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É uma subversão se falar de amor hoje, diz Marcelo D2

Em entrevista, o rapper de 51 anos falou sobre sua turnê, sua forte atuação política no Twitter e os planos para seu próximo disco

Marcelo D2 (Theo Wargo/Getty Images)

Marcelo D2 (Theo Wargo/Getty Images)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 29 de março de 2019 às 14h35.

Última atualização em 29 de março de 2019 às 14h40.

Quando se deu conta que faria o 10º disco de estúdio da carreira, Marcelo D2 queria algo inédito em sua trajetória. "A procura vale mais do que a batida", diz, como um mantra, o cantor, compositor e rapper, em entrevista ao Estado, num hotel em São Paulo, numa referência a seu emblemático álbum À Procura da Batida Perfeita, de 2003. Criou, então, o projeto audiovisual Amar É Para os Fortes, que une disco e filme. D2 compôs as canções e também escreveu, dirigiu e roteirizou o filme, estrelado pelo filho Stephan Peixoto.

O disco/filme foi lançado em 2018 e, em janeiro deste ano, D2 iniciou a turnê no Rio. No dia 14 de março, apresentou-se em Porto Alegre e, nesta sexta, 29, ele chega a São Paulo, na Áudio. O repertório cria uma narrativa com as novas canções e músicas da carreira solo e de seu grupo, o Planet Hemp. Ao fundo, surgem cenas "desconstruídas" do filme. Aos 51 anos, D2 fala sobre o show, sua forte atuação no Twitter - e diz planejar um disco de samba.

Como foi transpor para o palco Amar É Para Os Fortes, que é um projeto audiovisual?

Está sendo outro desafio. Tem uma frase que usei um tempo atrás que 'a procura vale mais do que a batida perfeita'. Acho que estou fazendo isso. Neste momento, estou tentando achar algo novo para mim. Esse projeto foi tão de vanguarda, tão inovador para mim como artista, é uma ambição artística fazer alguma coisa diferente. Estou levando esse conceito, essa vontade para o palco também. São dez anos de Planet Hemp, 15 de carreira solo. Na verdade, faço isso quase que na minha vida inteira. O show no Morro da Urca (no Rio) foi incrível, depois foi em Porto Alegre, no dia em que completou 1 ano do assassinato da Marielle (Franco), tinha uma mulherada cheia de poder, força, com placas. Esse show tem um teor emotivo grande. É um pouco autobiográfica a história do Amar É Para os Fortes. Tem meu filho (Stephan) fazendo, e num momento tão difícil. Parece que quem está indo para o show está procurando um pouco de voz, pedindo 'me ajuda', 'vamos nos ajudar'.

O 'amar' do título é simbólico nos dias de hoje, não?

É quase subversivo (risos). É uma subversão se falar de amor hoje. A gente pode falar em números em economia, mas pode falar em números de likes e views. Enquanto as pessoas estão preocupadas em views e likes, estão esquecendo de amar. Tem um grande amigo que fala desde que eu era mais novo que eu tinha de falar de amor. E eu: 'Imagina, tenho energia para porrada, não para amor'. E ele: 'Cara, você tem que falar de amor'. Esse amor que está em Amar É Para os Fortes, que demorei para entender, é amor à profissão, ao próximo, ao fato de estarmos aqui na Terra, isso é importante.

Você vai trazer o elenco do filme para o show em São Paulo?

Eles não vão estar no palco, meu filho vai, mas vai estar como meu filho cantando. Me sinto até desconfortável de falar que esse disco é meu, é um projeto de todo mundo. A força deles foi importante para o filme. Há um ano, quando a Marielle foi assassinada, a gente estava filmando (esse projeto) com uma equipe formada por 70% de mulheres. A equipe estava destroçada, a gente estava filmando um tiroteio. Tentei adiar a diária, mas não tinha como. A gente fez então um pacto: temos de honrar isso aqui, temos de fazer bem feito. Foi difícil esse dia, mas foi bonito. Além de ser meu filho, Stephan era meu ator, eu era o diretor, ele estava superembaixo da minha asa. Nesse dia, eu estava destroçado, abalado e aí foi a vez dele: 'Olha que projeto', 'obrigado por ser meu pai, por fazer tudo isso pra gente'. Ele me deixou cada vez mais emocionado - estou emocionado de falar isso de novo. Ele sentiu que era o momento de ele me dar apoio.

Você conhecia a Marielle?

Eu não a conhecia pessoalmente, mas ela era super-representativa, amigaça do (Marcelo) Yuka, que era meu irmão. Ele sempre falava dela com carinho, é como se fosse uma prima minha. Conheço 250 mil Marielles onde eu nasci, mulheres fortes, que talvez não tiveram a voz que ela teve. Meus pais se separavam, fui criado por minha mãe, minhas tias, uma casa cheia de mulheres iguais a ela, fortes.

Você é superativo no Twitter. Sempre usou?

Eu tinha parado de usar redes sociais, estava de saco cheio, mas, na época da eleição, voltei e, cara, de uma certa maneira, faço arte de combate, de confronto. Virou uma ferramenta forte. Lancei o disco há 5 meses, quase larguei o disco de lado para atuar politicamente no Twitter. Depois conversei com o (Fernando) Haddad, ele agradeceu o apoio, mas minha posição de eu estar do lado dele era muito mais contra o (Jair) Bolsonaro do que vamos eleger o Haddad. Tem dois pontos fortes nisso: ouço tanto 'seu disco está f...' quanto 'obrigado...'. Tem muita mulher falando isso. Por conta do rap, meu público sempre foi muito masculino. As mulheres chegaram para mim e falaram: 'Obrigada por sua posição, é muito importante'. Me senti muito bem como cidadão de poder fazer isso, ir no Twitter e ter voz.

Você foi ameaçado? A ponto de tomar alguma providência?

Uma coisa é o desejo, outra coisa é a ameaça. Falar no Twitter 'tomara que você morra', isso é um desejo do cara, não chega a ser uma ameaça. Apesar de que tem de ter um cuidado também. Tanta gente desejando mal dos meus filhos, fiquei muito preocupado com eles. Outra coisa é ameaça mesmo. Recebi dois telefonemas me ameaçando diretamente. Quando eu estava indo para Porto Alegre, quem me ligou disse: 'Você vai vir na minha cidade, você vai ver o que vai acontecer contigo'. Falei com o advogado, ele disse para eu andar com segurança, me proteger. Sou um cara da rua, gosto de ir nos bares, de estar na rua, conversar com taxista, viver minha vida. Sempre alerta: isso eu sempre estive. Cresci na rua, cresci na Lapa nos anos 90.

E nunca pensou em sair do País?

Não por conta disso, eu adoraria morar fora do País, mas por outra razão, não para fugir, vou odiar se isso tiver de acontecer. Isso não passa pela minha cabeça: sair do País porque não é mais seguro para mim. Fico pensando que tipo de patriotismo é esse: que fala mal do povo quando está nos EUA, que quer comemorar uma ditadura que torturou e massacrou tanta gente.

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As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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