Ciência

Lobotomia e fraude: os casos mais controversos do Prêmio Nobel

Lobotomia, vista como uma revolução no tratamento de doenças mentais, tornou-se uma das práticas mais controversas da medicina depois de cientista vencer Nobel em 1949

Da Redação
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Redação Exame

Publicado em 14 de outubro de 2025 às 12h34.

Última atualização em 14 de outubro de 2025 às 13h00.

O Prêmio Nobel é considerado o reconhecimento máximo para cientistas e pesquisadores em diversas áreas. Apesar da relevância, a premiação não está livre de controvérsias.

Ao longo dos anos, alguns prêmios foram concedidos por pesquisas que posteriormente se mostraram incorretas, enquanto outros casos envolvem alegações de má conduta científica, surgidas depois da premiação.

Apesar disso, o Nobel nunca foi concedido a uma pesquisa comprovadamente fraudulenta no momento da premiação. Mesmo assim, casos históricos de trabalhos errados e episódios contemporâneos de questionamentos éticos que mostram os desafios da integridade científica.

Prêmios concedidos por pesquisas incorretas

Johannes Fibiger recebeu o Nobel de Medicina em 1926 por afirmar que um verme redondo, Spiroptera carcinoma, causava câncer no estômago de ratos.

Décadas depois, descobriu-se que os tumores foram provocados por deficiência de vitamina A. Ratos alimentados apenas com pão branco e água desenvolveram lesões benignas, não câncer. Erling Norrby, ex-secretário permanente da Academia Sueca de Ciências, classificou o prêmio como “um dos maiores erros do Instituto Karolinska”.

Em 1938, Enrico Fermi recebeu o Nobel de Física por estudos com nêutrons que supostamente criariam novos elementos radioativos, chamados de “Ausenium” e “Hesperium”. Posteriormente, Otto Hahn e Lise Meitner demonstraram que Fermi havia promovido a fissão nuclear, dividindo átomos de urânio em elementos mais leves, como bário. Os elementos 93 e 94 (netúnio e plutônio) foram identificados apenas depois. Apesar do erro na premiação, o trabalho de Fermi com nêutrons lentos continuou a ser considerado relevante.

Paul Müller, Nobel de Medicina em 1948, foi premiado por descobrir a eficácia do DDT como inseticida. O produto ajudou a controlar doenças como a malária, mas posteriormente se revelou altamente prejudicial ao meio ambiente, acumulando-se na cadeia alimentar e causando danos ecológicos.

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Ao contrário de Fibiger e Fermi, a descoberta de Müller estava correta, embora os efeitos ambientais só tenham sido percebidos décadas depois.

Laureados recentes sob suspeita

Alguns vencedores do Nobel enfrentaram alegações de má conduta científica após receberem a premiação, sem relação direta com os trabalhos premiados.

Gregg Semenza, laureado em 2019 por descobertas sobre a regulação celular do oxigênio, teve 13 artigos retratados por manipulação de imagens e fabricação de dados. As irregularidades foram apontadas pelo pesquisador anônimo “Claire Francis” no site PubPeer.

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Thomas Südhof, Nobel de Medicina em 2013, também passou por investigações sobre inconsistências em mais de 30 artigos, incluindo duplicação de dados e imagens manipuladas. Ele nega qualquer má conduta, afirmando que os erros foram involuntários. Nenhum dos trabalhos retratados está ligado à pesquisa premiada.

Casos de fraude sem Nobel

Jan Hendrik Schön, físico do Bell Labs, falsificou dados em pelo menos 16 artigos sobre supercondutividade e eletrônica molecular. O pesquisador chegou a ser considerado para o Nobel antes de a fraude ser descoberta, em 2002. Ele foi demitido e teve o doutorado revogado.

O sul-coreano Woo Suk Hwang alegou ter clonado células-tronco humanas entre 2004 e 2005, pesquisa que teria valor Nobel. Investigações mostraram que os dados eram totalmente falsos. Nenhum embrião foi clonado, tornando o caso um dos maiores escândalos científicos das últimas décadas.

Prêmio por lobotomia

Os Prêmios Nobel não podem ser revogados. Segundo a Fundação Nobel, “não podem ser feitas apelações contra a decisão de um corpo premiante”.

Outro episódio controverso envolvendo o Prêmio Nobel de Medicina ocorreu em 1949, quando o neurologista português António Egas Moniz foi premiado pelo desenvolvimento da lobotomia pré-frontal.

Na época, a lobotomia era considerada uma inovação revolucionária no tratamento de doenças mentais, especialmente para pacientes com condições graves, como esquizofrenia e transtornos obsessivo-compulsivos, que não respondiam a outras formas de tratamento.

A técnica envolvia a remoção ou a desconexão de partes do cérebro, em particular das conexões entre o lobo frontal e o restante do cérebro, com o objetivo de aliviar os sintomas dessas condições psiquiátricas.

Moniz e seus defensores viam a lobotomia como uma solução promissora para aliviar os sofrimentos de pacientes que, de outra forma, estavam à margem da sociedade, muitas vezes confinados em instituições psiquiátricas.

A técnica ganhou popularidade rapidamente, sendo aplicada em grande escala, especialmente nos Estados Unidos, onde médicos como Walter Freeman popularizaram a lobotomia transorbital, um método mais simples e eficaz que envolvia o uso de um instrumento semelhante a um picador de gelo para destruir as conexões cerebrais através dos olhos.

Mas, com o passar dos anos, os efeitos negativos da lobotomia começaram a se tornar mais evidentes. Muitos pacientes que se submeteram ao procedimento sofreram danos cerebrais irreversíveis, que resultaram em severas alterações de personalidade, perda de funções cognitivas, paralisia e, em alguns casos, morte.

O uso da lobotomia foi associado a sérios riscos e efeitos colaterais, o que levou a uma crescente oposição à prática durante as décadas seguintes.

Hoje, a lobotomia é amplamente condenada como uma prática desumana e arcaica. No entanto, é importante destacar que a premiação de Moniz não foi fruto de fraude, mas sim de uma percepção genuína de que a técnica poderia oferecer benefícios significativos para aqueles que não tinham outras opções de tratamento.

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