Ciência

Pesquisadores identificam uma nova causa da calvície

Cientistas dos Estados Unidos observaram os folículos capilares de camundongos e descobriram um mecanismo inesperado que explica a queda do cabelo

 (Boy_Anupong/Getty Images)

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AO

Agência O Globo

Publicado em 6 de outubro de 2021 às 14h49.

Toda pessoa, todo camundongo, todo cachorro tem um sinal inconfundível de envelhecimento: a perda de cabelo. Mas por que isso acontece? O professor de patologia da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, Rui Yi, começou a responder essa pergunta.

Uma hipótese geralmente aceita sobre células-tronco diz que elas são responsáveis por reabastecer tecidos e órgãos, incluindo o cabelo, mas que, eventualmente, se cansam e então morrem no local. Esse processo é visto como uma parte integral do envelhecimento.

Mas, em vez disso, Rui Yi e seus colegas fizeram uma descoberta surpreendente: ao menos no cabelo de animais que estão envelhecendo, as células-tronco fogem das estruturas que as abrigam.

“É uma nova forma de pensar sobre o envelhecimento”, diz o pesquisador de células da pele e professor de patologia na Universidade do Sul da Califórnia, nos Estados Unidos, Cheng-Ming Chuong. Ele não participou do estudo de Rui Yi, que foi publicado nesta segunda-feira na revista científica Nature Aging.

O estudo também identificou dois genes envolvidos no envelhecimento do cabelo, abrindo novas possibilidades para interromper o processo por meio da prevenção desse escape das células-tronco.

Ciclo capilar

Pesquisador de células-tronco da Universidade de Stanford, também nos Estados Unidos, Charles K. F. Chan disse que o artigo é “muito importante”, observando que “na ciência, tudo sobre envelhecimento parece tão complicado que não sabemos por onde começar”. Ao mostrar um caminho e um mecanismo para explicar o envelhecimento do cabelo, Rui Yi e seus colegas podem ter descoberto um ponto de partida.

Células-tronco desempenham um papel crucial no crescimento de cabelo em camundongos e em humanos. Os folículos capilares, órgãos em miniatura em formato de túnel dos quais os cabelos crescem, passam por períodos cíclicos de crescimento nos quais uma população de células-tronco vivendo em uma região especializada chamada de “bulge” se divide e tornam-se rapidamente células capilares em crescimento.

A diretora do Instituto Black Family de Células-tronco, da Escola de Medicina Icahn do Hospital Monte Sinai, em Nova York, Sarah Millar, que também não participou da pesquisa de Rui Yi, explicou que essas células dão origem à haste capilar e à sua bainha. Então, após um período de tempo, que é curto para o pelo do corpo e muito mais longo para o cabelo, o folículo se torna inativo e a sua parte inferior se degenera. A haste capilar para de crescer e cai, apenas para ser substituída por um novo fio de cabelo à medida em que o ciclo se repete.

Mas, enquanto o resto dos folículos morrem, uma coleção de células-tronco permanece no “bulge”, pronta para começar a se tornar células capilares e crescer um novo fio de cabelo.

A fuga das células-tronco

Rui Yi, como a maioria dos cientistas, presumia que, com a idade, as células-tronco morriam num processo conhecido como exaustão das células-tronco. Ele esperava que a morte dessas células de um folículo capilar significasse que o cabelo se tornaria branco e, quando uma quantidade suficiente delas fosse perdida, o fio de cabelo morreria. Mas essa hipótese não foi completamente testada.

Junto a um aluno de graduação chamado Chi Zhang, o médico decidiu que, para entender o processo de envelhecimento do cabelo, ele precisava observar fios individuais de cabelo enquanto eles cresciam e envelheciam.

Normalmente, pesquisadores que estudam envelhecimento pegam pedaços de tecido de animais de diferentes idades e examinam as mudanças. Existem duas desvantagens nessa abordagem, diz Rui Yi. Primeiramente, o tecido já está morto. Além disso, não é claro o que levou às mudanças que são observadas ou o que virá depois delas.

Yi decidiu que sua equipe utilizaria um método diferente. Eles observaram então o crescimento de folículos capilares individualmente nas orelhas de camundongos por meio de um laser de comprimento de onda longo que consegue penetrar profundamente no tecido. Eles rotularam os folículos capilares com uma proteína verde fluorescente, anestesiaram os animais para que não se movimentassem, colocaram suas orelhas sob o microscópio e repetiram esse processo diversas vezes para observar o que estava acontecendo com cada folículo capilar.

O que eles viram foi uma surpresa: quando os animais começaram a envelhecer, ficar grisalhos e perder o pêlo, suas células-tronco começaram a escapar de suas “pequenas casas” na região do “bulge”. As células mudaram as suas formas de redondas para um formato como uma ameba e se espremeram para fora dos minúsculos orifícios no folículo. Então, elas recuperaram suas formas normais e dispararam para longe.

Às vezes, as células-tronco que escapavam saltavam longas distâncias, em termos celulares, do nicho onde viviam.

— Se eu não tivesse visto, eu não teria acreditado. É quase uma loucura na minha cabeça — diz Rui Yi.

As células-tronco então desapareceram, talvez consumidas pelo sistema imunológico.

Genes podem ser responsáveis

Charles K. F. Chan, pesquisador de Stanford, comparou o corpo de um animal a um carro:

— Se você usa por muito tempo e não substitui as peças, as coisas se desgastam.

No corpo, células-tronco são como um mecânico, providenciando peças de reposição e, em alguns órgãos como cabelo, sangue e ossos, a reposição é contínua.

Mas, com o cabelo, agora parece que o mecânico — as células-tronco — simplesmente sai do trabalho um dia.

Mas por que? O próximo passo de Rui Yi e seus colegas foi questionar se genes estão controlando o processo. Eles então descobriram dois — FOXC1 e NFATC1 — que estavam menos ativos em células de folículos capilares mais envelhecidos. Seu papel era aprisionar as células-tronco no “bulge”. Então, os pesquisadores criaram camundongos sem esses genes, para ver se de fato eles eram os responsáveis pelo processo.

Quando esses camundongos chegaram à idade de 4 a 5 meses, eles começaram a perder o pêlo. Aos 16 meses, quando os animais estavam na meia-idade, eles pareciam bem mais velhos: haviam perdido muito pêlo e os poucos fios que restavam eram grisalhos.

Agora, os pesquisadores querem salvar as células-tronco do cabelo em camundongos que estão envelhecendo.

Essa história da descoberta completamente inesperada de um processo natural faz o médico Cheng-Ming Chuong se perguntar o que resta a ser aprendido sobre as criaturas vivas:

— A natureza tem infinitas surpresas esperando por nós. Você pode ver coisas fantásticas.

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