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AFP
Publicado em 19 de abril de 2019 às 05h55.
Última atualização em 19 de abril de 2019 às 05h55.
No começo, mais de 13 bilhões de anos atrás, o Universo era uma sopa indiferenciada de três elementos simples, de átomo único. As estrelas só se formariam 100 milhões de anos depois.
Mas 100.000 anos após o Big Bang, surgiu a primeira molécula, um casamento improvável de hélio e hidrogênio, conhecido como íon hidro-hélio, ou HeH+. "Foi o começo da química", disse David Neufeld, professor da Universidade John Hopkins e coautor de um estudo publicado nesta quarta-feira, que detalha como - depois de uma busca de décadas - os cientistas finalmente detectaram essa molécula elusiva no espaço.
"A formação de HeH+ foi o primeiro passo em um caminho de complexidade crescente no Universo", uma mudança tão importante como a da vida de célula única para a vida multicelular na Terra, disse à AFP.
Modelos teóricos há muito tempo convenceram os astrofísicos de que o HeH+ veio primeiro, seguido - em uma ordem precisa - por um desfile de outras moléculas cada vez mais complexas e pesadas.
O HeH+ também foi estudado em laboratório, já em 1925.
Mas o HeH+ detectado em seu habitat natural permanecia além do alcance dos cientistas.
"A falta de provas definitivas de sua própria existência no espaço interestelar tem sido um dilema para a astronomia por um longo tempo", disse o autor principal, Rolf Gusten, cientista do Instituto Max Planck de Radioastronomia, em Bonn.
Os pesquisadores sabiam onde procurar.
Já na década de 1970, os modelos sugeriam que o HeH+ deveria existir em quantidades significativas nos gases brilhantes ejetados pela morte de estrelas semelhantes ao Sol, que criavam condições semelhantes às encontradas no Universo primordial.
O problema era que as ondas eletromagnéticas emitidas pela molécula estavam em um alcance - infravermelho distante - anulado pela atmosfera da Terra e, portanto, indetectável do solo.
Assim, a Nasa e o Centro Aeroespacial Alemão uniram forças para criar um observatório aéreo com três componentes principais: um enorme telescópio de 2,7 metros, um espectrômetro de infravermelho e um Boeing 747 grande o suficiente para carregá-los.
De uma altitude de cruzeiro de quase 14.000 metros, o observatório Estratosférico de Astronomia de Infravermelho, ou SOFIA, evitou 85% do "ruído" atmosférico de telescópios terrestres.
Os dados de uma série de três voos em maio de 2016 continham a evidência molecular que os cientistas há muito procuravam, entrelaçada na nebulosa planetária NGC 7027, a cerca de 3.000 anos-luz.
"A descoberta de HeH+ é uma demonstração dramática e bela da tendência da natureza a formar moléculas", disse Neufeld.
Neste caso, o fez apesar de circunstâncias pouco propícias.
Embora as temperaturas no jovem universo tenham caído rapidamente após o Big Bang, elas ainda estavam perto de 4.000 graus Celsius, um ambiente hostil para a ligação molecular.
Além disso, o hélio - um gás "nobre" - "tem uma propensão muito baixa para formar moléculas", explicou Neufeld.
Sua união com o hidrogênio ionizado era frágil, e não persistiu por muito tempo, tendo sido substituída por ligações moleculares progressivamente mais robustas e complexas.
Elementos mais pesados como carbono, oxigênio e nitrogênio - e as muitas moléculas que eles originaram - foram formados mais tarde ainda, pelas reações nucleares que ocorrem nas estrelas.