(Alfieri/Getty Images)
Tamires Vitorio
Publicado em 21 de dezembro de 2020 às 15h45.
Os países mais riscos correram para garantir os seus estoques de vacina contra o novo coronavírus em meio a uma pandemia que parece estar longe de chegar ao final. Enquanto países mais pobres não têm como garantir a quantidade ideal de imunizações para sua população, outros já reservaram doses suficientes para realizar diversas campanhas de vacinação em seus territórios.
Os Estados Unidos já reservaram 100 milhões de doses da vacina da farmacêutica americana Pfizer, podendo comprar mais 500 milhões, bem como 200 milhões de doses da vacina da também americana Moderna, com uma oferta adicional para a compra de outras 300 milhões. Juntando os pedidos da AstraZeneca, da Johnson & Johnson, da Novavax e da Sanofi, mais 810 milhões de doses foram reservadas --- os acordos de expansão, segundo o jornal americano The New York Times, podem alavancar a quantidade para 2,6 bilhão de doses.
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O Reino Unido, por sua vez, já garantiu 357 milhões de doses das mesmas companhias citadas acima, e também fechou um acordo com a companhia francesa Valneva, para comprar mais 152 milhões. E a União Europeia adquiriu 1,9 bilhão de doses das mesmas farmacêuticas e também mais 600 milhões da companhia alemã CureVac.
A maioria das vacinas é administrada em duas doses. Os Estados Unidos são o epicentro da doença no mundo, com mais de 17,8 milhões de infectados e uma população de 328,2 milhões de habitantes. As 2,6 bilhão de doses reservadas, então, seriam o suficiente para vacinar toda a população americana 7,9 vezes, enquanto a União Europeia poderia vacinar o povo por mais de duas vezes, segundo uma análise feita pela EXAME com base nos dados disponibilizados pela UNICEF.
Já a Nova Zelândia assinou acordos com a universidade britânica de Oxford e a AstraZeneca e com a Novavax para trazer uma pacote adicional de 18,3 milhões de doses. Ambas as vacinas requerem duas doses, o que significa que mais de 9 milhões de pessoas poderão ser vacinadas. Antes desses acordos, o país já havia assegurado 750 mil doses da vacina da Pfizer/BioNTech e 4 milhões de doses da vacina da Janssen.
O objetivo da Nova Zelândia é vacinar a sua população de cerca de 5 milhões de pessoas e doar o que não for usado para nações vizinhas --- uma ação que, ainda, não foi copiada por outros países.
Em relação aos países menos desenvolvidos, a Índia, conhecida por ser um dos maiores fabricantes de compostos de vacinas no mundo todo, já assegurou uma quantidade substancial de doses para equilibrar a sua capacidade de manufatura.
Nos próximos anos, a Índia deve ser o país com a capacidade de produzir a maior quantidade de doses de vacinas contra a covid-19, uma vez que o Serum Institute of India tem contratos para a produção em larga de escaça das vacinas da AstraZeneca e da Novavax --- que prometeram ao governo indiano pelo menos metade do que for produzido por lá.
Ao todo, o país já garantiu 200 milhões de doses de vacinas, sendo 100 milhões do Instituto Gamaleya, na Rússia, e outras 100 milhões do próprio instituto indiano.
O Brasil, com 266 milhões de doses garantidas até o momento e uma população de 209,5 milhões de pessoas. A quantidade reservada, então, seria o suficiente para vacinar a todos.
O acordo brasileiro inclui 100 milhões de doses da britânica de Oxford, 50 milhões do Instituto Gamaleya, 46 milhões do Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac e 70 milhões da Pfizer.
A limitação para a produção de algumas das vacinas e a pressa dos países desenvolvidos em garantirem suas doses podem diminuir ainda mais a chance dos mais pobres de terem acesso à imunização --- e deixar o processo todo em uma marcha lenta que pode se estender até 2024.
Mas esforços têm sido feitos para garantir o acesso livre de todos países às vacinas que forem aprovadas. A OMS em parceria com duas ONGs do bilionário Bill Gates criaram uma aliança para garantir bilhões de doses para 92 países pobres e também para países emergentes. A iniciativa chamada de Covax já reservou 700 milhões de doses para países como Afeganistão, Haiti, Sri Lanka, Indonésia, Quénia, Honduras e Madagascar --- o número, embora pareça alto, pode não ser o suficiente para os 172 países que integram a lista. Um bilhão de doses nesse cenário seria capaz de vacinar menos de 20% da população de cada uma das nações mais pobres
O Senegal, por exemplo, depende exclusivamente das ações de empresas de fora. Por lá, a biotech Mologic desenvolveu testes caseiros e rápidos que podem custar até 1 dólar. Mas quanto tempo uma vacina pode demorar para chegar até esses locais?
"Não podemos depender somente da boa vontade para garantir acessso à ela. Demorou dez anos para as drogas contra a aids chegar a países mais pobres", afirmou Arzoo Ahmed, do Conselho Britânico Nuffield de Bioética à agência de notícias AP.
O programa das Nações Unidas Unaids afirmou que as nações africanas já ficam no fim da linha para o recebimento de medicamentos em pandemias e que isso "será pior caso uma vacina seja encontrada."
Pensando nisso, a AstraZeneca assinou um acordo de 750 milhões de dólares com a A Coalizão Para Inovações em Preparação para Epidemias (CEPI, na sigla em inglês) e com a Gavi Alliance para assegurar 300 milhões de doses para países pobres. E também fez um acordo com o Instituto Serum da Índia, que receberá 400 milhões de doses reservadas para países de baixa e média renda. A farmacêutica garantiu que não obterá lucros em nações mais necessitadas. O mesmo foi prometido pela americana Johnson & Johnson.
A União Europeia assegurou que tentará fazer com que os países mais pobres não fiquem para trás na fila das vacinas. "Ao falarmos sobre uma pandemia global, não tem espaço para 'eu primeiro'", afirmou a presidente para a Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, em junho.
A China também entrou na briga para o desenvolvimento de uma vacina e prometeu doar qualquer uma que tiver sucesso primeiramente para países no continente africano.
As iniciativas das empresas e dos países são promissoras, mas continua difícil mensurar o quão rápido ela chegará em locais mais necessitados e com sistemas de saúde mais fragéis.