Leonardo da Vinci: gênio renascentista deixou descendentes até os dias atuais (Stock Montage/Getty Images)
Repórter
Publicado em 28 de maio de 2025 às 06h00.
Após três décadas de intensa pesquisa genealógica, o grupo internacional conhecido como Leonardo DNA Project lançou recentemente o livro "Genìa Da Vinci. Genealogy and Genetics for Leonardo's DNA" ("Genìa Da Vinci. Genealogia e genética do DNA de Leonardo", em tradução livre). A obra revela detalhes impressionantes sobre a árvore genealógica do mestre renascentista, que remonta a 1331, abrangendo 21 gerações e mais de 400 indivíduos, conforme comunicado oficial do projeto.
Apesar de Leonardo da Vinci não ter deixado descendentes diretos, sua vasta prole de meio-irmãos – estimada em até 22 por algumas fontes – permitiu rastrear sua linhagem até os dias atuais, segundo a agência de notícias alemã Deutsche Welle.
Um dos achados mais surpreendentes foi a identificação de 15 descendentes da linhagem masculina da família da Vinci, ligados tanto a seu pai quanto ao meio-irmão Domenico Benedetto. Embora o comunicado não confirme a situação de todos, seis desses descendentes vivos passaram por análises genéticas.
O que torna essa descoberta revolucionária é que os seis indivíduos compartilham segmentos idênticos do cromossomo Y, que é transmitido de pai para filho.
Segundo David Caramelli, diretor do projeto e pesquisador da Universidade de Florença, "isso sugere que a linha masculina da família da Vinci permaneceu geneticamente intacta por pelo menos 15 gerações."
Além disso, os pesquisadores confirmaram a existência de uma tumba familiar na igreja de Santa Croce, em Vinci, local onde podem estar sepultados o avô de Leonardo, Antonio, seu tio Francesco, e diversos meios-irmãos.
Antropólogos da Universidade de Florença recolheram fragmentos ósseos para análise, e Caramelli destacou que um desses fragmentos corresponde a um homem cuja idade coincide com a dos parentes supostos do artista.
Conforme Alessandro Vezzosi, coautor do livro, "nosso objetivo ao reconstruir a linhagem da família da Vinci até os dias de hoje é possibilitar a pesquisa científica de seu DNA." Ele ainda acrescenta: "Esperamos entender as raízes biológicas de sua extraordinária acuidade visual, criatividade e, possivelmente, até mesmo aspectos de sua saúde e causas de morte."
O livro também traz revelações além da genética, explorando aspectos inéditos da vida do artista. Por exemplo, ao investigar antigos registros cadastrais, os autores identificaram sete residências da família da Vinci na vila e no castelo de Vinci, além de duas propriedades pertencentes a Leonardo, herdadas de seu tio Francesco.
Entre as descobertas mais intrigantes está um desenho a carvão encontrado na lareira de um edifício antigo em Vinci, batizado como Dragão Unicórnio. A obra retrata uma criatura fantástica com chifre em espiral, focinho alongado, dentes em gancho, língua flamejante, escamas e uma grande asa membranosa.
Especialistas sugerem que esse desenho, de "rara intensidade expressiva", pode ter sido criado pelo próprio Leonardo.
Outro ponto fascinante do livro é a hipótese de que Leonardo da Vinci tenha sido um precursor do que hoje chamamos de epigenética. Seus escritos sobre hereditariedade indicam que fatores como dieta, sangue e comportamento dos pais poderiam influenciar os descendentes, antecipando descobertas modernas sobre como o ambiente modifica a expressão genética.
A coautora Agnese Sabato afirma: "Em seus estudos sobre geração, a concepção se torna um ato complexo no qual a natureza, a emoção e o destino se cruzam."
Jesse H. Ausubel, diretor do projeto e pesquisador da Universidade Rockefeller, mostra-se otimista: "Até mesmo uma pequena impressão digital em uma página pode conter células para sequenciamento. A biologia do século 21 está mudando a fronteira entre o incognoscível e o desconhecido."
Apesar das expectativas, os cientistas mantêm cautela. Caramelli ressalta que análises mais detalhadas são necessárias para confirmar se o DNA extraído dos ossos está preservado o suficiente para validar essas descobertas.
De acordo com o site britânico IFL Science, o trabalho ainda não passou por revisão por pares e que não existe DNA confirmado do próprio Leonardo. O projeto se baseia em análises genealógicas e nos fragmentos ósseos da tumba em Santa Croce, onde se acredita estarem parentes do artista.
Iniciado em 2016, o projeto coordenado pela Universidade Rockefeller, com a participação do J. Craig Venter Institute e da Universidade de Florença, representa um marco na convergência entre ciência, história e cultura. Se os pesquisadores conseguirem sequenciar DNA suficiente, poderemos entrar numa nova fase da compreensão do homem que pintou a Mona Lisa e idealizou máquinas voadoras séculos antes de seu tempo.