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Quebras, acidente e desistências: as marcas da 70ª Regata Santos-Rio

Dos 68 barcos participantes, mais de metade ficou pelo caminho e cogitou-se a suspensão da regra de prazo máximo de 96 horas para completar a prova

Cena da 70ª Regata Santos-Rio  (Divulgação/Divulgação)

Cena da 70ª Regata Santos-Rio (Divulgação/Divulgação)

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Daniel Salles

Publicado em 27 de outubro de 2020 às 12h23.

Última atualização em 27 de outubro de 2020 às 19h09.

Com relatos de ondas de até 3,5m e fortes ventos contra de até 36 nós (65km/h), a 70º Regata Santos-Rio certamente entra para a história como uma das edições mais difíceis. A mais dura para muitos. Transforme-se em um líder de inovação! Conheça o curso Inovação na Prática

Dos 68 barcos participantes, mais de metade (37, no total) ficou pelo caminho. Por isso, alguns comandantes chegaram a cogitar a suspensão da regra de prazo máximo de 96 horas para completar a prova, que expira nesta terça-feira (27), às 12h44, no Iate Clube do Rio de Janeiro, no Rio.

“Houve muitas quebras, algumas pessoas machucadas, mas o espírito marinheiro prevaleceu. Quem chegou já é um vitorioso porque foi uma regata bem dura”, avaliou Lars Grael, comandante do Avohai (IMX 40’), que terminou na 5° colocação, em entrevista exclusiva a EXAME.

Participantes da cena da 70ª Regata Santos-Rio (Divulgação/Divulgação)

Disputa com o mar
A disputa foi além do duelo entre atletas olímpicos anunciado intensamente durante a pomposa largada (queimada três vezes), com salvas de canhão do veleiro Cisne Branco, da Marinha do Brasil, e recorde de inscritos, no Iate Clube de Santos, no litoral de São Paulo.

A briga maior foi dos cerca de 500 velejadores participantes e seus próprios barcos contra as condições climáticas extremas para permanecer na regata e, ao menos, completar o percurso de 200 milhas náuticas (340km).

Expoente do esporte da vela, Lars deu nota para o desafio. “De 0 a 10, sendo o dez o inferno, acho que foi 6,5. Parece pouco, mas é muito. O chamado mar de almirante, considerado tranquilo, é 0 a 3,5. Depois disso fica difícil. Em 7 é pra recolher, se proteger e salvar a vida porque, a partir dali, é o inferno. A gente esteve próximo do limite em termos de segurança. Um pouco mais do que isso seria recomendável os barcos abandonarem a regata e procurarem um porto seguro”,  completou o velejador, duas vezes medalhista olímpico (Seul 1988 e Atlanta 1996), sobre a 19ª participação no evento.

Acidente e grandes dificuldades
Boa parte dos barcos mais competitivos tomou a decisão de rumar para mar aberto e deixar a Ilhabela ‘por fora’, onde foram relatadas as condições mais críticas de ondas e ventos, especialmente ao largo da Ponta do Boi. E foi exatamente neste ponto que o acidente mais grave registrado no percurso feriu um tripulante do veleiro Kaze (Jeanneau Sun Odissey ) atingido na cabeça pela retranca logo após a quebra do mastro.

Gilson Katayama, comandante do barco, contava com um médico a bordo que prestou um rápido atendimento. “Tentamos uma evacuação do paciente para o navio da Marinha, mas as condições de salvamento eram impossíveis dadas as condições do mar. Nem mesmo utilizando a lancha inflável seria uma operação segura para um paciente desacordado”, relatou ele, sobre o companheiro de tripulação, que está hospitalizado, mas “já consciente e respondendo”.

“Foi muito penoso, muito vento, vagaria grande. Então, não foi uma regata prazerosa para gozar daquilo que a gente está fazendo. Quase arranco involuntariamente a mão de um deles”, lembrou o comandante Celso Quintela, do Sorsa III (Bruce Farr 51), Fita Azul (concedida ao primeiro barco a completar a prova) pelo terceiro ano consecutivo, à EXAME.  Passava de duas e meia da madrugada de domingo quando cruzou a linha de chegada na Ilha da Lage, na baía de Guanabara (quase 38 horas após o início da prova).

 

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Barco ou os cabos arrebentariam
O atleta olímpico Samuel Albrecht, comandante do veleiro Crioula (Soto 40’), segundo a completar o percurso, explicou que o mar “pesado, muito agitado e desencontrado” afetou o equilíbrio a bordo. “Foram diversos perrengues e a gente exigiu 60%, 70% do material. Se exigisse 100%, o barco não aguentaria, a gente quebraria. Do jeito que batia nas ondas, ou o barco ou os cabos arrebentariam. Tivemos que dosar energia para chegar até o final e, como comandante, sou responsável pela equipe e estou sempre pesando essas decisões”, destacou Samuel.

Segundo Isabel Swan (bronze nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008), tripulante do Boto IV (Solaris 50’), comandado por André Sobral, a regata foi um grande aprendizado. “Me mostrou que eu tenho que confiar cada vez mais no que sei e que conquistei como medalhista olímpica. Corri muitas horas no leme, velejei com vento forte, levando a tripulação à noite e foi um prazer inenarrável”, disse a velejadora.

Cena da 70ª Regata Santos-Rio (Divulgação/Divulgação)

Quem chega primeiro, nem sempre é o campeão
Uma regata tradicional, difícil e prestigiosa como a Santos-Rio atrai uma grande diversidade de barcos e tripulações das comunidades de vela do Brasil. E, para participarem do mesmo evento, regras de comparação são estabelecidas antes do início da regata. Assim, as verdadeiras máquinas de competição, como veleiros cujos mastros, por exemplo, são feitos com materiais ultra-modernos e caríssimos em fibra de carbono (que chegam a custar mais da metade do preço do barco) possam compartilhar do mesmo evento com embarcações de menor vantagem. Ou seja, cruzar a linha de chegada primeiro não garante o primeiro lugar. O desempenho deve superar tais condições vantajosas.

Campeões na súmula
Em tempo corrigido, levando em conta as características dos barcos e as categorias, os campeões foram o veleiro Ventaneiro (Dufour 500), do comandante Renato Cunha, na categoria ORC, o CBVela-Ruda (First 40.2), de Torben Grael, na categoria IRC, e o Pangea (Fast 395), comandado por Jorge Carneiro, na categoria BRA-RGS.

Nas categorias Mini-Transat e Clássicos, o Pinguim/Orama, de Maurício Santa Cruz (pentacampeão mundial), e o Aventura, de José Bastiani, foram os vencedores, respectivamente. Maurício, inclusive, comandou o barco em dupla durante mais de três dias começando sua preparação para os Jogos Olímpicos de Paris 2024, que terá a categoria de Vela de Oceano.

Na categoria Bico de Proa nenhum dos nove barcos completou.

Pandemia e fome de regata
De acordo com Ricardo Baggio, diretor de vela do Iate Clube do Rio de Janeiro, a pandemia, que impediu a realização da Semana de Vela de Ilhabela e da Refeno (Rece), é um dos fatores para esse grande número de barcos inscritos. “O pessoal ficou carente de velejar e da oportunidade de participar de um grande evento. Por isso, todo mundo se concentrou para participar desta regata”, opina. No entanto, três fatores influenciaram nos resultados: estratégia, condição do barco e experiência da tripulação. Isso explica o grande número de desistências.

Mario Martinez, comodoro da Associação Brasileira de Vela de Oceano (ABVO), destacou a importância do apoio de todas as entidades envolvidas. “Fomos brindados com uma regata duríssima, digna dos 70 anos desse desafio, que é a Santos-Rio”, finalizou.

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