Aquela piada sobre o outro nunca coube, mas hoje está condenada e as novas gerações cobram, com razão, uma atitude mais responsável dos nossos líderes (hamzaturkkol/Getty Images)
Autor do livro "Você em Ação"
Publicado em 3 de outubro de 2025 às 13h57.
Nunca se falou tanto em liderança. Nunca se ofereceram tantos cursos, mentorias e formações. Nunca se escreveram tantos livros sobre o assunto. E, paradoxalmente, nunca tivemos tantos líderes despreparados, tantos times adoecidos e tantas empresas sofrendo com um dilema que deveria ser simples: a liderança pode inspirar ou pode pirar.
O dilema é real, urgente e invisível. Real porque impacta resultados e vidas. Urgente porque o adoecimento mental no trabalho virou epidemia global. Invisível porque a maior parte dos líderes sequer percebe o tamanho do efeito que exerce sobre as pessoas.
E aqui começa a provocação: quantos gestores hoje realmente inspiram? E quantos estão apenas pirando e levando seus times junto?
Se até pouco tempo atrás muitos gestores se escondiam atrás de planilhas, relatórios e rotinas de controle, esse tempo acabou.
Com a aceleração da inteligência artificial, tarefas analíticas, repetitivas e de monitoramento serão feitas de forma mais rápida, barata e precisa pelas máquinas.
Isso significa que o espaço da liderança muda radicalmente:
E quando tudo isso estiver automatizado, o que sobrará?
A parte mais difícil. A parte mais nobre. A parte que nenhuma máquina pode entregar: inspirar pessoas, dar sentido ao trabalho, criar vínculos de confiança, gerar cultura e propósito.
No futuro próximo, liderar não será sobre apertar parafusos da operação, será sobre acender luzes na consciência e no coração das pessoas.
Quem não entender isso corre sério risco: não de ser substituído pela IA, mas de ser substituído por líderes que realmente sabem inspirar.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a cada 40 segundos uma pessoa comete suicídio no mundo. E uma das principais causas associadas são os ambientes de trabalho tóxicos.
No Brasil, os números são alarmantes:
Agora conecte os pontos: qual é a variável central entre empresas que adoecem pessoas e aquelas que criam ambientes saudáveis? A liderança.
Um gestor que não se autolidera cria um efeito dominó: pressiona, centraliza, desconfia, não ouve. O resultado? Pessoas ansiosas, desmotivadas e, muitas vezes, doentes.
O problema não é técnico. A maior parte dos gestores sabe “o que fazer” em planilhas, metas e indicadores. O problema é humano.
Liderar não é sobre cargos, organogramas ou apresentações em PowerPoint. É sobre gente. E é exatamente aí que muitos piram.
Pesquisas da Gallup mostram que 70% do engajamento dos times depende diretamente da liderança imediata. Ou seja, o líder é o maior fator de impacto no bem-estar (ou no mal-estar) do colaborador.
Ainda assim, milhares de empresas promovem gestores sem preparo algum para lidar com pessoas. O resultado é previsível: egos inflados em cargos de poder e um rastro de equipes adoecidas.
O dilema se materializa todos os dias, em cada decisão aparentemente pequena:
É nesse ponto que líderes se separam: alguns inspiram, outros piram.
Líderes que piram: focam no controle, na cobrança sem direção, na vaidade. Criam culturas de medo, rotatividade alta e ambientes tóxicos.
Líderes que inspiram: lideram pelo exemplo, cuidam de si para cuidar do outro, geram segurança psicológica. Constroem ambientes de confiança, inovação e resultados sustentáveis.
O impacto financeiro é gigantesco — e pouco discutido.
Ou seja, não é só uma questão humana. É também uma questão de negócios. Empresas que negligenciam a qualidade da sua liderança pagam caro, em dinheiro e em reputação.
Aqui está o ponto cego: ninguém pode liderar outro sem liderar a si mesmo primeiro.
E autoliderança não é discurso motivacional. É prática diária de autocuidado, autoconhecimento e coragem para encarar as próprias fragilidades.
Um líder que não se conhece, não se regula emocionalmente e não se cuida, inevitavelmente transfere esse caos para os outros.
O contrário também é verdadeiro: líderes que se autolideram se tornam faróis em meio à incerteza. Inspiram porque são exemplo.
As empresas precisam se perguntar — com honestidade brutal:
Porque no fim, a escolha é binária: ou a liderança inspira… ou ela pira.
O futuro do trabalho não será definido pela tecnologia, pela inteligência artificial ou por novos modelos de negócio. Ele será definido pela qualidade da liderança.
Se a liderança for tóxica, veremos mais afastamentos, mais burnout, mais empresas sem alma.
Se a liderança for inspiradora, veremos mais inovação, mais engajamento e mais resultados sustentáveis.
A escolha está diante de cada gestor, todos os dias.
Você vai inspirar ou vai pirar?