Pesquisadores analisaram 89 voluntários de 65 a 85 anos (Sebastien Bozon/AFP)
Karina Souza
Publicado em 17 de novembro de 2020 às 07h19.
Última atualização em 17 de novembro de 2020 às 15h56.
O Mal de Alzheimer, doença neurodegenerativa conhecida por afetar a memória, sempre desafiou a compreensão de pesquisadores tanto a respeito de seu surgimento quanto a respeito de tratamentos ou cura. Agora, uma nova pesquisa liga a doença com compostos liberados por bactérias intestinais de uma forma que um grupo de cientistas chama de “indiscutível”. Mente em foco: investindo na sua saúde mental para alcançar seu potencial
O estudo foi produzido por uma equipe diversificada de pesquisadores, das seguintes instituições: Universidade de Genebra, Hospitais Universitários de Genera na Suíça, Centro Nacional de Pesquisa e Atendimento para Doenças de Alzheimer Fatebenefratelli em Brescia, Universidade de Nápoles e IRCCS SDN Centro de Pesquisa.
"Já tínhamos percebido que a composição das bactérias presentes no intestino de pacientes com Alzheimer tem alterações, quando comparada à de pessoas que não têm essa doença. Basicamente, pacientes infectados apresentam uma diversidade menor de bactérias. Além disso, também detectamos uma correlação entre um fenômeno inflamatório no sangue, a presença de certas bactérias intestinais e a doença. Daí, surgiu a ideia de testar a hipótese: será que a inflamação no sangue poderia fazer a ponte entre o intestino e o cérebro?", afirmam os pesquisadores em comunicado.
A pesquisa foi publicada no Journal of Alzheimer’s Disease e indica que tudo acontece por conta do eixo intestino-cérebro, que faz uma ligação entre os órgãos de forma bidirecional para trocas de sinalizações químicas a fim de controlar o apetite e a digestão. Nessa troca, pesquisadores já desconfiavam de uma liberação de compostos que afetavam a função cerebral.
Para investigar o caso, os pesquisadores que lideraram o novo estudo analisaram dados de tomografias cerebrais e exames de sangue de 89 voluntários que tinham idades entre 65 e 85 anos. Algumas destas pessoas tinham diferentes graus de declínio cognitivo, enquanto outras eram saudáveis.
Os pesquisadores descobriram que quem possuía mais placas amilóides, conhecidas por serem indicadores de Alzheimer, também tinham no sangue níveis elevados de lipopolissacarídeos, componentes presentes na parede celular de bactérias existentes no intestino humano. Elas podem não só estimular a formação de mais placas amilóides, como também aumentar a inflamação cerebral. Mas não foi apenas o lipopolissacarídeo encontrado na pesquisa. O acetato e o varelato, ácidos graxos de cadeia curta, também foram encontrados em níveis elevados em pacientes com Alzheimer.
A pesquisa apontou ainda que níveis mais baixos de placas amilóides foram correlacionados com a presença de altos níveis de butirato, um ácido graxo que pode reduzir a inflamação cerebral.
Apesar das novas evidências que apontam a ligação entre a doença e os compostos liberados por bactérias intestinais, os pesquisadores pedem calma e afirmam que as descobertas são mais importantes para a elaboração de formas de detecção de pessoas com propensão ao desenvolvimento do Alzheimer, o que permitiria uma intervenção médica mais rápida em casos de maior propensão a desenvolver a doença.
Em busca da cura
Outra pesquisa, conduzida no início deste ano por cientistas brasileiros, visava o diagnóstico da doença pela saliva. Com base em um estudo realizado em 2008, onde foi percebida a presença de substâncias no sangue de pessoas que tinham a doença, o cientista e biotecnólogo Gustavo Alves e sua equipe desenvolveram um teste que utiliza biomarcadores para identificar a doença 30 anos antes dos sintomas começarem a aparecer.
Em janeiro, eles planejavam reunir 180 pacientes – entre eles, 60 idosos com a doença, 60 idosos sem a doença e 60 jovens sem a doença -, e coletarem sua saliva, para depois colocá-la em processo de centrifugação e viabilizar a identificação das proteínas. Com a covid-19, ainda não há informações a respeito do novo cronograma do estudo.
Ainda não há um consenso a respeito de como é possível evitar a doença. Contudo, alguns pesquisadores dão pistas de como isso pode ser possível: um estudo publicado em maio pelo Amerian Journal of Clinical Nutrition mostra que o consumo regular de alimentos ricos em flavonoides pode reduzir em até quatro vezes a chance de desenvolver Alzheimer ou outras condições neurodegenerativas. O estudo avaliou a dieta de 2.801 pessoas durante vinte anos.
Em busca da cura, cientistas da Universidade de Bath desenvolveram, no último ano, um chip de silicone que poderia ser implantado no cérebro de pacientes, a fim de "imitar" as funções de neurônios danificados pela doença.