Jô Soares assina a tradução e a adaptação do texto, escrito pelo dramaturgo britânico Patrick Hamilton (Rede Globo/Divulgação)
Agência O Globo
Publicado em 15 de agosto de 2022 às 14h13.
Com estreia marcada para 9 de setembro, em São Paulo, a peça "Gaslight - uma relação tóxica", último trabalho de Jô Soares no teatro, abriu venda para ingressos na última semana pelo Sympla. Jô assina a tradução e a adaptação do texto, escrito pelo dramaturgo britânico Patrick Hamilton (1904-1962) em 1938, além de dividir a direção com Mauricio Guilherme. A princípio, estão previstos dois meses de temporada em cartaz no Teatro Procópio Ferreira, localizado na região central da capital paulistana.
Trata-se da primeira montagem da peça no Brasil. "Gaslight" estreou no Richmond Theatre, em Londres, em 1938, antes de ir para a Broadway nos anos 1940. A trama gira em torno de uma relação abusiva na qual um homem manipula sua esposa ao ponto de torná-la descrente de si própria. A versão brasileira começou a ser planejada em 2018 e era pra ter estreado em 2020, no Teatro Faap, em Higienópolis, mas foi adiada por conta da pandemia.
A atriz Erica Montanheiro, que compõe o elenco de "Gaslight", diz que a morte de Jô Soares abalou toda a equipe e o elenco envolvido no espetáculo, mas que a data de estreia não foi alterada justamente em homenagem ao diretor, escritor e apresentador.
"Mantivemos a data em honra a ele, que era tão trabalhador, tão capricorniano. A encenação está pronta. O projeto é de 2018, então tivemos muitas conversas. O direcionamento é todo dele, o tom, a abordagem dos personagens. O trabalho com ele sempre tinha muito tempo de mesa. Quando a gente levantava, a coisa já estava super entendida. Agora é cumprir as orientações do mestre e botar a peça pra encontrar o público. Vai ser catártico fazer em homenagem a ele esse trabalho que desenvolvemos com tanto carinho", diz a atriz, que divide o elenco com Leandro Lima, Kefera Buchmann, Giovani Tozi e Neusa Maria Faro.
Erica conheceu Jô em 2011 na primeira peça em que trabalharam juntos, "O libertino", do dramaturgo francês Éric-Emmanuel Schmitt, que tinha adaptação e direção assinada por ele. Depois, em 2016, ela foi dirigida por ele mais uma vez em "Histeria", a qual Jô teve a ideia de trazer para o Brasil após assisti-la em Paris, com John Malkovich em cena.
"O que mais aprendi com ele foi a questão da comédia. Às vezes, ele falava: 'faz assim, que vai ser um tiro', no caso 'tiro' era fazer as pessoas rirem, e dava certo mesmo. Ele sabia tudo do tempo de comédia. E de como, às vezes, fazer mais simples pra ser mais engraçado. Ele dizia que a gente tinha que fazer a plateia achar que aquilo era feito sem esforço, pra ficar o mais natural possível. O tempo todo ele estava de olho na plateia", afirma Montanheiro.
Nas últimas mensagens que trocou com Jô, cerca de duas semanas antes dele ser internado, o diretor disse que "já estava melhorando" e prometeu um encontro com o elenco e produção da peça assim que ficasse bom. Não deu tempo. A notícia da morte do amigo, que a chamava de Eriquinha, veio por mensagens na manhã da última sexta-feira. Ela lembra que acordou "do nada", às 6h, e que quando soube o que aconteceu ficou "catatônica, olhando para o teto por duas horas", antes de chorar pela perda. Passados quatro dias da morte de Jô Soares, para ela, às vezes a ficha não cai.
"Foi o diretor com quem eu mais trabalhei" afirma a atriz, de 44 anos. "Ele era de uma delicadeza incrível, super democrático. Fazia uma demarcação prévia dos personagens no palco, mas se a gente questionava, ele aceitava e ainda brincava dizendo que estava 'muito melhor'. A gente ficava muito à vontade com ele, muito confiante. Me sentia muito livre para propor qualquer coisa, fazer as coisas mais idiotas. Ou ele ia achar que estava bom, ou até para dizer que era ruim, era leve e engraçado", conclui.
A perda de Jô repercutiu muito em Portugal, sendo noticiada nos principais veículos lusitanos. “Morreu Jô Soares, o humorista que entrou em Portugal com ‘Viva o Gordo!’”, destacou o Diário de Notícias, que ainda destacou a nota de condolências do presidente português Marcelo Rebelo de Sousa.
O Público, um dos principais veículos portugueses, fez vasta cobertura sobre o falecimento de Jô Soares. Além de um obituário, o jornal publicou em seu site várias notícias sobre o apresentador. Uma, inclusive, relembrou inúmeras personalidades de Portugal que passaram pelo sofá de Jô, como José Saramago, Ana Moura, Valter Hugo Mãe, dentre outros.
O site português NIT também relembrou o brasileiro, destacando o sucesso da série “Planeta dos homens”, em Portugal, nos anos 1970. Publicações latino-americanas também repercutiram a perda de Jô, como o Portal Montivideo (Uruguai), o jornal Última Hora (Paraguai) e o jornal La Voz (Argentina).