecer e rápido. Enquanto nas gigantes, é necessário marcar uma reunião, o que, na maioria das vezes, torna-se um evento que demora semanas para acontecer. Além disso, com um número de pessoas envolvidas, que pode chegar a dezenas, não é possível garantir que todos estejam na mesma página quanto ao assunto, o que atrasa ainda mais o processo. Isso tudo acaba gerando excesso de reuniões, encontros improdutivos e uma complexidade muito grande para perseguir um foco ou prioridade.
Hora de mudar
A verdade é que toda startup nasce com o sonho de se tornar uma grande empresa. Ao mesmo tempo, grandes empresas desejam ter o jeito de ser e de fazer de uma startup. Esse é um grande dilema! O ponto de equilíbrio é achar uma forma de criar processos de tal modo que não massacrem os talentos, afinal eles podem criar, a qualquer momento, uma grande oportunidade para a companhia.
Empresas estabelecidas lucram bilhões e, por isso, não sentem a urgência de mudar. Isso pode funcionar agora, mas no longo prazo, muitas vezes é fatal. Walter Longo tem uma frase que diz que “no novo ambiente pós-digital, as empresas não morrem por fazerem coisas erradas, morrem por fazer a coisa certa por um tempo longo demais”. Para não cair nessa armadilha, um bom primeiro passo é redesenhar o design organizacional, através de um organograma horizontal e com pouca hierarquia, fazendo com que as informações corram sem ruído. Dividir a empresa em times menores, com lideranças e missões claras, também é bastante eficiente para descentralizar o processo de tomada de decisão, pois as pessoas não dependerão só dos diretores para iniciar novos projetos.
Outro passo necessário, talvez o mais importante, é fazer com que a essência permaneça igual independentemente do tamanho e do passar dos anos. Com certeza, o fundador criou o negócio com um propósito, e é dever das próximas gerações de líderes não deixar que o lucro se torne mais importante que essa missão. Um jeito de fazer isso é desenhar e manter rituais de cultura que disseminem o jeito de ser, fazer e a forma de pensar da companhia. Assim, a empresa cresce, mas continua com a cabeça e o mindset de startup.