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"Tenho para quem ligar em qualquer país” , diz Lenine

Músico fala de suas viagens, sua paixão por orquídeas e seu trabalho. Em outubro, ele lançou um novo álbum, “Chão”

Lenine: “Um show ao vivo é como uma final de campeonato” (Divulgação)

Lenine: “Um show ao vivo é como uma final de campeonato” (Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 9 de novembro de 2011 às 17h47.

São Paulo - A vida de Lenine parece a letra de Paratodos, de Chico Buarque. Os pais são paraibanos. Os filhos, cariocas. Ele, pernambucano. E seu nome é uma homenagem a um comunista russo. Não é difícil de entender por que Osvaldo Lenine Macedo Pimentel se considera um camaleão.

Gosta de viajar pelo mundo com sua música e no trajeto fazer amigos – ainda mais se gostam da mesma flor do que ele, os “orquidoidos”. Morando no Rio de Janeiro há quase três décadas, o cantor também encontrou um caminho musical próprio.

Nascido em Recife, ficou emparedado entre duas gerações da música pernambucana sem se identificar completamente com nenhuma delas – o som regional da época de Alceu Valença e a alquimia pop da turma de Chico Science. Na sua fuga de rótulos, é capaz de fazer música para novela, como Do It, e também projetos mais experimentais, como a trilha do espetáculo Breu, do Grupo Corpo.

Nos dois casos, com qualidade atestada pela crítica e por um grupo fiel de admiradores, no Brasil e no exterior. Em seu novo trabalho, Chão, volta-se para um estilo vanguardista: a música concreta criada pelo francês Pierre Schaeffer (1910-1955).

Essa escola de composição prega que se combinem sons “musicais” com ruídos “da vida real”. Em sua releitura, Lenine abusa dos barulhos naturais – ou afetivos, como gosta de chamar o som da chaleira e da cigarra – em um CD curto, que não dura nem meia hora. Mas que tem um conceito, algo hoje quase esquecido, numa época em que as pessoas baixam na internet canções individuais e não mais álbuns.


BRAVO!: Você tem carreira sólida fora do Brasil. O que o levou a tentar a sorte mundo afora?

Lenine:  Ao longo do tempo, percebi que o tipo de mistura que eu e minha banda fazíamos causava um interesse no exterior. Descobrimos que nosso estilo de misturar raiz com pop interessava a eles. E fui nesse barco. Em 1992, logo que lancei o álbum Olho de Peixe, iniciamos uma pesquisa sobre os festivais internacionais.  O primeiro país em que me apresentei foi a Holanda. Passamos a frequentar evntos de jazz ou de world music. Hoje, tenho onde cair em qualquer lugar desse planeta. Se estiver numa roubada em Madagascar, tenho para quem ligar. Pulverizei o meu trabalho e fiz amigos nesse processo.  Confesso que meio sem querer eu acabei produzindo discos para gerar shows. No fim, viajar é o melhor de tudo. O termômetro que se tem, quando alguém vê você no palco, não se compara a nada. Essa sensação me fez ritualizar o que faço. A minha música é minha religião. Fazer disco é uma coisa hospitalar, é asséptico. No show, não há subterfúgios. Uma apresentação ao vivo é como fim de campeonato. É o último jogo, tenho que ganhar. Isso dá um sentido, uma vida, isso me alimenta.


O que mais alimenta você?

Lenine: Tenho a minha família (sua mulher, a produtora Anna Barroso, mais três filhos, entre eles, Bruno Giorgi, um dos produtores do novo disco).Sou um dependente químico deles. Além disso, tenho mais de 6 mil orquídeas, isso virou minha droga. Faço os shows em função delas! A cada cidade que vou, levo dois porta-instrumentos vazios para trazer minhas orquídeas.Porque, aos poucos, você vai cansando dessa vida. A orquídea me dá mais desejo de viajar. Eu pesquiso que tipo existe em cada lugar. A primeira coisa que eu faço quando chego a uma cidade é ligar para os “orquidoidos” locais. Em cada flor que eu trago, coloco uma placa dizendo em que viagem a descobri, onde era o show , que momento era aquele. Meu orquidário virou meu banco de memórias.


Você se mudou ao Rio de Janeiro ainda jovem. Foi uma escolha profissional?

Lenine: Foi uma confluência de fatos. Tive meu primeiro filho aos 21 anos, o João. Ele foi “feito” durante um Carnaval em Recife, e a mãe dele morava no Rio. Viajei achando que ia passar só um tempo lá e acabei ficando. Além disso, escolhi o Rio porque já tinha ido anteriormente à cidade e me apaixonei por ela. Tenho uma ligação uterina com o mar.

O Rio de Janeiro influenciou seu estilo musical?

Lenine: Em Recife, meu trabalho era muito imaturo. Num primeiro momento, achava que poderia ser um intérprete de uma geração de pessoas que até hoje são os meus parceiros, como Lula Queiroga, Bráulio Tavares e Ivan Santos. Até que o produtor Roberto Menescal viu um show que eu e o Queiroga fazíamos.

Ele nos levou a um estúdio e gravamos, em 1982, o nosso primeiro disco, Baque Solto. Na verdade, o Rio mudou minha atitude de vida, e isso se refletiu na minha música. Quando eu cheguei à cidade, as pessoas me falavam de um passado próximo, que eu não compartilhava com ninguém.

Por outro lado, na medida em que eu ia a Recife, diziam “olha lá, ele está todo carioca”. Tive essa sensação de “exilado”, que foi muito benéfica para mim porque me deu uma coisa meio camaleão. Eu tenho essa capacidade de adaptabilidade e o que me deu isso foi a sensação de eterno estranhamento.

O ÁLBUM
Chão (Universal), de Lenine. Produção: Bruno Giorgi, JR Tostoi e Lenine. Preço a definir.

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