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Confinado, muralista Kobra repensa processo criativo com ações solidárias

Artista está sorteando uma série de serigrafias numeradas para quem doar alimentos e produtos para a população mais vulnerável de São Paulo

Kobra: "Coexistência", sua obra mais recente, mostra cinco crianças em oração, que representam cinco religiões: cristianismo, budismo, judaísmo, islã e hinduísmo (Paulo Fridman/Corbis/Getty Images)

Kobra: "Coexistência", sua obra mais recente, mostra cinco crianças em oração, que representam cinco religiões: cristianismo, budismo, judaísmo, islã e hinduísmo (Paulo Fridman/Corbis/Getty Images)

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AFP

Publicado em 30 de abril de 2020 às 17h15.

Última atualização em 1 de maio de 2020 às 01h08.

Eduardo Kobra é internacionalmente conhecido por seus murais coloridos, mas o confinamento mundial provocado pelo novo coronavírus o tirou das ruas e o levou a repensar seu processo criativo. Desta reflexão, surgiu um mural que prega a fé e a solidariedade em São Paulo, sua cidade natal.

"É o momento de repensar, de nos reconciliarmos, de nos unirmos e nos darmos força todos juntos", diz este muralista, conhecido simplesmente como Kobra. Originário de uma comunidade humilde de São Paulo, o muralista conta que o avanço do coronavírus, que já matou mais de 5.000 pessoas no Brasil, o deixou vários dias "paralisado".

Atendendo diversos projetos, ele visitou quarenta países no ano passado. "Nunca estive tão quieto quanto agora", comenta, antes de começar a entrevista com a AFP em Itu, pequena cidade do interior paulista, onde faz sua quarentena.

"Meu trabalho acontece nas ruas, sou um pintor que depende das ruas, eu pinto murais. Para mim, significa uma mudança, uma reflexão muito grande sobre como transformar o meu trabalho (...) Estou repensando a minha forma de criar", afirma.

Em seu processo de reflexão, o artista desenhou "Coexistência", um mural que mostra cinco crianças em oração, que representam cinco continentes e cinco religiões: cristianismo, budismo, judaísmo, islã e hinduísmo. Kobra, que se define como cristão, gostaria de levar "Coexistência" para alguma cidade, mas enquanto o confinamento continuar, o tornou tema de uma série de serigrafias numeradas que serão sorteadas entre quem doar alimentos e outros produtos para ajudar a população indigente de São Paulo, estimada em mais de 25.000 pessoas.

"Não resolve doar apenas alimentos para os indigentes, é necessário pessoas para cozinhar também", explica Kobra, que se somou às ONGs IKMR (Conheço os meus direitos, em inglês) e a Companhia de Artes Nissi para dar vida ao projeto.

As pessoas que doarem um kit de 22,5 reais ou mais vão participar do sorteio de uma serigrafia que será realizado em 1º de maio. Quem contribuir com mil kits (R$ 22.000) ganhará no ato uma peça da série numerada. A ação, que termina em 30 de abril, já reuniu mais de 11.000 kits. O dinheiro arrecadado para ajudar a população de rua será administrado por estas organizações.

"Se para nós, que temos nossas casas, estamos acuados, com medo e tudo mais, imagina quem está na rua", comenta. "Não adianta ficarmos reclusos nas nossas casas e não olharmos para o próximo", acrescenta.

Pessoas simples

Com gestos inquietos e sorriso fácil, Kobra admite preocupação com o cenário imposto pelo coronavírus, embora prefira falar em ajudar quem está em condições difíceis.

"Nenhum país é imune ao que está acontecendo (...) A gente vê os políticos brigando, mas a gente vê uma pequena movimentação em prol dessas comunidades mais carentes que podem ser afetadas de uma forma mais complicada", diz, quando consultado sobre a situação atual do Brasil, marcada pelas críticas do presidente Jair Bolsonaro a autoridades e líderes políticos favoráveis às medidas de quarentena.

Vestido de preto, com seu chapéu característico, o artista esguio contrasta com seu colorido mural ao fundo. "As pessoas mais simples são as que mantêm o Brasil. É hora de o Brasil olhar para essa população mais carente e não medir esforços para ajudá-los", diz.

Com milhares de obras em cinco continentes, inclusive o maior mural no mundo, em São Paulo, este artista autodidata, que não terminou a escola, exala simplicidade e empatia.

Aos 44 anos, diz que sempre espera um Brasil melhor e afirma: "Eu continuo confiando, mas a gente vê que pode acontecer o que for e a gente está vivendo sempre os mesmos conflitos".

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