Ciência

A história de Chester, o gato siamês que 'assinou' artigo científico há meio século

Em 1975, Chester, um siamês, foi creditado como autor em estudo de física para driblar exigência editorial

Gato siamês: há 50 anos, um deles se tornou autor de artigo científico  ( Omer Taha Cetin/Anadolu Agency via Getty Images)

Gato siamês: há 50 anos, um deles se tornou autor de artigo científico ( Omer Taha Cetin/Anadolu Agency via Getty Images)

Raphaela Seixas
Raphaela Seixas

Estagiária de jornalismo

Publicado em 2 de junho de 2025 às 10h30.

Tudo sobrePesquisas científicas
Saiba mais

Em 1975, uma publicação científica surpreendeu a comunidade acadêmica ao apresentar um gato como coautor .

O siamês Chester, animal de estimação do físico Jack H. Hetherington, apareceu creditado no prestigiado periódico Physical Review Letters sob o pseudônimo F. D. C. Willard. A razão? Uma exigência editorial e uma máquina de escrever.

Um plural que virou problema

Hetherington, professor da Universidade Estadual de Michigan, havia redigido um artigo técnico sobre trocas atômicas no isótopo hélio-3 em baixíssimas temperaturas. O estudo, intitulado Two-, Three-, and Four-Atom Exchange Effects in bcc ³He, usava pronomes como “nós” e “nosso” ao longo do texto.

Na década de 1970, o periódico não aceitava artigos no plural escritos por um único autor. Para evitar a reescrita completa do material — feito em máquina de escrever — o físico optou por uma saída inusitada: adicionar um segundo autor fictício.

Nasce F. D. C. Willard

O nome usado, F. D. C. Willard, foi formado a partir de Felis Domesticus Chester Willard: a espécie do gato doméstico, o nome de Chester e o do pai do felino. A assinatura passou despercebida pelos editores, e o artigo foi publicado normalmente em novembro de 1975.

Chester foi listado como membro do Departamento de Física da Universidade de Michigan, sem levantar suspeitas. A publicação teve boa recepção e chegou a ser citada mais de 60 vezes por outros estudos acadêmicos.

A revelação do segredo

Três anos depois, em 1978, a brincadeira foi revelada em uma conferência científica. Hetherington levou cópias do artigo assinadas com sua rubrica e a “pata” de Chester.

A revelação causou surpresa e riso entre os colegas de profissão, mas não comprometeu a credibilidade do trabalho científico.

Chester publica novamente

O sucesso da história levou Chester a “assinar” um segundo artigo em 1980, dessa vez sozinho. Publicado em francês no periódico La Recherche, o texto tinha o título L’hélium 3 solide: un antiferromagnétique nucléaire (“O hélio 3 sólido: um antiferromagnético nuclear”).

A brincadeira foi tão bem recebida que o chefe do departamento chegou a convidar Chester para integrar, de forma simbólica, o corpo docente da universidade.

O legado científico do gato

Apesar da origem inusitada, o artigo tem conteúdo técnico relevante e é citado até hoje em estudos de mecânica quântica e física de baixas temperaturas.

Em 2014, a Sociedade Americana de Física reconheceu o valor e a curiosidade histórica da publicação, disponibilizando gratuitamente artigos “assinados por gatos”.

Inspiração para outras farsas científicas

A história de Chester inspirou outras ações semelhantes. Um dos casos mais conhecidos é o do gato Larry, que chegou a ser citado mais de 130 vezes em bases acadêmicas — parte de uma crítica bem-humorada aos sistemas de indexação de autores em pesquisas científicas.

Chester morreu em 1982, mas se tornou símbolo de criatividade e humor no ambiente científico. Até hoje, seu nome aparece em compilações sobre os episódios mais inusitados da ciência moderna.

Acompanhe tudo sobre:GatosPesquisas científicasAnimaisQuímica (ciência)Curiosidades

Mais de Ciência

Pesquisadores ligam intestino ao Alzheimer e mostram que dieta pode ajudar a frear inflamação

Cabe um docinho? Estudo explica por que sempre sobra espaço para sobremesas ao final das refeições

SpaceX adia lançamento do Starship após problemas técnicos

Como identificar mentirosos? Cientista revela técnica 'infalível' para desmascarar os inimigos