O ex-técnico da Seleção Brasileira Luiz Felipe Scolari abraça o atacante Neymar (Getty Images)
Da Redação
Publicado em 14 de julho de 2014 às 09h54.
Rio de Janeiro - Em 1950, o tom de fracasso obtido pela derrota na Copa do Mundo em casa se deveu mais à festa feita antes da hora por torcedores, dirigentes e autoridades nos momentos que antecederam a final.
Em 2014, porém, a perda do título e principalmente a humilhação sofrida na semifinal se explica somente pelo que aconteceu dentro de campo, pelas escolhas feitas pela comissão técnica e pelo atraso do futebol do país.
Nos 7 a 1 aplicados pela Alemanha no Mineirão, ficou evidente que o Brasil precisa se reinventar taticamente, seja criando uma forma de jogar ou copiando a dos adversários.
O que nunca mais pode acontecer é a equipe pentacampeã mundial continuar tendo jogadores tão bons com o adversário e mesmo assim ser atropelada por não povoar determinado certo do campo de jogo ou estar com a marcação frouxa.
Deixando de lado a parte política e a obsolescência dos dirigentes brasileiros, que beiram o amadorismo, dentro das quatro linhas e na preparação para entrar nelas, o atraso é sensível.
Dizer que Luiz Felipe Scolari parou no tempo desde o pentacampeonato, em 2002, seria injustiça, mas o técnico hoje está distante taticamente do nível de Joachim Löw, Louis van Gaal e Alejandro Sabella, que também chegaram às semifinais da Copa, ou mesmo de José Pekerman, Jorge Luis Pinto e Jorge Sampaoli, que fizeram campanhas dignas com Colômbia, Costa Rica e Chile, respectivamente.
Felipão foi muito bem em 2002. Apostou em Rivaldo e Ronaldo, dois craques que vinham em baixa por problemas físicos, mas brilharam e decidiram quando foi preciso.
Também soube armar um esquema adequado à época e ao "pé de obra" que tinha em mãos.
O trio de zaga e o volante Gilberto Silva davam segurança para que os laterais Cafu e Roberto Carlos e, principalmente, o trio de "R" - Ronaldinho, Rivaldo e Ronaldo - resolvessem na frente.
Passados 12 anos, porém, o treinador mostrou que pouco acompanhou a evolução do futebol três Copas depois.
Enquanto as outras seleções e os grandes times jogam cada vez mais compactos, o Brasil tinha linhas espaçadas.
A Alemanha fez o que quis com os enormes buracos encontrados no meio de campo.
Com tanto espaço entre os setores, a seleção abusou dos lançamentos. David Luiz e Thiago Silva são bons lançadores, mas não podem ser os principais criadores de uma equipe.
Os passes longos dão certo quando feitos para surpreender o adversário, mas se mostram ineficazes quando feitos exarcebadamente.
Outro pecado de Scolari foi a teimosia. A equipe não teve variações táticas, e todas as alterações feitas durante a Copa trocavam "seis por meia dúzia".
E o esquema, além de engessado, não era dos melhores. Uma das principais peças do elenco, o meia Oscar, por exemplo, pouco foi visto durante a maioria dos jogos.
A partida de que mais participou, em que ocupou um vazio deixado por Neymar, foi a decisão do terceiro lugar, em que o sumido da vez foi Willian.
E dificilmente essas variações seriam bem colocadas em prática, já que a seleção pouco treinou.
Enquanto a Alemanha teve apenas um dia livre durante toda a Copa, os brasileiros tinham folga após todas as partidas e em alguns momentos passavam tanto tempo estudando adversários quanto com o cabeleireiro ou nas redes sociais.
Um dos maiores erros da seleção foi a aposta em Fred. O atleta do Fluminense é um grande finalizador e é muito útil em termos de clube, principalmente no Campeonato Brasileiro, com um esquema feito para que ele espere a bola chegar e decida.
No entanto, o futebol atual em alto nível não permite a escalação de um centroavante fixo e pouco participativo.
E, independentemente do uso de um centroavante ou não, Fred não merecia a titularidade. Em forma, ele não fica devendo aos principais camisas 9 de hoje no mundo todo, mas quem o acompanhou depois da Copa das Confederações, em que foi artilheiro, sabe que ele estava bem abaixo do que foi há um ano.
É muito diferente apostar em foras de série, como Rivaldo e Ronaldo, que estavam em baixa em 2002 e arrebentaram durante o Mundial e em alguém que é apenas um bom jogador.
Muito badalada, a defesa brasileira teve seu pior desempenho em todos os tempos, com 14 gols sofridos.
Outrora celebrado por armar grandes sistemas defensivos, Felipão montou um time que deixava a dupla de zaga e principalmente o volante Luiz Gustavo sobrecarregados.
Para piorar, as atuações individuais dos defensores não foram das melhores em momentos importantes. Thiago Silva e David Luiz reagiram às adversidades de formas diferentes, mas ambas ruins.
O primeiro se abatia, e o segundo tentava resolver à sua maneira se lançando ao ataque.
O goleiro também não colaborou. Mais vazado da história da seleção em Copas, com 18 gols levados em duas edições da competição, Julio César não apareceu quando exigido.
O número de bolas na rede foi maior que o de defesas, já que ele bloqueou apenas pouco mais de 40% das bolas que foram em direção ao alvo.
Além de todos os problemas táticos e técnicos, outro fator que pesou contra os brasileiros foi o psicológico.
Acostumada a ter jogadores de personalidade forte e que crescem - ou ao menos não se encolhem - sob pressão, a seleção desta vez chorou.
Chorou de alívio após a disputa de pênaltis contra o Chile, nas oitavas, chorou de tristeza após o massacre alemão e chorou por não ter se reerguido na disputa de terceiro lugar, diante da Holanda.
Jogar em casa, que deveria ser uma vantagem, acabou se tornando uma pressão insustentável para um elenco jovem, em que 17 atletas estreavam em Copas.
A partida contra os chilenos, por sinal, retrata bem a estagnação do futebol nacional.
O sofrimento diante de um eterno freguês foi maior que o necessário.
O Chile evoluiu e teve uma equipe talentosa, mas não menos talentosa que a de 1998, que tinha Marcelo Salas e Ivan Zamorano no ataque e mesmo assim foi goleada por 4 a 1.
Há quem diga que o elenco também não era o ideal, mas dificilmente a experiência de Kaká e Robinho, a habilidade aliada à juventude de Lucas e Philippe Coutinho ou a solidez defensiva de Miranda mudariam o destino da equipe de Felipão.
Uma avaliação de Carlos Alberto Parreira sequer se faz necessária.
O técnico do tetra também precisa se reciclar caso queira continuar no futebol em um cargo técnico, mas sua parcela de culpa no fracasso de 2014 é quase mínima, já que poucas - ou nenhuma - de suas ideias foram aproveitadas por Scolari, que tem a última palavra e pensa diferente de seu coordenador técnico.
Para 2018, o Brasil, embora revele cada vez menos, ainda tem uma geração boa.
Mais da metade do elenco atual tem condições de estar na Rússia, onde a equipe terá que lidar com um peso de 16 anos em busca do hexa.
O principal para, mais que buscar o título, começar a reeguer o futebol do país é haver humildade por parte dos dirigentes da CBF.
Se não pretendem largar o osso, que pelo menos reconheçam que o futebol local está obsoleto e que a contratação de um técnico novo proporcionaria novos ares e ideias frescas.