Apesar de já testes já terem sido feitos em ovelhas e porcos, o macaco é mais geneticamente semelhante ao humano (KiltedArab/Thinkstock)
Laura Pancini
Publicado em 5 de maio de 2021 às 09h33.
Última atualização em 6 de maio de 2021 às 13h27.
Pela primeira vez, uma equipe internacional de cientistas desenvolveu embriões que são uma mistura de células humanas e de macacos.
De acordo com publicação na revista científica Cell, os embriões foram criados com o intuito de encontrar novas formas de produzir órgãos para humanos que precisam de transplantes. Porém, trabalhos como esse sempre levantam uma série de preocupações envolvendo ética.
"Minha primeira pergunta é: por quê?" disse Kirstin Matthews, pesquisador de ciência e tecnologia do Instituto Baker da Rice University, ao NPR. "Acho que o público vai se preocupar que estamos apenas avançando com a ciência sem ter uma conversa adequada sobre o que devemos ou não devemos fazer."
Enquanto alguns pesquisadores encaram o estudo como algo eticamente problemático, os cientistas que conduziram o estudo argumentam que o transplante de órgãos é um dos maiores problemas da medicina. "A demanda por isso é muito maior do que a oferta", disse Juan Carlos Izpisua Belmonte, coautor do estudo.
Já para o bioeticista da Universidade de Harvard, Insoo Hyun, a pesquisa é voltada para "objetivos humanitários elevados". Ele ainda ressalta que milhões de pessoas nos Estados Unidos morrem todos os anos esperando por um transplante e que pesquisas com ovelhas e porcos, nas quais células-tronco humanas são injetadas com o objetivo de desenvolver órgãos humanos, já aconteceram.
Apesar das tentativas com porcos e ovelhas, a abordagem não funcionou. Por isso, a equipe de cientistas internacionais tentou uma nova abordagem, injetando 25 células-tronco pluripotentes induzidas de humanos (ou células iPS) em embriões de macacos, que têm uma genética muito mais semelhante com a nossa.
Depois de um dia, eles foram capazes de detectar células humanas crescendo em 132 dos embriões e foram capazes de estudar os embriões por até 19 dias. De acordo com Belmonte, isso ajudou a entender mais sobre como células animais e humanas interagem, o que pode ser útil para pesquisas futuras.
Em homenagem à criatura da mitologia grega que é parte leão, parte cabra e parte cobra, esses embriões são conhecidos pela comunidade científica como quimeras. “Nosso objetivo não é gerar nenhum novo organismo, nenhum monstro”, disse Belmonte. "E não estamos fazendo nada parecido. Estamos tentando entender como as células de diferentes organismos se comunicam entre si."
Quando o debate é sobre ética, a preocupação da comunidade científica é que alguém possa replicar o trabalho e realmente tentar criar um bebê com o embrião. Outro receio é que o uso de células humanas dessa forma pode acabar produzindo animais com espermatozóides ou óvulos humanos.
"Ninguém realmente quer macacos andando por aí com óvulos humanos e espermatozóides humanos dentro deles", disse Hank Greely, bioeticista da Universidade de Stanford. Na mesma edição da revista Cell, Greely publicou um artigo que critica a linha de pesquisa, mas ressalta que o estudo foi feito de maneira ética. "Porque se um macaco com espermatozóide humano encontra um macaco com óvulos humanos, ninguém quer um embrião humano dentro do útero de um macaco."
A equipe de cientistas entende as preocupações e enfatiza que sua equipe não tem intenção de fazer coisas do gênero.
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