Ciência

Cientistas expõem pessoas ao coronavírus propositalmente em estudo inédito

Realizado em ambiente controlado, metade dos jovens analisados tiveram sintomas leves, mas 70% perderam olfato ou paladar; pesquisa tem como objetivo estudar a doença e ajudar no desenvolvimento de vacinas e antivirais

 (Tolga Akmen/AFP)

(Tolga Akmen/AFP)

LP

Laura Pancini

Publicado em 3 de fevereiro de 2022 às 10h08.

Em um estudo inédito, jovens saudáveis foram intencionalmente expostos ao vírus da covid para entender mais a fundo sobre a resposta do corpo ao SARS-CoV-2 e ajudar no desenvolvimento de vacinas e antivirais. Liderado por pesquisadores do Imperial College London, o teste analisou 34 pessoas do Reino Unido, com idades entre 18 e 30 anos, no início de 2021.

Os resultados foram publicados no servidor Research Square, ainda não revisado por pares, e surpreendem: quase metade dos participantes que receberam uma dose baixa de vírus não foram infectados, enquanto alguns dos que foram infectados não apresentaram sintomas. Os participantes que desenvolveram covid relataram sintomas leves a moderados, já sete tiveram sintomas de covid longa.

Estudos em ambientes controlados, que infectam pacientes com a doença, têm acontecido ​​por décadas para estudar influenza, malária e inúmeras outras. Porém, sempre houve muita ressalva ao pensar em fazer o mesmo com o coronavírus, devido à gravidade da doença e a falta de informações sobre.

“Na minha opinião, ainda não está totalmente claro se esses estudos são eticamente justificados, e estou esperando para ver o que mais eles descobriram”, disse Seema Shah, bioeticista da Northwestern University, à Nature.

O que o estudo diz?

Os voluntários ficaram duas semanas de quarentena em uma unidade de isolamento de alto nível num hospital em Londres. Cada um deles recebeu 4.565 libras pela participação, equivalente a 32.900 reais.

Os primeiros participantes receberam uma dose muito baixa, o equivalente à quantidade de vírus em uma única gota respiratória. A cepa do vírus não era a Ômicron ou a Delta, mas uma (sem nome) que estava circulando no Reino Unido na época.

De acordo com a Nature, os pesquisadores sabiam que precisariam de uma dose mais alta para infectar uma maior parte dos participantes, mas só aquela gota já infectou metade deles. O vírus cresceu "incrivelmente rápido" nos infectados, que testaram positivo menos de dois dias após a exposição.

Só esse período de incubação de dois dias já constrasta com outros estudos epidemiológicos, que tiveram como base o mundo real. A informação era que o período entre a exposição ao vírus e os sintomas teria aproximadamente cinco dias.

Altos níveis virais persistiram por uma média de 9 dias e até 12 em alguns casos, e os sintomas mais comuns foram típicos de outras infecções respiratórias: dor de garganta, coriza e espirros. A febre foi o sintoma menos comum e ninguém desenvolveu a tosse seca e persistente, muito característica da covid.

70% dos participantes infectados perderam o olfato ou paladar em graus variados, problemas que persistiram por mais de 6 meses em cinco participantes e mais de 9 meses em um.

Algumas pessoas não desenvolveram nenhum sintoma, mas tiveram os mesmos altos níveis virais nas vias aéreas superiores que duraram tanto quanto para outras que apresentaram sintomas.

Já outras tiveram níveis muito baixos de vírus por um curto período de tempo, sugerindo que os sistemas imunológicos estavam "lutando ativamente contra o vírus", de acordo com o médico-cientista que liderou o estudo.

Agora, os próximos passos dos pesquisadores envolvem entender por que tantas pessoas não foram infectadas e replicar o teste com a variante Delta do coronavírus.

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