Cena do Filme o Filho do Outro da diretora Lorraine Levy: filme estreia em São Paulo (Reprodução)
Da Redação
Publicado em 3 de janeiro de 2013 às 12h47.
São Paulo - Abordando um tema muito visado - a eterna tensão entre judeus e palestinos -, o drama franco-israelense "O Filho do Outro", de Lorraine Levy, consegue acrescentar novas camadas ao modo de olhar a questão. O filme estreia em São Paulo.
Ao completar 18 anos, Joseph Silberg (Jules Sitruk) alista-se no serviço militar em Israel. Longe de estar apenas cumprindo uma obrigação, seu engajamento neste futuro imediato ajusta-se perfeitamente na sequência da tradição familiar: seu pai, Alon (Pascal Elbé), é um respeitado coronel.
Os exames médicos de rotina, que incluem um teste sanguíneo, trazem uma novidade inquietante: Joseph não pode ser filho biológico do casal formado por Alon e a médica Orith (Emmanuele Devos). Uma investigação aponta para uma troca de bebês, ocorrida há 18 anos, em Haifa, numa noite em que bombardeios forçaram a retirada dos recém-nascidos de junto de suas mães.
O verdadeiro Joseph cresceu na Palestina, como o muçulmano Yacine Al Bezaaz (Mehdin Dehbi), criado pelo mecânico de automóveis Saïd (Khalifa Natour) e sua mulher Leila (Areen Omari). E, dezoito anos depois do erro do hospital, não é possível simplesmente uma troca de endereço. Toda uma identidade foi construída para os dois rapazes e eles não querem abrir mão dela.
Funciona muito bem no filme a tensão provocada pela descoberta na vida de Joseph e Yacine - cujo irmão, Bilal (Mahmud Shalaby), militante da causa palestina, simplesmente rejeita ter ao seu lado um "traidor". O pai, Saïd, simplesmente prefere ignorar o engano - seu filho é aquele que criou e ponto final. Do outro lado, Alon está confuso - não sabe mais como olhar para Joseph. As duas mulheres mostram-se mais dispostas a encarar suas dores e encaminhar uma forma de convivência.
Os encontros sucessivos entre as duas famílias, cada vez de um lado da explosiva fronteira entre Israel e a Cisjordânia, esboça os pontos de conflito entre os dois povos, as duas culturas, com as respectivas mágoas e cobranças. É um diálogo difícil, quase tanto quanto os que acontecem nas mesas de negociação entre os dois governos.
Colocando em evidência a questão intimista dos rapazes, que começam a conviver por conta própria, o filme escapa do risco de tornar-se panfletário ou discursivo. A história nunca abandona o enfoque humano, a opção individual de cada um. Já que cada um deles é, ao mesmo tempo e independente de sua vontade, judeu e palestino, trata-se de encontrar um modo de equilibrar essa ambivalência e estabelecer a própria identidade.
A cena em que Joseph decide visitar a família biológica palestina, compartilhando sua mesa ao jantar e cantando com eles é um desses momentos em que se sente como uma situação insustentável pode escapar de um impasse. Outro momento delicado é quando Orith finalmente abraça Yacine, depois de uma intensa troca de olhares por parte dele, igualmente encontrando vazão para um afeto represado. Dessa maneira, com estes achados do roteiro, o filme caminha para fazer pensar sobre sua história, sem pretender oferecer um modelo que sirva à política - ou talvez sim. Mesmo sem querer simplificar demais um conflito tão enraizado e antigo, encontrar a paz começa justamente por ser capaz de colocar-se na pele daquele que se considera inimigo.