Estabelecimento no México (Bloomberg/Bloomberg)
Daniel Salles
Publicado em 14 de novembro de 2020 às 06h00.
A mãe do noivo foi levada às pressas para o hospital sem conseguir respirar. Outros convidados estiveram doentes por vários dias. O jovem casal, verdade seja dita, passou parte da lua de mel doente. Mas todos concordaram: o casamento foi lindo.
Nada mudou. Os garçons ainda usam máscaras e as lembrancinhas incluem álcool gel para as mãos. Mas os casamentos em massa no México - um dos epicentros com maior mortalidade do mundo - recomeçaram como se ainda estivéssemos em 2019, com abraços, cantos e danças, transformando o sagrado matrimônio em um evento superpropagador.
Em um país com a quarta maior taxa de mortalidade por Covid-19 do mundo, as revistas de moda exibem novamente noivas e noivos entusiasmados nas capas. Depois de um evento de 700 pessoas no estado de Coahuila no mês passado, autoridades de saúde confirmaram pelo menos 90 casos de Covid.
Os casamentos são um claro lembrete de que as restrições à pandemia do país serviram principalmente como sugestões. O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, tem se destacado globalmente como um dos líderes menos dispostos a impor quarentenas ou incentivar o uso de máscaras e o distanciamento, ansioso pela volta à normalidade.
“É a mentalidade mexicana de que ‘nada vai acontecer’”, disse Alejandro, cujo casamento em setembro provocou o contágio de 20 convidados, incluindo sua mãe, que foi hospitalizada, mas agora está se recuperando.
A data de Alejandro estava marcada há meses. Eles pensaram em mudá-la, mas, “todos nos disseram para ir em frente, ninguém parecia se importar”, disse Alejandro, que pediu para não revelar o sobrenome.
Casos em alta
Os casos no México continuam aumentando. Como em grande parte da América Latina, que foi duramente atingida pelo coronavírus, o número de casos no México nunca caiu realmente durante o verão como ocorreu em outras partes do mundo. Cansado das medidas de quarentena que paralisam a economia, o governo permitiu que os estados emitissem suas próprias restrições com base em um sistema de quatro níveis que estabelece limites - raramente aplicados - ao tamanho das reuniões.
Qualquer que seja o estágio do próprio estado, os mexicanos parecem querer festejar.
O estado fronteiriço de Chihuahua voltou à fase vermelha no final de outubro após o aumento dos casos. Uma cidade recebeu 1,2 mil reclamações em um único fim de semana relacionadas a festas barulhentas, disse o ministro da Saúde do estado, Eduardo Fernández, em entrevista de rádio na semana passada.
“Estamos vendo casamentos e eventos em massa que são praticamente impossíveis de controlar”, afirmou. O estado impôs um dos toques de recolher mais rígidos do país.
A prefeita da Cidade do México, Claudia Sheinbaum, que recentemente testou positivo para o coronavírus, alertou que a alta de casos e hospitalizações pode levar a novas restrições.
“Tenho 70 pacientes doentes agora de um único casamento porque, na segunda tequila, todo mundo já perdeu as máscaras”, disse Francisco Moreno, chefe de medicina interna do Centro Médico ABC, na Cidade do México.