“Tive misericórdia dele. Não vai acontecer de novo”, disse Chael Sonnen (Divulgação /UFC)
Da Redação
Publicado em 14 de junho de 2012 às 13h18.
São Paulo - Há uma fala em Predador, clássico do cinema anabolizado dos anos 1980, que simboliza a grande virada do filme. “Se ele pode sangrar, ele pode ser morto”, diz o major Dutch, personagem de Arnold Schwarzenegger, ao descobrir que o alienígena assassino do título foi ferido.
O campeão de vale-tudo Anderson Silva é uma espécie de predador. Até onde se sabe, é alienígena. Vence tudo desde 2006. Fez dez defesas do título dos médios contra os melhores da categoria – e atropelou todos. É considerado pelo presidente do Ultimate Fighting Championship, Dana White, o maior lutador da história desse esporte.
Mas há um major Dutch na vida de Anderson.
Um homem que descobriu que ele pode sangrar. Um homem que venceu cinco rounds de uma disputa pelo título e lhe aplicou não dezenas, mas centenas e centenas de socos na cabeça e nas costelas. Só perdeu porque o brasileiro, a um minuto do fim, encaixou um milagroso triângulo de perna em seu pescoço.
Esse homem é um sociólogo nascido e criado em West Linn, no estado rural do Oregon. Esse homem se chama Chael Sonnen e vai lutar novamente com o brasileiro no dia 7 de julho, em Las Vegas. “Eu tive misericórdia do Anderson”, disse Sonnen em entrevista. “Isso não vai acontecer de novo.”
“Ele mexe muito com o Anderson do ponto de vista estratégico e emocional. Coloca umas minhocas na cabeça dele”, diz Fellipe Awi, jornalista e autor de Filho Teu Não Foge à Luta, livro sobre a história do vale-tudo. Longe de ser brilhante, Sonnen já perdeu para outros três brasileiros nos ringues do UFC. Mas, como bem observou o narrador Mike Goldberg, “em só um daqueles rounds, Anderson apanhou mais do que em toda a sua carreira até ali”.
“O Anderson não tinha feito um bom período pré-treino e vinha de uma contusão”, diz Rodrigo Minotauro, ex-campeão dos pesos-pesados e treinador de Anderson. “E o Sonnen faz o antijogo em cima dele, vai para o chão e não deixa o outro lutar.” Foi no chão que Anderson mais apanhou. Por isso, Minotauro diz que seu pupilo quer finalizar o adversário ainda de pé. “Ele vai entrar com muita vontade e vai para o nocaute logo de cara”, conta.
Sonnen, por sua vez, disse que também já definiu sua estratégia: “Vou esperar até ele chutar, agarrar sua perna e colocá-lo de costas no chão. O mesmo de antes.” Na luta de 2010, o antidoping do americano apontou em seu sangue uma quantidade de testosterona quatro vezes acima do permitido. Após alguma polêmica, ele explicou que tem um problema de saúde e precisa fazer reposição hormonal. Para esta luta, o uso de testosterona injetável foi liberado – mas ele deverá respeitar certos limites.
Durante a coletiva de imprensa realizada no Rio de Janeiro, Anderson evitou falar muito. Estava chateado porque a luta não seria mais realizada no Brasil, devido a uma coincidência de datas com o evento Rio +20. Sonnen, ao contrário, deu show. Fingiu dormir enquanto Anderson falava, repetiu impropérios contra sua família e ameaçou tirar o cinturão das mãos do campeão. “A única coisa em que o Anderson é mestre é em não lutar”, disparou Sonnen.
“Ele entra lá, dança e faz coisas que eu nunca vi antes. Eu também faço coisas que ele nunca viu. Como andar em sua direção e acertar um soco em sua cara.” Desde os tempos de Muhammad Ali não se via um boquirroto desse calibre. Ele ganhou a antipatia de todo o Brasil ao dizer que nossas crianças brincam na lama, que a capoeira é uma dança break de cadeirantes e que nosso café da manhã é à base de cocaína. Uma página no facebook convidava voluntários para um evento chamado “Linchamento de Chael Sonnen”. “Não tenho nada contra o povo brasileiro”, remendou mais tarde. “As mulheres, então… as que quiserem, podem me ligar ou me visitar nos Estados Unidos.”
Sonnen revelou o que vai fazer caso vença: “Estou muito feliz por ser um herói do Brasil e ter um fã clube aí. Vou tirar férias com o Palmeiras depois de destruir Anderson e espero me encontrar com cada um dos meus fãs”. A menção ao Palmeiras é mais uma provocação, já que o brasileiro é atleta do Corinthians.
A verdade é que a tática de desestabilizar Anderson psicologicamente parece ter chances de funcionar. Chael admitiu que acha que a revanche só aconteceu porque provocou Anderson nas redes sociais e entrevistas, virando notícia no mundo do MMA. Minotauro garante que Anderson sequer se dá conta das provocações.
“Normal fazer bravatas para promover uma luta. Mas esse cara é um infeliz. Ele ultrapassou todos os limites”, diz o peso-pesado. Enquanto esperava sua chance de lutar contra Anderson novamente, Sonnen fez piadas em sua conta no Twitter que repercutiram na imprensa brasileira. “Vou colocar o Anderson de bruços mais rápido do que uma atriz pornô com uma hipoteca para pagar”, escreveu. Apesar da virulência, Sonnen admitiu que tudo não passa de um personagem e que acha que só conseguiu sua revanche porque fez as provocações na mídia.
A verdade é que, de alguma forma, Anderson vem sendo afetado pela chacota. Abandonou a atitude de lutador “calmo” para dizer que o combate será “sinistro”. O consenso entre os especialistas é que Anderson não perderá. “Mas, em se tratando de atletas de altíssimo nível como Sonnen e Anderson, tudo pode acontecer”, diz Marcelo Alonso, editor do Portal do Vale-Tudo. “Anderson não toma porrada há muito tempo”, disse Dana White em fevereiro.
“Você é o rei do mundo, mas um dia está meio segundo mais lento do que antes.” As últimas lutas do brasileiro, que tem 37 anos, ou foram muito fáceis ou acabaram logo, como o nocaute em Vitor Belfort. Anderson parece pronto para trucidar o americano no primeiro round. Ele sabe como fazer isso. Mas também sabe que vai reviver o dia em que quase foi humilhado por um fanfarrão.