Ciência

Ouvir música ao dirigir no trânsito pode prevenir doenças cardiovasculares

Pesquisa sugere que ouvir canções instrumentais ao volante alivia o estresse e a sobrecarga cardíaca

Trânsito: "Ouvir música pode ser uma medida preventiva a favor da saúde cardiovascular", disse Valenti (Levi Bianco/Getty Images)

Trânsito: "Ouvir música pode ser uma medida preventiva a favor da saúde cardiovascular", disse Valenti (Levi Bianco/Getty Images)

Isabela Rovaroto

Isabela Rovaroto

Publicado em 14 de novembro de 2019 às 13h28.

O estresse no trânsito é um fator de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares e complicações súbitas no coração, como um infarto, apontam estudos publicados nos últimos anos. Uma das soluções para diminuir esse perigo pode estar em selecionar melhor a playlist de música que se ouve ao volante.

Um estudo feito por pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Marília indicou que dirigir ouvindo músicas do gênero instrumental alivia o estresse no coração.

Os resultados da pesquisa apoiada pela FAPESP, foram publicados na revista Complementary Therapies in Medicine.

O trabalho teve a participação de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Oxford Brookes University, da Inglaterra, e da Università di Parma, da Itália.

“Constatamos que ouvir música ao dirigir atenuou o estresse no coração das motoristas participantes do experimento que conduzimos”, disse à Agência FAPESP Vitor Engrácia Valenti, professor da Unesp de Marília e coordenador do projeto.

Os pesquisadores analisaram os efeitos da música no estresse do coração de cinco mulheres saudáveis com idade entre 18 e 23 anos, consideradas condutoras eventuais – dirigem entre uma e duas vezes por semana – e que tiraram a carteira de habilitação recentemente.

“Optamos por avaliar condutoras não habituais porque as que dirigem com frequência e há mais tempo já estão melhor adaptadas a situações de estresse no trânsito”, explicou Valenti.

As voluntárias foram avaliadas ao longo de dois dias, em situações diferentes e de modo aleatório. No primeiro dia, elas dirigiram durante 20 minutos, em um trajeto de três quilômetros, em uma região movimentada da cidade de Marília, no noroeste de São Paulo. O teste foi feito no horário de pico – entre 17h30 e 18h30 – sem ouvir música.

Em outro dia elas refizeram o trajeto, com a mesma duração e no mesmo período do dia, ouvindo músicas instrumentais com um aparelho de som acoplado ao carro, já que o uso de fone de ouvido é classificado como uma infração de trânsito.

“Para aumentarmos o grau de estresse, elas dirigiram um carro que não era o delas, porque se cada uma dirigisse o próprio automóvel o nível de estresse seria reduzido”, afirmou Valenti.

A fim de avaliar o nível de estresse no coração das participantes, foi analisada a variabilidade da frequência cardíaca – as oscilações no intervalo de tempo entre dois batimentos cardíacos consecutivos – por meio de um monitor de frequência cardíaca acoplado ao tórax.

A variabilidade da frequência cardíaca é influenciada pela atividade dos sistemas nervoso simpático – que acelera os batimentos cardíacos – e parassimpático – que induz a desaceleração dos batimentos cardíacos.

“A elevação da atividade do sistema nervoso simpático reduz a variabilidade da frequência cardíaca e a do sistema parassimpático a aumenta”, explicou Valenti.

Os resultados das análises indicaram uma diminuição da variabilidade da frequência cardíaca das voluntárias ao dirigir sem ouvir música, indicando uma redução da atividade do sistema nervoso autônomo parassimpático e a ativação do sistema simpático.

Em contrapartida, foi observado um aumento da variabilidade da frequência cardíaca das motoristas ao ouvir música em razão do aumento da atividade do sistema nervoso parassimpático, além de redução do sistema simpático.

“Ouvir música diminuiu a leve sobrecarga de estresse que as voluntárias foram submetidas ao dirigir”, afirmou Valenti.

O estudo teve a participação só de mulheres para controlar as influências relacionadas aos hormônios sexuais, explicou o pesquisador.

“Se misturássemos mulheres e homens, e se houvesse uma diferença significativa entre esse primeiro e o segundo grupo, o resultado poderia levantar dúvidas de que as diferenças estariam relacionadas à influência do hormônio sexual feminino”, disse Valenti.

Na avaliação do pesquisador, os resultados do estudo podem contribuir para a criação de medidas preventivas cardiovasculares em situações de estresse exacerbado, como a vivenciada no trânsito.

“Ouvir música pode ser uma medida preventiva a favor da saúde cardiovascular para aliviar situações de estresse intenso, como ao dirigir em horário de pico”, disse.

O artigo The effects of musical auditory stimulation on heart rate autonomic responses to driving: a prospective randomized case-control pilot study (DOI: 10.1016/j.ctim.2019.08.006), de Myrela Alene Alves, David M. Garner, Joice A. T. do Amaral, Fernando R. Oliveira e Vitor E. Valenti, pode ser lido na revista Complementary Therapies in Medicine em www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0965229919303218.

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