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O valor dos supercarros que mal foram dirigidos

O mercado desafia a voz dos especialistas e o bom senso: os carros foram feitos para ser dirigidos, e os modelos velozes sofrerão com a inatividade

 (Nadia Shira Cohen/The New York Times)

(Nadia Shira Cohen/The New York Times)

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Daniel Salles

Publicado em 11 de janeiro de 2021 às 10h05.

Última atualização em 11 de janeiro de 2021 às 20h29.

Os supercarros mantêm melhor seu valor quanto menos você os usa, assim como os brinquedos infantis colecionáveis que valem mais quando estão fechados na embalagem original. Mas qual é a graça disso?

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À venda em Montreal por US$ 622 mil, um modelo Lamborghini Countach de 1990 parece novinho. Na verdade, ele é – o plástico ainda forra os bancos. Ao longo de 30 anos, percorreu apenas 133,6 quilômetros. Equipado com um V-12 de 455 cavalos, o carro quase nunca atingiu sua potência máxima.

Teve vários proprietários – nenhum dos quais o dirigiu muito – antes de ser devolvido à sua casa original, informou Bernard Durand, que trabalha com vendas na Lamborghini Montréal há 30 anos. "A esse preço, nunca será dirigido. É transportado para todos os lugares", disse.

Outro Countach do mesmo ano, mas com cerca de 17.700 quilômetros no hodômetro, custa US$ 335 mil na mesma concessionária. Embora os supercarros sejam feitos para ser dirigidos, e a altas velocidades, o mercado dá um valor significativo àqueles com quase nenhum quilômetro rodado.

Todas as Ferrari F40 são valiosas, mas um exemplar de 1991 com 2.744 quilômetros (da Coleção Ming de carros pouco dirigidos) arrecadou US$ 1.682.500 em 2019 em um leilão da RM Sotheby's em Monterey, na Califórnia. Seria interessante comparar esse valor com o de uma F40 de alta quilometragem, mas, como muitos colecionadores as compram principalmente como investimentos, elas são poucas.

Como a "Road & Track" observou em 2017: "Das 1.315 construídas, muitas F40 permanecem guardadas, com pouquíssimos quilômetros rodados."

O mercado desafia a voz dos especialistas e o bom senso: os carros foram feitos para ser dirigidos, e os modelos velozes sofrerão com a inatividade.

"Não vejo lógica de investimento em possuir carros que se deterioram parados e que se tornaram obsoletos com os modelos melhorados dos anos seguintes. Se você vai tratar seus supercarros como urnas gregas, por que não colecionar urnas gregas? Pelo menos elas não vazam óleo", afirmou Keith Martin, editor do "Sports Car Market", que acompanha as vendas de supercarros.

Muitos colecionadores concordam. "Deixar os carros parados é a pior coisa que você pode fazer. Os carros são como as pessoas – precisam ser exercitados. A gravidade tem seu preço. Se a bomba de óleo não o fizer circular, tudo escorre; por isso, quando você o ligar, pode avariar um rolamento ou coisa pior. E carros com eletrônica moderna podem se deteriorar rapidamente se a eletricidade não passar por eles. Não é como um Modelo T, que pode passar 50 anos parado e o motor pega logo de cara", explicou Jay Leno, cuja grande coleção na Califórnia inclui muitos supercarros.

Leno disse que gostava de manter – e dirigir – seus veículos. "Não me importo que meus bens sejam meus donos. Gosto disso."

James Glickenhaus, de Sleepy Hollow, no estado de Nova York, cineasta e produtor, também é um empresário que constrói supercarros para corridas e estradas sob a bandeira Scuderia Cameron Glickenhaus. Grande colecionador, possui várias Ferraris, bem como clássicos dos anos 30 da Stutz e da Duesenberg, e não gosta muito das rainhas da garagem.

"A ideia de preservar supercarros com baixa quilometragem é um fetiche bizarro que não tem nada a ver com carros e nada a ver com a realidade. Os carburadores acabam arruinados, o fluido de freio vira cimento, a borracha apodrece, os radiadores ficam entupidos, e o óleo se desfaz e libera corrosivos", afirmou Glickenhaus.

Ele destacou que os veículos não podem ser comparados à arte e à escultura, cujo maior propósito é ficarem paradas, sendo admiradas. "Quando os carros não são usados, não são mais carros", resumiu. Glickenhaus possui mais de 20 automóveis, e procura dirigir cada um pelo menos uma vez por mês.

Scott Sherwood, executivo no nordeste de Massachusetts, tem McLarens, Ferraris e um Maserati GranTurismo conversível em sua coleção. Ele se lembra de ter levado sua Ferrari F40 a um encontro na Inglaterra, e de ter visto como outro proprietário rebocou o veículo e o colocou em um tapete de grama artificial para a exibição, rebocando-o de volta para casa no fim. "A única coisa que ele fazia era polir. Se eu tivesse perguntado como era dirigi-lo, ele provavelmente não saberia", disse Sherwood, que usou o próprio F40 em várias viagens pela Europa.

"Alguns desses carros são de propriedade de pessoas que não sabem de fato dirigi-los. Portanto, talvez seja mais seguro mantê-los parados", concluiu ele.

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