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Saídas para um negócio chamado festival

O Rock in Rio, criado em 1985 em meio à epidemia de outro vírus de natureza tão devastadora quanto o coronavírus mas de outro conceito, o HIV

Rock in Rio: depois do coronavírus, experiências em festivais não serão mais as mesmas (Ian Cheibub/Reuters)

Rock in Rio: depois do coronavírus, experiências em festivais não serão mais as mesmas (Ian Cheibub/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 9 de abril de 2020 às 21h07.

A avó de Roberto Medina costumava contar sobre a gripe espanhola e todas as agonias que chegaram a abater um quarto da população mundial entre janeiro de 1918 e dezembro de 1920, infectando 500 milhões de pessoas e deixando um número estimado de 100 milhões de mortos.

Ruy Castro lembra em seu recente livro, Metrópole à Beira Mar, como o carnaval de 1919, quando o Rio já se sentia seguro para reabrir as avenidas depois de ver cenas de corpos pelas ruas sendo recolhidos por caminhões de lixo, acabou se tornando a festa da vida, o desbunde dos confinados, a desforra dos sobreviventes.

Medina tem nas mãos a maior concentração de pessoas que o calendário musical privado do País proporciona. O Rock in Rio, criado em 1985 em meio à epidemia de outro vírus de natureza tão devastadora quanto o coronavírus mas de outro conceito, o HIV, reúne a cada edição bienal cerca de 700 mil pessoas em sete dias de espetáculos.

Se as experiências de contato humano não serão mais as mesmas, como afirma o biólogo guru dos novos tempos, Átila Iamarino, festivais como o Rock in Rio também não serão. Segundo algumas previsões do comportamento social pós-pandemia, as pessoas levarão um tempo para voltar a frequentar lugares com grandes concentrações e, mesmo aquelas que forem a shows, tomarão precauções, como o uso de máscaras e distanciamento físico, que podem aniquilar parte da entrega em massa da plateia que faz parte do show.

Medina diz que o tempo joga a seu favor e que, em um certo sentido, o confinamento também. A próxima edição do Rock in Rio no Brasil será em setembro de 2021. A de Lisboa, que seria no próximo mês de junho, foi transferida também para 2021. Assim como o carnaval de 1919, 2021 pode ser o ano de uma celebração especial da história do evento.

"Eu estou neste momento em minha fazenda, em um lugar maravilhoso, falando com você. E mesmo assim, sem poder sair daqui, posso sentir como precisamos de liberdade", diz Medina, que segue em sua linha de raciocínio: "Quando eu fui sequestrado (em 1990), voltei iluminado, eu estava vivo, queria fazer tudo acontecer."

Em sua opinião, outros eventos devem sofrer mais com o trauma pós-pandemia, como o próximo réveillon e o carnaval de 2021. "Até setembro, as pessoas vão estar mais preparadas. Elas devem ter uma reação rápida, terão uma necessidade de comemorar. A minha aposta é de que essa sociedade vai estar com desejo de ir para a rua."

Um outro efeito poderia ajudar os eventos no País em meio à reconstrução de 2021, algo parecido com o que aconteceu com a crise mundial de 2008.

"O turismo movimenta todos os anos cerca de R$ 75 bilhões. Como as pessoas estarão traumatizadas com as viagens, e ainda não saberemos como serão as viagens, há uma expectativa de que cerca de R$ 20 bilhões que iriam para o turismo ficarão no Brasil." Assim, os shows e o turismo interno, casos do Rock in Rio, podem entrar como o gasto que elas fariam com a verba que seria usada para as viagens ao exterior.

Medina diz que o grande problema é o fato de não termos uma política pública definida para o setor de turismo e entretenimento no País. Ainda há uma ideia no Brasil, segundo diz, de que "festa é gasto".

"Vemos muitas vezes notícias como 'a prefeitura do Rio gastou tanto com o show de Zeca Pagodinho'. Gastou p... nenhuma. Isso não é gasto, é investimento." O pós-confinamento pode ser a chance para o desbloqueio de uma máquina travada há anos, em suas considerações. "A função do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) seria a de sustentar os empresários pequenos e médios, mas eles não conseguem vencer a burocracia para terem acesso a linhas de crédito."

Ele acredita que a saída passa por uma política na qual o Estado entraria para fazer a roda girar e iria retirando sua participação aos poucos. "Se o Estado não entrar, a roda não gira." Medina lamenta que ainda não haja entendimento para se criar uma estrutura rentável. "Fazer cultura é algo muito barato."

Seriado

A Conspiração Filmes e a Globo estão produzindo uma série com oito capítulos, de 30 minutos cada, que vai narrar a vida do empresário Roberto Medina. Desde a carreira como publicitário, passando por um sequestro acompanhado pela imprensa, em 1990, até as edições do Rock in Rio, que começaram em 1985 com shows históricos, como o do Queen e o primeiro do Iron Maiden na América Latina, o especial está previsto para estrear no segundo semestre de 2020.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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