A conservação da natureza exige um trabalho diário de conscientização (Floresta Amazônica/Wikimedia Commons)
AFP
Publicado em 16 de agosto de 2018 às 10h51.
Última atualização em 16 de agosto de 2018 às 10h55.
É preciso nadar, mas com cautela, pois há jacarés e piranhas. O que pode ser um desafio para os forasteiros faz parte da rotina dos moradores das Reservas Mamirauá e Amanã, em plena Floresta Amazônica.
Identificar animais e fazer um uso equilibrado dos recursos naturais são essenciais para sobreviver neste ecossistema.
"Tem açaí até no fundo da comunidade, mas por hoje já tiramos o suficiente", resume João, 52, da comunidade Boa Esperança, na Reserva Amanã.
João prepara no chão verde e amarelo de sua casa de madeira o açaí colhido pela manhã pelos membros mais jovens da comunidade.
Para colher o açaí é preciso escalar o açaizeiro, uma palmeira alta, e retirar os frutos que estão a até 20 metros do solo. As crianças praticam diariamente em árvores menores, escalando com um pano amarrado entre os pés, denominado "peconha". O açaí, consumido em todo o pais, é também popular em países ocidentais pelo seu valor nutricional. É uma das principais fontes de renda da região.
A conservação da natureza exige um trabalho diário de conscientização.
Uma das ações do Instituto Mamirauá é o manejo da pesca do Pirarucu (Arapaima), um grande peixe amazônico com alto valor de mercado, que pode chegar a pesar 200kg e medir três metros, muito utilizado na gastronomia local.
Moradores das comunidades, em parceria com o Instituto Mamirauá, estabelecem cotas de pesca que atendam às necessidades dos pescadores e assegurem a reprodução da espécie. Mas nem sempre essa relação se mantém nas linhas que os pesquisadores desejam.
Dona Maria, de 71 anos, passeia por sua casa com um pequeno filhote de macaco Uacari-Branco, uma espécie protegida e símbolo da Reserva. O macaco, com seu característico rosto vermelho, não deveria ser um animal doméstico, mas dona Maria conta, sorridente, que "ele é tipo um cachorrinho. Pegamos ali na mata e fica no meu colo o tempo todo".
O silêncio em São Raimundo do Jarauá, povoado de pouco mais de vinte casas, é interrompido apenas pelos botos que sobem para respirar ou por algum pássaro mais estridente que se funde ao horizonte azul e verde.
Poucos ecos chegam do resto do Brasil. Durante a Copa do Mundo Rússia 2018, uma família da comunidade de São Raimundo do Jarauá abriu sua casa aos cientistas da WWF-Brasil e do Instituto Mamirauá para ver a partida da seleção canarinho em uma televisão ligada a um gerador a diesel.
Mas o restante dos moradores parecia indiferente a Neymar e sua equipe: uma família conversava sem prestar atenção à televisão, duas crianças remavam e brincavam com seu barco de madeira e um grupo de jovens voltavam depois de um longo dia de pesca.
A vida se adapta ao ritmo da floresta. As casas são flutuantes ou suspensas para resistir a época da cheia. Os rios são uma longa estrada sem sinalização, que mudam com o nível das águas.
"A cada época do ano é uma floresta nova. Tem época que o rio de 10, 20 metros de largura se transforma em igarapés, que mal passa uma voadeira", explica João, de 50 anos, um dos barqueiros do Instituto Mamirauá.