Inteligência: a mente funciona como um músculo: não pode parar de se exercitar e precisa ser desafiada sempre (iStock/Thinkstock)
Da Redação
Publicado em 24 de julho de 2017 às 10h08.
Última atualização em 24 de julho de 2017 às 10h11.
“Você não tem muito controle sobre sua inteligência, ela vem de berço”, repetiam os professores de psicologia da norte-americana Andrea Kuszewski.
Andrea escutava, mas não levava a sentença a sério. Logo depois de se formar, em 1999, ela começou a trabalhar com crianças autistas. Sua missão era reverter deficiências cognitivas dos pacientes, o que seus tutores acreditavam ser impossível.
Para dar conta do desafio, Andrea adotou o ensino multimodal, técnica que usa todos os estímulos necessários para que uma criança aprenda. Os críticos do método diziam que não ia funcionar.
Nas suas primeiras consultas como terapeuta, Andrea atendeu um garoto diagnosticado com uma forma atípica de autismo, que limita as habilidades sociais, a linguagem e provoca hábitos repetitivos. Seu QI não chegava a 80, bem abaixo da média.
Ao longo de três anos, a psicóloga submeteu o menino a uma série de atividades de comunicação, leitura, matemática, interação social e jogos.
Ao final do período, veio a surpresa: o QI dele superou os 100, alcançando a média das pessoas da sua idade. Era um impressionante aumento de 20 pontos.
Apesar do sucesso do método, não havia muito interesse científico no assunto. A virada de jogo veio em 2008, com o estudo da psicóloga Susanne Jaeggi.
A hoje professora da Universidade da Califórnia, em Irvine, EUA, mostrou que uma bateria de exercícios verbais, espaciais e auditivos melhoram a memória de curto prazo – a nossa folha de rascunho mental que é uma peça-chave na resolução de problemas.
Depois de duas semanas, os voluntários testados conseguiram usar os ganhos do treino em testes completamente diferentes – o que, segundo a pesquisa, era uma evidência de que a cognição tinha aumentado. Os exercícios usados por Andrea e Susanne eram diferentes, mas seus resultados provaram a mesma tese.
Desde então, a noção de que a inteligência pode ser incrementada começou a ser levada a sério. Inspirados no trabalho das pesquisadoras, muitos neurocientistas procuraram novas formas de alcançar ganhos cognitivos, inclusive para quem não tem autismo. Abaixo, você vai conhecer algumas delas.
A mente funciona como um músculo: não pode parar de se exercitar e precisa ser desafiada sempre.
1) Faça coisas diferentes
Já experimentou escovar os dentes com a outra mão? Ou abandonar o GPS e pegar um caminho diferente para o trabalho? Segundo um estudo de 2010 da Universidade do Colorado, ser curioso e estar disposto a tomar atitudes diferentes têm um papel importante na formação de memórias.
Isso porque, quando expostas a novidades consideradas interessantes, as pessoas liberam dopamina no cérebro, o que aumenta a atenção dada às informações, além de estimular os neurônios.
Por isso, na próxima vez que sentar na frente do computador, experimente usar o mouse com a mão contrária à de costume. Ou leia um parágrafo de trás para frente e, ao final, diga qual era a ideia principal.
2) Exercite a imaginação
Selecione um objeto qualquer na sua mesa. Agora, pense em dez coisas diferentes que você pode fazer com ele. Pare e olhe para o lençol da sua cama. Escreva o maior número de usos para ele.
Faça isso com outros objetos à sua volta, de tijolos a canetas, de copos a facas. Solte a imaginação sempre que puder. Uma corrente de cientistas acredita que exercer a criatividade é fundamental para a inteligência. O psicólogo Robert Sternberg, de Yale, criou o Rainbow Project, programa que aplica métodos de ensino criativo nas escolas.
O estudo que avaliou o projeto de Sternberg acompanhou 1.015 alunos, sendo que metade recebeu tarefas que incluíam legendar caricaturas e criar histórias em 15 minutos.
A turma que fez as atividades diferentes tirou melhores notas e se saiu melhor em um teste cognitivo de múltipla escolha. Isso indica que eles não só tiveram melhor desempenho acadêmico, como conseguiram aplicar o ganho mental em uma situação completamente diferente.
3) Fortaleça a memória de trabalho
A memória de trabalho é aquela que você usa para ler este texto e, ao final dele, extrair uma conclusão sobre qual é sua ideia geral. Em provas ou nos desafios do dia a dia, você precisa muito dela, o que a torna crucial para a inteligência. Se sua memória de trabalho é limitada, é possível que você tenha um desempenho pior.
Por isso, os esforços dos psicólogos têm sido criar – e testar – os melhores métodos para treiná-la. Uma forma de estimulá-la é fazer brincadeiras mentais: diga em voz alta os dias da semana e os meses do ano e repita depois de trás para frente.
Ou fale o alfabeto ao contrário. Assim, você turbina sua capacidade de conservar, em estado ativo, as informações relevantes no momento.
4) Crie associações
Pense em cinco pessoas diferentes e liste uma qualidade para cada uma delas. Depois, crie uma semelhança e uma diferença para pente e escova, copo e xícara, água e sal, faca e serrote etc.
Fazer associações entre informações e fatos é uma ótima forma de gravá-los na mente. Um dos exercícios mais famosos nos estudos de inteligência é o dual n-back, que testa a memória visual e auditiva e a associação entre elas. A tela mostra um quadrado dividido em nove pedaços, como o jogo da velha.
O objetivo é lembrar quando aparece uma letra ou um quadradinho repetidos ao mesmo tempo. Quando percebe, o participante deve clicar nos comandos na parte inferior do vídeo: um auditivo e um visual.
Um estudo de 2008 indica que jogá-lo diariamente por 25 minutos por duas semanas pode melhorar a capacidade de resolver problemas. Os sites brainscale.net e brainturk.com oferecem versões gratuitas em inglês.
5) Pratique esportes
Não é só de charadas mentais que o cérebro precisa. Segundo um estudo de 2009 do Instituto de Tecnologia da Georgia, nos EUA, exercícios aeróbicos como corrida, dança, natação e ciclismo também melhoram a cognição.
Uma das pesquisas avaliadas, feita por cientistas de Harvard e publicada em 2004, acompanhou, por dois anos, 16.466 enfermeiras acima dos 70 anos.
Os resultados mostraram uma correlação significativa entre energia gasta e os níveis de cognição. Em 2001, pesquisadores franceses já haviam encontrado achados parecidos em uma população de 32 idosos. A conclusão foi a de que a combinação de treinos físicos e mentais resultava em ganhos significativos para a mente, em especial a memória.
“Exercício regular oxigena o cérebro e permite que os neurônios funcionem melhor”, explica Shelley Carson, professora da Universidade de Harvard. A recomendação é fazer de 30 a 60 minutos de exercícios aeróbicos, pelo menos duas vezes na semana.
6) Toque um instrumento musical
Tocar um instrumento turbina os neurônios e pode aumentar o QI em qualquer idade. Pelo menos dois estudos mostraram esses benefícios. No primeiro deles, divulgado em 2007, uma equipe de psicólogos americanos acompanhou idosos de 60 a 85 anos que aprenderam a tocar piano em aulas de 30 minutos semanais durante seis meses.
Segundo a pesquisa, as pessoas que receberam as aulas melhoraram sua capacidade de planejamento, velocidade de processamento de informação e memória de curto prazo.
No segundo estudo, de 2011, pesquisadores da Universidade de Toronto, no Canadá, avaliaram os benefícios das aulas de música em crianças de 9 a 12 anos. Os adolescentes que haviam feito as classes musicais tiraram melhores resultados num teste de QI do que aqueles sem o treino de acordes.
*Este conteúdo foi publicado originalmente no site Superinteressante.