Epstein-Barr: entenda como o vírus funciona ( Yuichiro Chino/Getty Images)
Estagiária de jornalismo
Publicado em 14 de novembro de 2025 às 19h15.
Um vírus que a maioria das pessoas contrai ainda na infância pode ser o responsável por desencadear o lúpus em praticamente 100% dos casos. A conclusão é de um estudo da Universidade de Stanford publicado na revista Science Translational Medicine.
O lúpus eritematoso sistêmico afeta entre 150 e 300 mil pessoas no Brasil segundo a Sociedade Brasileira de Reumatologia, e causa dor nas articulações, fadiga extrema e erupções cutâneas. Trata-se de uma condição crônica na qual o sistema imunológico cria anticorpos que atacam os próprios tecidos do corpo. Sem causa conhecida e sem cura, a doença representa um desafio tanto para pacientes quanto para pesquisadores.
O vilão identificado é o vírus Epstein-Barr (EBV), o causador da Mononucleose, que normalmente causa dor de garganta, febre e amigdalite em diferentes graus. Cerca de 19 em cada 20 adultos já foram infectados pelo vírus, que permanece dormente no DNA das células para sempre. A maioria dos infectados permanece assintomáticos ao longo da vida.
"Praticamente a única maneira de não pegar EBV é viver em uma bolha", disse William Robinson, professor de imunologia e reumatologia em Stanford e autor sênior do estudo. "Se você levou uma vida normal, a probabilidade de ter o vírus é de quase 20 para 1."
A pesquisa revelou que pacientes com lúpus têm 25 vezes mais células B, um tipo de linfócito, infectadas pelo EBV do que pessoas saudáveis.
O vírus se instala em células B autorreativas – aquelas com potencial de atacar o próprio corpo, mas que em indivíduos saudáveis permanecem inativas.
Uma vez infectadas, essas células são reprogramadas por uma proteína viral, que ativa genes específicos e as transforma em células que atacam tecidos do próprio organismo, mas também recrutam outras células imunes para participar do ataque. "O EBV ativa essas células B para impulsionar a resposta autoimune que medeia o lúpus", afirmou Robinson. Outro autor do estudo, Shady Younis, afirmou que o "estudo resolve um mistério de décadas."
A pesquisa também confirma que o EBV não age sozinho. Mulheres são mais afetadas pelo lúpus, possivelmente porque hormônios como o estrogênio amplificam a atividade das células B.
Pessoas com ascendência africana, caribenha ou asiática também apresentam risco maior. Esses fatores, combinados com a presença do vírus, determinam a suscetibilidade individual à doença.
A descoberta abre caminho para novas abordagens terapêuticas. Vacinas contra o EBV já estão em testes clínicos, e a identificação do mecanismo pode acelerar seu desenvolvimento.
Além disso, tratamentos oncológicos que eliminam células B estão sendo explorados para casos graves de lúpus. "Acho que isso realmente prepara o terreno para uma nova geração de terapias que poderiam fundamentalmente tratar e, assim, fornecer benefícios aos pacientes com lúpus", disse Robinson.