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Conheça Roya Sadat, a cineasta que dá voz às mulheres no Afeganistão

Apesar da presença do Talibã, a diretora afegã Roya Sadat ficou conhecida pelo curta-metragem "Three Dots" que abordava os casamentos forçados

Cinema: Roya Sadat criou o primeiro festival de cinema feminino do Afeganistão em 2013 (afp/AFP)

Cinema: Roya Sadat criou o primeiro festival de cinema feminino do Afeganistão em 2013 (afp/AFP)

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AFP

Publicado em 5 de março de 2020 às 11h02.

A afegã Roya Sadat viveu sua primeira filmagem com medo de um ataque dos talibãs, inimigos do cinema e das mulheres ativas. Dezoito anos depois, enquanto os talibãs negociam sua volta ao poder, a corajosa cineasta segue defendendo suas compatriotas, filme após filme.

"Envolvia os filmes de plástico, porque pensava que se eles se metessem conosco, eu os jogaria no deserto", lembra a cineasta que usa véu negro na cabeça. "Queria salvar os filmes", diz.

No poder entre 1996 e 2001, os talibãs acabavam de ser expulsos por uma coalizão internacional liderada pelos Estados Unidos que invadiu o Afeganistão após os atentados de 11 de setembro de 2001. Eles, os mesmos que durante cinco anos jogaram televisores nas ruas e enclausuraram as mulheres, estavam a poucos quilômetros do local de filmagem, em sua província natal Herat, no oeste do país.

"Caminhava pelos campos para comprovar que não estavam minados", lembra Roya, uma das poucas cineastas do Afeganistão, um país classificado com frequência como o pior do mundo para mulheres.

Após tantos riscos, "Three Dots" (Três Pontos), um curta-metragem que abordava os casamentos forçados, frequentes no Afeganistão, foi premiado em muitos festivais internacionais. E sua carreira deslanchou.

Roya fundou uma produtora com sua irmã, a Roya Film House, cujos filmes, sempre centrados na dolorosa vida cotidiana das mulheres afegãs, ganharam vários prêmios internacionais.

Uma mulher corajosa

Em 2013, ela criou o primeiro festival de cinema feminino do Afeganistão. Cinco anos depois, recebeu o Prêmio Internacional às Mulheres de Coragem, entregue pela primeira-dama dos Estados Unidos, Melania Trump.

Várias vezes ameaçada de morte pelos mais conservadores, Roya Sadat "se nega a ficar calada", escreveu o Departamento de Estado dos EUA.

"Examinando a cultura afegã através do cinema, Sadat desempenha seu papel para transformar seu país em um lugar melhor para as mulheres e as meninas", completou.

A recompensa chegou com o lançamento do longa-metragem "A Letter to the President" (Uma Carta para o Presidente), que conta a história de uma mulher presa por ter matado, por acidente, seu marido violento. Um novo tabu afegão abordado pela diretora.

"Tinha medo de reações ruins", disse em entrevista à AFP. Mas se sentiu aliviada quando, durante uma projeção do filme em Cabul, o público aplaudiu a heroína após ter dado um tapa em seu marido depois de apanhar.

Abordando os direitos das mulheres em seus filmes e documentários, Roya Sadat quer reparar os danos de 40 anos de guerra na sociedade e cultura afegãs.

"Talvez seja fácil reconstruir um prédio destruído pela guerra, mas não é (fácil) mudar a mentalidade das pessoas", afirmou, insistindo em que "a única forma de fazer isso é pela cultura, pelos meios de comunicação e, principalmente, pelo cinema".

Os filmes de Roya Sadat, "centrados em mulheres e destinados ao público feminino, têm impacto direto nas mulheres na sociedade", comenta Latif Ahmadi, cineasta e ex-diretor do Instituto de Cinema Afegão.

Centro cultural clandestino

Roya nasceu em 1981 e viveu 38 dos últimos 40 anos da guerra que devastou o país. Sua família teve de se esconder durante a década de ocupação soviética, entre 1979 e 1989.

Começou a escrever na escola primária: poemas, contos, peças de teatro. Ainda era estudante quanto fez um programa de televisão com as amigas de classe, o primeiro criado por mulheres em Herat, a capital do oeste do Afeganistão.

No meio disso tudo, os talibãs tomaram o poder. E as escolas de meninas fecharam. As mulheres viviam confinadas em casa. Roya era autorizada a trabalhar como enfermeira, porque eram necessárias mulheres para atender a outras mulheres.

No hospital, criou um centro cultural clandestino em que organizou apresentações de uma de suas obras teatrais. "Comparávamos os tempos dos talibãs com a era pré-islâmica, quando as meninas eram enterradas vivas", contou.

O chefe do hospital era talibã. "Era muito perigoso", lembra. "Mas ainda é difícil de acreditar que tenhamos conseguido atuar".

Hoje em dia, a cineasta comemora duas décadas de sucesso nos direitos das mulheres, graças à presença das tropas ocidentais.

Os resultados são impressionantes nas grandes cidades, onde agora as mulheres são visíveis e ativas. Em torno de 39% das meninas frequentam o Ensino Médio, segundo o Banco Mundial. Há 20 anos, eram poucas.

Tudo pode ser posto a perder, se os insurgentes voltarem ao poder após a retirada das forças americanas, a qual Washington negociado com eles há mais de um ano.

Roya Sadat suspira: "Temo que eles simplesmente nos esqueçam como durante os cinco anos de governo dos talibãs".

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