(Liane Neves/Reprodução)
Lucas Agrela
Publicado em 1 de outubro de 2018 às 14h45.
Última atualização em 1 de outubro de 2018 às 14h46.
Um pioneiro dos estudos de genética de populações no Brasil, o geneticista gaúcho Francisco Salzano faleceu na noite de 28 de setembro, em Porto Alegre, aos 90 anos, depois de passar mal após uma cirurgia de hérnia realizada no dia anterior.
Membro da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, da Academia Brasileira de Ciências e presidente de honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Salzano orientou cerca de 90 alunos de mestrado e doutorado e escreveu, sozinho ou em coautoria, mais de mil artigos e textos científicos. Em seu último trabalho, publicado em agosto, colaborou com um estudo sobre genes ligados à adaptação em grandes altitudes de povos andinos. Ainda envolvido em vários projetos de pesquisa, Salzano trocou e-mails de trabalho com colegas até o começo desta semana.
O geneticista formou-se em história natural pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 1950. Defendeu seu doutorado em biologia genética em 1955 orientado pelo geneticista Crodowaldo Pavan (1919-2009) na Universidade de São Paulo (USP). Sempre trabalhou, desde 1952, na UFRGS, exceto por breves estágios de pós-doutorado em outras instituições. O mais importante desses estágios aconteceu entre 1956 e 1957, na Universidade de Michigan, Estados Unidos, onde iniciou sua colaboração com o geneticista norte-americano James Neel (1915-2000), com quem desenvolveu modelos para explicar a evolução da genética de povos caçadores e coletores, segundo contou em entrevista a Pesquisa FAPESP em 2006.
Salzano realizou no final dos anos 1950 os primeiros estudos genéticos dos povos indígenas brasileiros, coletando dados em uma série de expedições pela Amazônia.
“A carreira científica de Salzano teve uma trajetória única”, afirma a geneticista Tábita Hünemeier, do Instituto de Biociências da USP, que colaborou com Salzano desde a graduação e continua a estudar populações indígenas. “Ele começou a trabalhar muito antes de existirem técnicas de análise de DNA. Participou desde os primeiros estudos antropológicos convivendo com os índios e integrando esse conhecimento com análises proteicas de amostras de sangue e medidas antropométricas, até os estudos mais recentes de genômica.”
Natural de Cachoeira do Sul (RS), o pesquisador não se restringia às pesquisas sobre evolução humana. Trabalhou também com genética de doenças relacionadas à coagulação sanguínea, como a hemofilia, e com a evolução de mamíferos em geral. “Era muito entusiasmado”, lembra Tábita. “Abraçava novas ideias sempre com muita vontade.”