Ciência

Ondas cerebrais são detectadas em minicérebros cultivados em laboratório

Esta é a primeira vez que um "organoide cerebral", do tamanho de uma ervilha, conseguiu desenvolver redes neurais funcionais

Cérebro: os cientistas ainda não sabem se os minicérebros têm consciência (iLexx/Getty Images)

Cérebro: os cientistas ainda não sabem se os minicérebros têm consciência (iLexx/Getty Images)

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AFP

Publicado em 29 de agosto de 2019 às 16h59.

Última atualização em 29 de agosto de 2019 às 17h01.

Cientistas detectaram pela primeira vez atividade elétrica em cérebros do tamanho de ervilhas cultivados em laboratório, abrindo caminho para modelar condições neurológicas e responder a perguntas fundamentais sobre como nossa massa cinzenta se desenvolve.

Não está claro se os minicérebros têm consciência - a equipe por trás do grande avanço suspeita que não, mas não tem certeza disso -, o que abre uma nova dimensão ética para essa área de pesquisa.

Os chamados "organoides cerebrais" derivados de células-tronco adultas existem há cerca de uma década, mas nunca haviam desenvolvido redes neurais funcionais.

"Se você tivesse me perguntado há cinco anos se eu achava que um organoide cerebral algum dia teria uma rede sofisticada capaz de gerar uma oscilação cerebral, eu diria que não", disse à AFP Alysson Muotri, biólogo da Universidade da Califórnia em San Diego.

Um artigo publicado por Muotri e colegas na revista Cell Press nesta quinta-feira disse que parte do avanço foi resultado de um procedimento melhor para o crescimento de células-tronco, incluindo a otimização da fórmula do meio de cultura.

A outra parte foi inicialmente surpreendente, mas também intuitiva quando os pesquisadores pensaram sobre isso: deve-se simplesmente dar tempo suficiente para os neurônios se desenvolverem, assim como o cérebro dos fetos se desenvolve no útero.

A equipe começou a detectar descargas de ondas cerebrais de organoides há cerca de dois meses.

Os sinais eram escassos e tinham a mesma frequência, um padrão observado em cérebros humanos muito imaturos. Mas, à medida que continuavam a crescer, produziam ondas cerebrais em diferentes frequências, e os sinais apareciam com mais regularidade, sugerindo maior desenvolvimento de suas redes neurais.

Os primeiros organoides foram usados para modelar o que acontece quando o cérebro é exposto a doenças como o vírus Zika, que causa malformações físicas.

Mas há também uma série de condições neurológicas, como autismo e epilepsia, e algumas condições psiquiátricas em que os problemas aparecem pela conexão da rede cerebral e não por malformações.

Criando organoides cerebrais a partir das células-tronco de indivíduos com essas condições, os cientistas poderiam modelá-los melhor e talvez um dia encontrar curas.

Eles também esperam responder a perguntas mais fundamentais. Muotri disse que o desenvolvimento de organoides se estabilizou após nove ou 10 meses.

"Estou curioso sobre isso. Pergunto-me se é porque não temos um sistema de vascularização para permitir que os nutrientes entrem, ou pode ser que simplesmente nos falte estimulação" na forma de inputs sensoriais.

Ele espera testar as duas hipóteses.

Sobre se os organoides do cérebro são conscientes, Muotri disse que suspeita que não por causa de seu estágio inicial de desenvolvimento.

"Mas se você me perguntar: 'Como você sabe?', eu diria que não tenho provas de uma coisa nem de outra, porque nós nem sabemos como detectar a consciência em outros sistemas", disse.

"À medida que nos aproximarmos do cérebro humano, todas essas questões éticas aparecerão", ele admitiu, propondo que o campo seja submetido a regulamentação da mesma forma que os testes em animais.

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