LETREIROS ELETRÔNICOS EM NOVA YORK: máquinas lidam bem com uma quantidade grande de informações, mas e o ser humano? / Mario Tama/ Getty Images (Mario Tama/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 9 de setembro de 2017 às 07h51.
Última atualização em 9 de setembro de 2017 às 11h09.
Obrigado Pelo Atraso
Autor: Thomas L. Friedman
Selo: Objetiva
Páginas: 560
Preço: R$ 69,90
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Brian Krzanich é conhecido pela sabedoria com que observa o mundo da tecnologia e suas tendências. Nada mais apropriado para o CEO da Intel, a maior fabricante e desenvolvedora de microprocessadores e circuitos integrados do mundo. Sempre muito entusiasta dos grandes avanços tecnológicos, Krzanich, em recente palestra, pareceu, no entanto, um pouco assustado com a realidade: “Não é preciso ser muito velho para constatar que o ritmo de vida mudou completamente nos últimos anos. Tudo está acelerado demais”, disse ele, de forma discreta, sem dar muita ênfase, mas mostrando preocupação.
E deu um exemplo: o recém lançado processador Intel Core de sexta geração é 3.500 vezes mais eficiente, 90.000 vezes mais econômico em termos de uso de energia e 60.000 vezes mais barato do que o 4004, da primeira geração de microchip, lançado pela Intel em 1971″. Se a mesma evolução acontecesse com os carros, continuou ele, um fusquinha seria capaz de correr a 480.000 quilômetros por hora, rodar mais de 3 milhões de quilômetros com um galão de gasolina e custar apenas quatro centavos de dólar.
Outro grande guru da tecnologia contemporânea, Eric Teller, também conhecido como Mr. Astro, diretor do laboratório Google X, cita, em suas memoráveis apresentações nos vídeos da TED, essa crescente velocidade com que estamos operando a realidade. Mr. Astro não é de perder a graça com as grandes conquistas tecnológicas, mas deixa escapar um fio de perplexidade com o ritmo da vida atual. As grandes invenções do século XX, como o carro e o avião, diz ele, demoraram décadas para serem incorporadas totalmente à nossa realidade. Hoje, esse prazo é de cinco a sete anos. Em outras palavras, se uma novidade tecnológica foi testada e implantada, como o automóvel sem motorista por exemplo, você tem não mais do que sete anos para aprender a conviver, tolerar e usar essa novidade — para não se sentir excluído. E esse prazo tende a diminuir cada vez mais.
Mas a questão da velocidade não se restringe ao curto tempo deste processo de adaptação. Estamos invadindo o desconhecido e obscuro universo dos microssegundos. A varejista Walmart, por exemplo, ” descobriu em seu e-commerce que o consumidor é capaz de distinguir uma diferença de milissegundos quando aciona o botão “comprar” ou “enviar” ou ainda “buscar”. A pesquisa da Walmart concluiu que o consumidor espera uma resposta em dez milissegundos e de que cada meio segundo acrescentado ao tempo de resposta é capaz de provocar perdas de dois ou mais pontos percentuais nas vendas — o que para os padrões comerciais da empresa podem significar milhões de dólares por dia.
Perplexo mesmo está o jornalista Thomas Friedman, autor do livro “Obrigado pelo atraso”. O agradecimento do título se refere ao benefício que ele usufrui quando alguém atrasa para uma reunião e ele pode, por alguns minutos, dedicar-se à simples reflexão sobre a vida, aos negócios ou aos netos. Sente-se espremido pela quantidade de informações, novidades, ideias e fatos que se sucedem em grande velocidade à sua volta. Ironicamente, escreveu um livro sobre o assunto com quase 600 páginas, o que certamente confronta-se com a tendência de velocidade com que operamos nossa vida diária.
Friedman, no entanto, é jornalista experiente, editorialista do New York Times, com muitas reflexões e histórias para contar e, no livro, elabora uma metáfora interessante sobre a enorme transformação que ocorreu na última década e ainda está ocorrendo: criamos uma “supernova”, estrela que concentra uma grande quantidade de energia prestes a explodir. A imagem se refere à capacidade de processamento vertiginosamente crescente à qual estamos submetidos, o que impõe uma necessidade de adaptação constante às novidades, à tecnologia e ao ambiente em transformação.
De fato, o estudo “Digital Flows” conduzido pela consultoria McKinsey revela que desde 2005 o fluxo de informações digitais de comércio, buscas, vídeos, comunicações e tráfego intercompanhias aumentou 45 vezes e nos próximos cinco anos esse fluxo será multiplicado por nove. Esse aumento é possível graças à maior capacidade de processamento em menor tempo. Máquinas podem fazer isso, mas e o ser humano?
É preciso adotar um equilíbrio dinâmico, em que a velocidade é ao mesmo tempo causa e efeito de uma trajetória estável, como acontece quando se anda de bicicleta. Ou, pelo menos, é nisso que Friedman acredita. “Não podemos mais ficar parados, estamos em constante movimento, embora esse não seja o nosso estado natural”, escreve ele se referindo às “três maiores forças do planeta — a tecnologia, a globalização e a mudança climática — todas acelerando ao mesmo tempo”.
Friedman resgata a lei de Moore para explicar essa aceleração constante da capacidade de processamento e da velocidade resultante.Não é uma lei atual — foi elaborada em meados de 1965 baseada numa espécie de profecia, pelo menos para aquela época, em que se projetava um aumento de 100% do número de transistores dos chips a cada 18 meses. No livro, Friedman aproveita a ideia da Lei de Moore para projetar o crescimento exponencial que vem caracterizando o desenvolvimento tecnológica dos sensores, da conectividade e da capacidade de armazenamento.
Esses são os motores do aceleração. “A velocidade da rede terrestre e submarina de cabos de fibra ótica e de sistemas wireless, que são a espinha dorsal da internet, assim como da telefonia móvel, já atinge pouco mais que a metade de velocidade da luz . As companhias estão agora experimentando novas maneiras para aumentar a capacidade de transmissão para mais de 100 trilhões de bits por segundo ao longo das suas linhas de fibra. Em algum momento, acabaremos nos chocando contra as leis da física”, escreve Friedman.
O futurista e cofundador da Singularity University Ray Kurzweil aparece no livro com uma declaração importante: “estamos entrando em uma era de aceleração. Os modelos sobre os quais a sociedade está baseada em todos os níveis, apoiados em grande parte em um modelo linear de mudança, terão de ser redefinidos. Devido à força explosiva do crescimento exponencial, o século XXI será o equivalente a 20.000 anos de progresso concretizados ao ritmo do progresso atual; as organizações precisam ser capazes de se redefinir a uma velocidade cada vez maior”.
Mas daí vem a pergunta: para que serve tudo isso? Ao mesmo tempo em que se louvam esse desenvolvimento tecnológico, as mesmas vozes, ainda que com palavras e abordagens diferentes, questionam o resultado prático dessa tecnologia. Afinal, nesses últimos dez anos as condições de vida de maneira geral não obtiveram resultados positivos importantes em nenhum aspecto — econômico, ambiental, político ou social. Uma dessas vozes é o próprio Friedman,que procura ensaiar uma explicação com sentido otimista: a tecnologia ainda não produziu resultados positivos na qualidade de vida da humanidade como um todo por se tratar de uma fase de transição e adaptação que deverá durar ainda mais uma década. Dias melhores virão!
Mas nem todo mundo acredita nisso ou quer esperar. É o caso de Carl Honoré, uma das celebridades do “movimento pela lerdeza” que advoga uma mudança radical no ritmo de vida. Honoré é um jornalista nascido na Escócia e que cresceu no Canadá (e morou seis meses no Brasil, mas isso é só uma coincidência) autor do livro “Devagar” que chegou a fazer sucesso e deu combustível para que o movimento se espalhasse e invadisse as mais diferentes áreas da atividade humana, como a Slow Food, que prega uma nova gastronomia e a Cittaslow, que defende um novo estilo de se viver nas cidades.
A crescente velocidade do planeta cria, também, manifestações antagônicas, capazes de suscitar questionamentos que parecem estar ligados a uma espécie de sentimento coletivo nostálgico que valoriza os tempos que já se foram. Você decide!