Gabigol em jogo do Flamengo (Henry Romero/Reuters)
Da Redação
Publicado em 22 de março de 2021 às 10h36.
Desde o início da pandemia, o comportamento de alguns jogadores escancarou o descaso com o isolamento social e o desrespeito às normas sanitárias exigidas pelos profissionais da área da saúde. Apesar do número de contaminados e mortos continuar elevado no Brasil, com o país chegando a registrar 2.798 mortes em 24 horas, esse fator não parece suficiente para alertar sobre os possíveis riscos de contaminação.
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Nos últimos dias, houve mais casos de atletas que foram vistos em aglomerações. Gabigol, atacante do Flamengo e um dos jogadores mais badalados do futebol brasileiro, foi flagrado com mais de 200 pessoas em um cassino ilegal, em São Paulo. Depois de ser detido pela polícia, na madrugada do último domingo (14), o atleta teve de responder por crime contra a saúde pública.
Além do jogador rubronegro, Jô e Otero, atletas do Corinthians, estiveram em um resort com a família, em Mogi das Cruzes, e compartilharam fotos e vídeos nas redes sociais sem máscara. Embora o governador João Dória tenha decretado Fase Vermelha, com apenas serviços essenciais funcionando, em todo o Estado, desde o dia 6 de março, outros episódios de atletas desrespeitando o isolamento social persistiram.
Apesar de serem atos feitos por jogadores, em horários de folga e lazer, a repercussão ganha maior exposição e inclui os times na repercussão negativa. Para Rene Salviano, ex-diretor comercial, marketing e novos negócios do Cruzeiro, e há 20 com experiência no marketing esportivo, as instituições, assim como as marcas patrocinadoras, querem estar sempre ligadas à notícias positivas. “Essas situações devem alertar ainda mais sobre o poder de formação que as entidades têm sobre todos os cidadãos. As instituições devem sempre orientar e usar toda a sua força midiática para ajudar a construir um mundo melhor”, analisou o especialista.
Depois do episódio que envolveu o Gabigol ter pautado o noticiário esportivo, a opinião pública e a imprensa esperaram por um posicionamento do Flamengo sobre o caso, que não ocorreu. Salviano entende que a mensagem para esse tipo de situação deve estar presente no dia a dia da instituição. “Isso deve fazer parte da estratégia, visão e valores do clube. Não pode ser apenas uma ação de marketing criada pelo momento vivido. Se está inserido dentro da estratégia este modelo de ser um propagador de apoio a um mundo melhor fica mais fácil demonstrar para o público externo e as ações ficam sempre verdadeiras”, completa.
Marcelo Segurado, diretor executivo de futebol, com passagens por Goiás e Ceará, segue uma linha de raciocínio semelhante. Para ele, a responsabilidade de conscientizar os jogadores deve partir dos clubes. “A melhor maneira de lidar com isso é através da educação. De mostrar para esses jogadores que, mesmo sendo atletas, não são imunes ao vírus. Eles precisam tomar as medidas que são determinadas pela ciência, pelo departamento médico e pela direção do clube. Isso tem que ser encampado dentro das instituições”, disse o dirigente.
É inegável o poder de atletas, principalmente jogadores de futebol, para alcançar milhares de pessoas. Não à toa, todo o cuidado para cuidar da imagem desses profissionais ainda é pouco. Um mau exemplo de conduta, como desrespeitar o isolamento social, em meio a pandemia, pode trazer sérias consequências.
Marcelo Segurado entende que os atletas têm grande responsabilidade no quesito de dar bons exemplos e explica o motivo. “O jogador de futebol passa uma imagem de ídolo, principalmente para as crianças. Existem o bônus e o ônus da profissão. Se você quer manter sua vida como qualquer adolescente, então é melhor desenvolver outra função que não venha a ser uma de exposição como é a de um jogador de futebol”.
O dirigente ainda acrescenta que, em alguns casos, a punição vinda do clube ao atleta é uma medida justa. “Se a instituição faz todas as campanhas, um papel de conscientização e, mesmo assim esse jogador expõe, eu sou a favor sim da punição. O jogador não expõe só ele quando faz isso. Ele coloca em risco seus familiares, companheiros de trabalho e toda uma sociedade. Uma cadeia de pessoas”, explicou.
Embora o jogador seja responsável por seu comportamento no extracampo, qual impacto os clubes podem sofrer quando algo negativo repercute envolvendo os atletas vinculados à instituição? Para Marcelo Palaia, especialista em marketing esportivo, o comportamento dos atletas fora do campo não é o suficiente para desgastar a imagem dos clubes.
“Os jogadores são profissionais e precisam se portar sempre de forma positiva perante aos seus contratantes. Nesse caso, a imagem só fica desgastada se o clube não cumprir com os protocolos”. Palaia ainda acrescenta, “O clube não consegue, e nem deve, fiscalizar a vida de cada atleta no extracampo. Eles são 100% responsáveis pelas suas ações. Os atletas também são remunerados para não prejudicar a imagem do clube”, finalizou.
Em meio a tudo isso, ainda existe uma questão importante: se os atletas podem sofrer punições por violação dos protocolos de saúde, acontece na NBA. Lá foram estabelecidas algumas regras, como elenco e estafe estarem proibidos de frequentar bares, de estarem em eventos esportivos e entretenimento ao vivo, usar áreas de lazer como piscina ou academia, e até participar de encontros sociais com mais de 15 pessoas juntas. As punições variam de descontos em salários até eventuais suspensões.
Para o advogado especialista em direito desportivo, Eduardo Carlezzo, existe uma diferença fundamental entre os acordos feitos entre as ligas norte-americanas e o Brasil, que seriam um impeditivo para tais punições por aqui.
“Nos Estados Unidos existem acordos coletivos entre as ligas e os sindicatos dos atletas, e essas regras acabam tendo força similar de lei. No Brasil não temos nada parecido com isso. As relações de trabalho são pactuadas em contratos individuais, diretamente entre jogadores e clubes. Aqui, por mais que as federações e confederações tentem estabelecer normas quanto ao comportamento dos atletas no combate à pandemia, elas terão um alcance legal limitado, diferentemente do que ocorre na NBA, por exemplo”, esclarece.