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Estudo analisa o legado do encenador Renato Cohen

Performer ampliou o campo de difusão do trabalho ao reelaborar e avançar nos procedimentos de composição artística


	Dar forma aos fatos do tempo no próprio corpo do artista, ativado por alguma motivação interior ou externa, está entre as prerrogativas da performance
 (Getty Images)

Dar forma aos fatos do tempo no próprio corpo do artista, ativado por alguma motivação interior ou externa, está entre as prerrogativas da performance (Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 19 de novembro de 2012 às 08h57.

São Paulo - Para pensar as diferentes possibilidades e procedimentos de um trabalho performático, prática artística ancorada no corpo e com livre trânsito entre as diferentes formas expressivas, Ana Goldenstein Carvalhaes voltou suas atenções ao legado do artista Renato Cohen (1956-2003), performer e encenador gaúcho radicado em São Paulo que lecionou na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

A dissertação de mestrado de Carvalhaes, orientada pela professora, escritora e curadora Kátia Canton, resultou no livro Persona Performática – Alteridade e Experiência na Obra de Renato Cohen, publicado com apoio da Fapesp.

Das muitas contribuições relevantes deixadas por Cohen, segundo Carvalhaes, destaca-se o “work in progress”, ou seja, a incorporação poética – capaz de propor diferentes possibilidades de leitura – dos eventos que surgem “durante a elaboração da performance, na própria emergência do tempo”, fazendo da transitoriedade entre diferentes estados emocionais e expressivos uma de suas marcas autorais mais representativas, ponto fecundante do próprio trabalho.

“Algo importante que ficou é a ideia de arte em processo, da pesquisa em andamento, aberta a constante experimentação”, disse Carvalhaes, que foi aluna de Cohen.

Segundo ela, é graças a essa prática permeável e receptiva aos acontecimentos que o performer pode usufruir da mistura não linear característica das diferentes falas agenciadas pela sua voz na elaboração da obra.

“A forma polifônica está presente na construção do texto das performances de Cohen, que tem origens diversas ao longo do processo, incidindo, inclusive, na linguagem e também na ideologia do processo”, disse Carvalhaes.


Dar forma aos fatos do tempo no próprio corpo do artista, ativado por alguma motivação interior ou externa, está entre as prerrogativas da performance.

No Brasil, é referência, por exemplo, a caminhada performática do arquiteto, pintor e desenhista Flávio de Carvalho (1899-1973) pelas ruas do centro da cidade de São Paulo em 1956, vestindo um saiote e uma blusa de mangas curtas bufantes. A performance, que recebeu o nome de “Experiência nº 3”, consistiu na confecção da roupa e na própria ação, devidamente documentada.

Para Carvalhaes, a performance se configura ao longo do tempo como uma prática artística que assume diferentes reformulações. Sua marca é, além da experimentação, a efemeridade e a incorporação das marcas do transitório.

“A performance é pesquisa. Cada artista precisa de uma forma diferente, de uma arte diferente. A performance tem trânsito livre, define-se a cada situação”, disse. O resultado é um trabalho híbrido e transdisciplinar, articulado por diferentes proposições e referências.

Novas mídias

Em prol do adensamento da vivência que o performer trazia à cena em seu trabalho, Cohen lançava mão de diferentes dispositivos capazes de acionar o trânsito que a formulação da obra requeria durante os ensaios.

“Ele ia para a body-art, passava por Guto Lacaz, Bauhaus, punk, John Cage, Oiticica... Cohen colocava em dinâmica esses conceitos, que eram usados conforme a experiência ia pedindo”, disse Carvalhaes.


No livro, são analisadas duas obras de Cohen: a exposição Imanências: Caixas do Ser, de outubro de 1999 na Casa das Rosas, em São Paulo, e Gotham SP, espetáculo teatral de 2001, realizado pela Cia Teatral Ueinzz – companhia formada por não atores.

Em Imanências, oito artistas passaram oito dias instalados em salas visíveis ao público. Assistidos por câmeras, as imagens ficavam disponíveis 24 horas por dia na internet.

Tal situação, segundo Carvalhaes, “propôs uma situação-limite entre internalização e introspecção do artista. Ao mesmo tempo, as novas mídias permitiam o movimento contrário, de exposição e expansão. Cohen entendia isso como extensões do corpo-mente através do suporte digital”.

De acordo com Lúcio Agra, performer e prefaciador do livro de Carvalhaes, Cohen foi um dos precursores da discussão a respeito dos usos e empregos da rede mundial virtual pela performance.

“Seus últimos textos ajudaram a consolidar a ideia de performance telemática, da teleperformance, contra o juízo-clichê que sempre insiste no acontecimento ‘ao vivo’, como se ali também não existisse uma mediação”, ressaltou.

A hibridez, a articulação entre diferentes referências e níveis de atenção difundidos pela sintaxe da web são também lembradas como parte do arranjo expressivo de Cohen.

“Ele tinha um pendor hipertextual. Era um incrível articulador de inúmeras ‘janelas’. Não havia computador, na sua época, que desse conta da velocidade de seu pensamento”, disse Agra.

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