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Qual é o próximo destilado da moda? Há quem aposte no tradicional applejack

Depois do sucesso do gim, que ameaçou o reinado da vodca e da cerveja, destilarias americanas estão apostando na bebida à base de maçãs, sepultada pela Lei Seca há um século

Wright Flyer, drinque que leva applejack (Christopher Simpson/The New York Times)

Wright Flyer, drinque que leva applejack (Christopher Simpson/The New York Times)

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Daniel Salles

Publicado em 17 de fevereiro de 2021 às 14h44.

Última atualização em 17 de fevereiro de 2021 às 15h18.

Moravian Falls, Carolina do Norte – Na viagem até Brushy Mountain através de florestas de pinheiros, o GPS vai enfraquecendo rapidamente. "Pegue à esquerda na placa 'Estrada Bloqueada'" é a primeira de muitas orientações que John Holman envia aos visitantes de sua destilaria, aqui no extremo leste das Montanhas Blue Ridge.

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A ponte para a propriedade foi derrubada pela tempestade tropical Eta em novembro passado, e a pandemia afugentou os clientes que normalmente a visitam para comprar seus destilados de alto teor alcoólico, também conhecidos como aquavita, vodca e schnapps. Mas Holman ainda deposita energia e orgulho em seu projeto favorito: o applejack.

A Holman Distillery é um dos vários novos produtores, aqui e em outras regiões ricas em maçã, que estão revivendo essa bebida essencialmente americana – a bebida original das colônias – depois do golpe mortal que recebeu da Lei Seca há um século.

Holman, de 49 anos, está retomando o applejack, alinhando-o ao gosto moderno, envelhecendo a bebida em barril para lhe dar o toque suave do conhaque fino e aprimorando lotes de varietais para destacar o sabor da fruta.

Assim como os destilados americanos de longa data, como o bourbon Pappy Van Winkle e o uísque de centeio da Michter, tornaram-se tão procurados quanto conhaques franceses e uísques escoceses single malt, os novos conhaques de maçã têm legado e sabor suficientes para conquistar um séquito dedicado.

O applejack era tradicionalmente produzido a partir da cidra, e era a bebida cotidiana da maioria dos americanos no século XVIII. Naturalmente fermentada e com baixo teor alcoólico, era mais segura que a água do poço, mais barata que a cerveja e mais fácil de fazer em casa.

Becky Harris, que fundou a destilaria Catoctin Creek, ergue um shot de applejack envelhecido (Alyssa Schukar/The New York Times)

Nesta região fria e fértil dos Apalaches, a maçã era muito mais abundante do que os grãos necessários para fazer uísque. Antes e durante a era da Proibição, havia inúmeros produtores fazendo e vendendo (ilegalmente) applejack nas Montanhas Blue Ridge, onde as estradas eram limitadas e as árvores forneciam a proteção contra agentes do governo.

O applejack original, que muitos historiadores acreditam ter sido inventado por colonos americanos, era produzido por um método nada tecnológico chamado "jacking". Os jacked são destilados não pelo método usual de ebulição, mas por congelamento, e qualquer um com um suprimento de cidra e tempo frio poderia fazê-lo.

A cada congelamento, a água da cidra se transforma em gelo macio. Cada vez que esse gelo é retirado, a concentração de álcool aumenta, até que o que resta no barril atinge cerca de 40 graus. Essa bebida clara é o applejack – não tão forte quanto os destilados modernos como a vodca, mas forte o suficiente para durar todo o inverno.

O applejack original era provavelmente turvo, com pedaços de casca, abelhas, folhas e o que mais caísse no barril ao longo do inverno. As novas versões – de produtores como Catoctin Creek e Holman Distillery – variam do "eau de vie de pomme" claro e com alto teor alcoólico até os "licores dourados", muitas vezes chamados de applejack envelhecido, ou conhaque de maçã.

A multidão local adepta de coquetéis artesanais recebeu de braços abertos os novos conhaques de maçã, usados em clássicos como o old-fashioned. Bartenders criativos, como Drew Furlough, do restaurante District 42, próximo a Asheville, estão elaborando novas bebidas com o applejack, como o Wright Flyer, uma variação do Paper Plane. "As ideias culinárias locais por aqui se tornaram um hábito meu", disse ele.

À medida que as microprodutoras de sidras são abertas nas fazendas, nas cidades e nas microcervejarias, a sidra e o applejack vão ganhando uma infraestrutura mais robusta, afirmam os produtores. Mas as destilarias que produzem bebidas de alto teor alcoólico permanecem fortemente reguladas.

Scott e Becky Harris abriram a Catoctin Creek em Purcellville, na Virgínia, em 2009, como parte do que Scott Harris descreveu como uma "crise de meia-idade", durante a qual deixaram seu emprego e sua cidade para trás para entrar em um campo sobre o qual nada sabiam. Becky Harris, de 53 anos, é uma engenheira química que trabalhou mais recentemente no desenvolvimento de polímeros microscopicamente finos para lentes de contato.

John Holman em Moravian Falls (Travis Dove/The New York Times)

O uísque é seu principal produto, fabricado a partir de grãos como milho, centeio e trigo. Mas os conhaques de frutas delicadas e perfumadas, incluindo o de maçã Quarter Branch, são a paixão de Becky Harris.

Como a maioria dos fabricantes modernos de applejack, ela usa um complexo processo de destilação a vapor, descrevendo-o como o oposto ao método de jacking. Ela explica que, em vez de remover a água da cidra, a arte está na remoção do álcool – mantendo intacto o sabor da fruta. "As gorduras, ésteres e outros produtos químicos de sabor devem acompanhar o álcool. Você tem de prová-lo e cheirá-lo a cada passo do processo."

Como faz a maioria dos fabricantes de applejack de pequena escala, a Catoctin Creek começa o processo não com maçãs frescas, mas com cidra, adquirida da empresa Blue Bee Cider, em Richmond, na Virgínia, no tipo de colaboração frequentemente encontrada entre os produtores artesanais. Os Harris enviam alguns de seus conhaques prontos para a Blue Bee, onde são misturados com o vinho de maçã fortificado e "eau de vie" de gengibre, produzindo uma sidra picante chamada Firecracker, que acompanha sobremesas.

De acordo com ela, o lote deste ano é feito de Winesap, Pippin, Arkansas Black e outros tipos de maçã que são bons para fazer conhaque porque são pouco doces, mas compartilham um sabor forte e concentrado de maçã que se mantém na destilação. As maçãs grandes e doces que foram desenvolvidas para comer, como a Red e Golden Delicious, são muito açucaradas e aguadas. "Você precisa de muito sabor", observou ela.

Depois da destilação, Scott Harris, de 50 anos, assume o processo de envelhecimento em barril que dá ao Quarter Branch sua cor âmbar e seu sabor profundo, método baseado na produção tradicional de Calvados, o conhaque de maçã exclusivo da região da Normandia, no noroeste da França. Ele prefere o carvalho branco de Minnesota; outros produtores estão usando barris de bourbon carbonizados do Tennessee, barris de xerez descartados da Espanha e até mesmo barris turfados de uísque escocês, usando a variação para produzir as notas de couro envelhecido e maçã verde jovem, caramelo e baunilha que deixam o conhaque de maçã naturalmente perfumado, doce e delicioso.

A Laird & Co., a mais antiga destilaria em operação contínua nos Estados Unidos, começou a produzir o applejack em Nova Jersey em 1698, e deu a receita da família a George Washington na década de 1760, quando a primeira destilaria em Mount Vernon foi construída. (Durante a Lei Seca, a relação de longa data da família com a Casa Branca valeu a pena; a empresa recebeu uma licença federal especial para produzir applejack "para fins medicinais").

No século XVIII, quando as Montanhas Blue Ridge faziam parte de uma remota fronteira ocidental, o applejack era tão valorizado que chegava a ser usado como moeda local.

Quando o produtor John Chapman chegou espalhando sementes de maçã, o que lhe rendeu seu apelido, Johnny Appleseed, a ideia não era a produção de mais tortas, mas sim da cidra, alimento básico que salvava vidas, além de ser uma forma valiosa de moeda – e porque estava de olho na especulação imobiliária, comprando terras que mais tarde alcançariam um preço mais alto com pomares de frutas.

O applejack de John Holman (Travis Dove/The New York Times)

Applejack percorreu um longo caminho desde a bebida caseira ilícita que frequentemente continha compostos perigosos, como metanol e acetona, que podem causar cegueira, insuficiência renal e outros danos permanentes.

Esses riscos à saúde tornaram os pomares de maçã um alvo do movimento de temperança, que começou no século XIX. Em 1884, quando o movimento ganhou força, o "The New York Times" publicou um editorial intitulado "Uma Bebida Perversa", condenando não apenas os destilados em geral, mas o applejack em particular. "O nome tem uma aparência caseira e inocente, mas na realidade o applejack é uma bebida particularmente poderosa e maligna", dizia o jornal. Quando a Lei Seca terminou em 1933, os pomares haviam desaparecido e nunca foram replantados, porque os grãos baratos e abundantes facilitaram a produção de uísque.

"A proibição matou a biodiversidade das maçãs neste país", afirmou Holman.

Muito antes de entrar no ramo dos destilados, Holman havia se formado em Química na Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, e tinha planos de seguir seu pai na profissão médica.

Mas se interessou pelo vinho, e trabalhou nesse campo por 16 anos antes de construir sua destilaria aqui, onde há quase tantos pomares de maçã quanto igrejas.

Quando começou, Holman planejava criar destilados únicos com um terroir estritamente local, como gim aromatizado com zimbro, e vodca feita de uva muscadina nativa. No entanto, mesmo os consumidores de coquetéis sofisticados não ligaram muito para seus produtos, de modo que ele optou por um mais acessível: o applejack. "Ninguém nunca me perguntou o que é uma maçã", disse ele.

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