Ciência

Isolamento reduziu transmissão do covid-19 no Brasil pela metade

Estudo mostra que o Brasil conseguiu reduzir pela metade a taxa de transmissão do coronavírus, de três para 1,6 contaminados

Isolamento social: a pesquisa teve como base análises genéticas feitas a partir do primeiro sentenciamento genético do coronavírus no Brasil (Adriano Machado/Reuters)

Isolamento social: a pesquisa teve como base análises genéticas feitas a partir do primeiro sentenciamento genético do coronavírus no Brasil (Adriano Machado/Reuters)

AO

Agência O Globo

Publicado em 26 de julho de 2020 às 17h37.

Última atualização em 26 de julho de 2020 às 22h08.

O isolamento social, adotado no Brasil desde março, conseguiu reduzir pela metade a taxa de transmissão do coronavírus, de três para 1,6 contaminados, segundo estudo liderado por pesquisadores brasileiros e coordenado pelo Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (Cadde).

Ou seja, se não fossem adotadas quarentenas e outras medidas de distanciamento social, cada pessoa infectada continuaria a contaminar mais três.

O estudo, publicado na edição da revista Science de 23 de julho, foi detalhado pelo jornal da USP, que entrevistou os principais cientistas envolvidos no trabalho.

De acordo com as informações, a pesquisa teve como base análises genéticas feitas a partir do primeiro sentenciamento genético do coronavírus no Brasil, concluído em fevereiro passado. Também foram analisados dados epidemiológicos e de mobilidade dos brasileiros.

Os cientistas identificaram mais de 100 entradas do vírus no país, mas apenas três delas iniciaram a cadeia de transmissão. A maioria das pessoas que trouxeram o coronavírus para o Brasil desembarcou nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza e Belo Horizonte, onde ficam os aeroportos com mais vôos internacionais.

No total foram identificados 18 subtipos (linhagens) diferentes do vírus em amostras coletadas de março até o fim de abril. No entanto, 76% dos vírus que se dispersaram a partir de março pertenciam a apenas três linhagens, chamadas de “clados”. No total foram coletadas amostras do coronavírus em 85 municípios de 21 estados brasileiros, resultando no sequenciamento de 427 genomas do vírus SARS-CoV-2

O pesquisador Darlan Cândido, da Universidade de Oxford, primeiro autor do estudo, explica que o trabalho permite reconstruir - e acompanhar - a história da epidemia no país

- A análise permite fazer isso tanto no tempo quanto no espaço, ou seja, quando o vírus chegou e onde se espalhou - afirmou o cientista ao jornal da USP.

A professora Ester Sabino, do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo (IMT) da USP, que participou do primeiro sequenciamento genético do vírus no Brasil e é uma das participantes do estudo, afirmou que trata-se de um trabalho de vigilância contínua, para acompanhar a evolução e a dispersão do coronavírus.

As diferenças entre as três linhagens verificadas no Brasil, segundo ela, são muito poucas, pois o nível de mutação do coronavírus é baixo.

SP e Ceará: portas de entrada para o espalhamento

Das três linhagens que se disseminaram no Brasil, duas entraram pela região Sudeste. Uma delas predomina em São Paulo a outra se espalhou pelo país inteiro, segundo a pesquisadora Ingra Morales Claro, pesquisadora do IMT e da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), outra integrante do grupo. A terceira linhagem entrou e se disseminou pelo Ceará.

O vírus do primeiro sequenciamento genético não foi o responsável pela epidemia. Ou seja, a transmissão não aconteceu a partir do primeiro caso descrito.

-- Foram duas pessoas em São Paulo e uma no Ceará, que chegaram ao país entre o fim de fevereiro e início de março -- disse Ester ao GLOBO, sobre os vírus que se espalharam pelos estados.

Epidemia crônica

Os cientistas descobriram que o espalhamento do vírus ocorreu antes das medidas que começaram a reduzir a mobilidade dentro do país. Segundo Ester, isso significa que a ausência das restrições de movimentação e aglomerações pode ter facilitado a transmissão.

Ester explica que, no início da pandemia no Brasil, cada pessoa infectada transmitiu o vírus para mais três, uma quantidade de contaminados superior à média registrada na Europa no auge da epidemia. Embora a taxa tenha sido reduzida, ela afirma que o cenário ideal seria que a taxa fosse reduzida para menos de 1. Com o cenário atual, a epidemia permanece crônica, avalia.

- Podemos não conseguir controlar e ter sempre pessoas transmitindo o coronavírus. As infecções vão continuando - diz a professora.

A cientista afirma que com taxa de transmissão de um, ou abaixo disso, a tendência é a epidemia diminuir bastante.

- Vamos continuar monitorando a evolução do vírus. Com isso, será possível analisar a situação cidade por cidade.

Ester afirma que a cidade de São Paulo, onde a taxa atingiu 1, pode ter menos chance de rebote.

- A capital paulista está numa situação que parece ser o fim do tunel - explica.

A maior parte das amostras analisadas na pesquisa é do estado de São Paulo, o local com maior número de casos de Covid-19 no Brasil até o momento, seguido de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Ceará.

Acompanhe tudo sobre:CoronavírusPandemia

Mais de Ciência

Cientistas identificam pista sobre matéria que resistiu à antimatéria no Big Bang

Buraco negro misterioso encontrado na 'galáxia do infinito' desafia teorias astronômicas

Urano tem uma namorada? Cientistas identificam objeto próximo ao planeta há milhares de anos

Já existiu um universo antes do nosso? A física quântica busca uma resposta