Bioimpressão: estruturas cartilaginosas, ósseas e musculares já foram criadas e implantadas em animais (Wake Forest Baptist Medical Center/Divulgação)
Marina Demartini
Publicado em 29 de janeiro de 2017 às 07h00.
Última atualização em 29 de janeiro de 2017 às 07h00.
São Paulo – Pesquisadores espanhóis apresentaram no final do ano passado uma impressora 3D capaz de produzir pele humana. O tecido desenvolvido pelos cientistas replica a mesma camada de epiderme, que age como proteção contra o ambiente, e uma derme mais espessa e profunda, que é capaz de produzir colágeno.
Em vídeo divulgado pela Universidade Carlos III de Madrid, Jose Luis Jorcano, um dos autores da pesquisa, explica que o processo de criação da pele é dividido em três módulos. O primeiro é o computador, que comanda a impressora, o segundo é as biotintas e o terceiro é o modo impressão em que as biotintas são depositadas ordenadamente para a criação do tecido.
“As biotintas são o equivalente às tintas em uma impressora normal. Porém, nesse caso, os cartuchos são recheados de proteínas, células e componentes biológicos que permitem a construção do tecido”, conta Jorcano no vídeo.
Para ele, há duas possíveis aplicações para esse tipo de impressão. A primeira seria a curto prazo para o teste de medicamentos e cosméticos. Já a segunda seria a longo prazo para transplantes de pele em pacientes vítimas de queimaduras. Contudo, para chegar a esse ponto, os cientistas ainda precisam da aprovação de agências regulatórias.
O vídeo abaixo (em espanhol) mostra como a pele foi criada:
A pesquisa espanhola é apenas uma de diversas que mostram que a bioimpressão poderá substituir os órgãos “naturais” em transplantes. A técnica já apresenta resultados positivos em testes com animais e, por isso, muitos cientistas acreditam que, dentro de cinco anos, tecidos completos impressos em 3D estarão prontos para serem transplantados para humanos.
Em 2016, um estudo publicado na revista Nature revelou que pesquisadores norte-americanos conseguiram implantar tecidos impressos em 3D em animais. Os cientistas imprimiram estruturas cartilaginosas, ósseas e musculares e as transplantaram nos roedores. Essas células desenvolveram um sistema de vasos sanguíneos e se transformaram em tecidos.
O dispositivo usado para criar esses tecidos é chamado de Sistema Integrado de Impressão de Tecido e Órgão (Itop). Ele usa tanto materiais plásticos quanto biodegradáveis para projetar a forma do órgão desejado. Além disso, a máquina utiliza géis à base de água para sustentar as células nesse formato.
Os cientistas reforçam no estudo que os implantes são tão resistentes quanto os tecidos humanos. No entanto, eles ainda são cautelosos quanto à duração desses dispositivos. Eles ainda querem analisar se os tecidos conseguem viver tempo suficiente para que sejam integrados ao corpo humano.
Como os pesquisadores americanos, outros especialistas estão implantando músculos, orelhas e ossos em animais. No ano passado, cientistas da Northwestern University, em Chicago, imprimiram ovários protéticos e os implantaram em camundongos. Os receptores foram capazes de conceber e dar à luz com a ajuda desses órgãos artificiais.
Não é apenas a academia que quer imprimir órgãos. Empresas como a Organovo, de San Diego, já estão criando impressões 3D de tecidos vivos. Em dezembro, a companhia anunciou que havia transplantado tecidos de fígados impressos a partir de células humanas em camundongos. Segundo a Organovo, os tecidos poderão servir para o tratamento de insuficiência hepática crônica, dentro de três a cinco anos.
Os tecidos impressos em 3D também podem ajudar com o desenvolvimento de tratamentos para diversas doenças. A própria Organovo já oferece tecidos de fígado e rim para a triagem de potenciais remédios. Assim, animais não precisarão mais ser usados para ensaios clínicos.
Além de agradar os ativistas dos direitos dos animais, a técnica também seria uma boa pedida para as empresas farmacêuticas. Isso porque os tecidos humanos trarão resultados mais confiáveis do que os de outras espécies.
A L’Oréal, uma empresa francesa de cosméticos, já investe na bioimpressão para a realização de testes de seus produtos. A companhia desenvolve cinco metros quadrados de pele por ano usando uma tecnologia mais lenta, segundo o site da Bloomberg.
Assim, além de salvar a vida de diversas pessoas que estão na lista de espera por um transplante – no Brasil, mais de 42 mil indivíduos esperam por um órgão – a bioimpressão também pouparia a vida de milhares de animais.