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As entregas nas portas das lojas vieram para ficar?

É provável que o que começou como uma solução para o coronavírus tenha um impacto permanente na maneira como as pessoas compram

Entregas na porta da loja: Esse método permite que certos grandes varejistas convertam suas lojas em minicentros de atendimento de e-commerce. (Amr Alfiky/The New York Times)

Entregas na porta da loja: Esse método permite que certos grandes varejistas convertam suas lojas em minicentros de atendimento de e-commerce. (Amr Alfiky/The New York Times)

MD

Matheus Doliveira

Publicado em 20 de outubro de 2020 às 14h25.

Quando a pandemia forçou a Dick's Sporting Goods a fechar suas centenas de lojas em março, a empresa elaborou um processo de entrega de mercadorias na rua, à porta da loja, em dois dias. Sua tentativa inicial, porém, era bem parecida com uma barraca de limonada infantil.

"Quando você chegava, via uma placa na janela com um número de telefone, e as pessoas ligavam para as lojas, que faziam a entrega", disse Lauren Hobart, presidente da Dick's, sobre a operação "muito desleixada". Alertas de e-mail e de texto viriam mais tarde.

Desleixada ou não, a entrega na rua não só ajudou as vendas da Dick's durante os bloqueios, mas também acabou sendo a melhor estratégia de muitos varejistas para a sobrevivência em longo prazo na era do comércio eletrônico. E é provável que o que começou como uma solução para o coronavírus tenha um impacto permanente na maneira como as pessoas compram e lhes dê uma nova razão para continuar visitando lojas físicas.

Em agosto, cerca de três quartos dos 50 maiores varejistas com lojas físicas nos Estados Unidos ofereceram entregas na rua (Amr Alfiky)

A popularidade da entrega na rua revela que o futuro do varejo não é só um monte de pacotes se acumulando à porta de casa. Além de satisfazer a necessidade de compras sem contato na pandemia, ela satisfaz o desejo de ir até uma loja, algo que pode ser muito forte, ou até mais forte, que a conveniência da entrega em casa.

"Os americanos estão acostumados a dirigir e realmente gostam de lojas, por isso esse é um tipo de híbrido em que você tem o melhor dos dois mundos", afirmou Oliver Chen, analista de varejo.

Em agosto, cerca de três quartos dos 50 maiores varejistas com lojas físicas nos Estados Unidos ofereceram entregas na rua, de acordo com a Coresight Research, empresa de consultoria e pesquisa especializada em varejo e tecnologia. Agora, qualquer coisa, desde um suéter até um livro, é tão fácil de comprar quanto um sanduíche.

A Target informou que suas vendas pelo mesmo método cresceram mais de 700 por cento no último trimestre, enquanto a Best Buy relatou quase US$ 5 bilhões em receita on-line no segundo trimestre, um recorde para a empresa, e disse que 41 por cento disso foi entregue na rua ou retirado na loja.

O crescimento de vendas efetuadas dessa maneira, parte de um aumento maior nas vendas de comércio eletrônico, tem implicações para a preservação dos empregos no varejo, embora os deveres dos trabalhadores provavelmente tenham mudado. Também está ajudando a manter os espaços físicos relevantes, agora que milhares de vitrines estão vazias, pois mais clientes optam por compras on-line.

Esse método permite que certos grandes varejistas convertam suas lojas em minicentros de atendimento de e-commerce, evitando o envio de mercadorias, passo que causa perda de dinheiro.

Ao dirigir até a loja para pegar um pedido feito on-line, "o cliente se encarrega da distância final", disse Chen, referindo-se ao último passo tipicamente caro da entrega de pacotes.

A crescente popularidade desse método coincidiu com as dificuldades da Amazon com sua cadeia de suprimentos e com um sistema de entrega domiciliar geralmente perfeito nos primeiros meses da pandemia. Enquanto os consumidores encomendavam de tudo, desde papel higiênico até piscina de plástico, a Amazon teve de se virar com itens fora do estoque, aumento de preços e envios atrasados ou imprecisos.

    Isso foi uma bênção para cadeias como Dick's, Best Buy, Target e Walmart, que aproveitaram a mercadoria em seus milhares de lojas para causar uma nova impressão, especialmente quando o verão começou.

    "A Amazon teve alguns problemas no início como todo mundo, porque, quando a demanda chegou, foi tão grande que atingiu todo o sistema, prejudicando-o. Quem conseguiu ser ágil com as ofertas digitais teve alguns ganhos", explicou Walter Robb, ex-co-executivo da Whole Foods e executivo residente da S2G Ventures, um fundo de risco focado em alimentos.

    Esse tipo de serviço de entrega está dando ao Walmart e a outras cadeias mais uma vantagem significativa – a capacidade de lucrar com pedidos on-line, em que a economia é notoriamente difícil. A Target afirmou que seus serviços de entrega nas lojas custam à empresa cerca de 90 por cento menos, em média, do que enviar pedidos de um armazém.

    Em um pedido de US$ 100, os custos trabalhistas de escolher as compras reduzem o lucro do Walmart em US$ 1,50, deixando ainda US$ 3 de lucro, estimou Edward Yruma, analista de comércio eletrônico da Keybanc Capital Markets. Em comparação, o Walmart perde dinheiro com suas vendas tradicionais de e-commerce, nas quais os clientes fazem pedidos on-line e os produtos são enviados para sua casa, disse Yruma. Em seu recente relatório de resultados do segundo trimestre, o Walmart divulgou que teve "perdas significativamente reduzidas" em seu negócio tradicional de comércio eletrônico.

    O Walmart agora emprega 74 mil trabalhadores em mais de três mil lojas para pegar os pedidos nas prateleiras e depois levá-los para o carro dos clientes. Cinco anos atrás, havia menos de mil desses postos de trabalho. Mas, durante a pandemia, eles foram um grande impulsionador por trás do boom de contratações do Walmart, que aumentou a força de trabalho de 1,5 milhão de pessoas da empresa em 14 por cento.

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      Esse é um número significativo para o maior empregador privado dos EUA, particularmente num momento em que a economia vem perdendo empregos.

      Porém alguns varejistas não estão contratando mais funcionários para empacotar pedidos on-line – eles estão simplesmente adicionando essas tarefas à carga de serviço dos trabalhadores sem aumentar seu salário. De fato, muitos varejistas acabaram com os aumentos e bônus que os trabalhadores receberam nos primeiros meses da pandemia, uma decisão que grupos trabalhistas criticaram porque eles agora enfrentam cargas de trabalho mais pesadas e a ameaça de contrair o vírus na loja.

      "Se você está tendo um aumento nas vendas e na produtividade, os trabalhadores devem compartilhar esse benefício. Neste momento, os donos dessas empresas são os únicos beneficiados", disse Marc Perrone, presidente do sindicato United Food and Commercial Workers, que representa dezenas de milhares de funcionários de supermercados.

      Especialistas trabalhistas e analistas de Wall Street também preveem que o trabalho de escolher itens da prateleira e levá-los para o carro de um cliente pode ser facilmente feito por máquinas, o que significa que o boom de empregos pode ser fugaz.

      Jean-André Rougeot, executivo-chefe da Sephora Americas, relatou que, em uma recente visita ao Walmart, viu mais funcionários empurrando carrinhos com pedidos de clientes do que compradores. Ele antecipa que as pessoas voltarão às lojas da Sephora para tocar e experimentar seus produtos de beleza, mas reconheceu que a pandemia transformaria a forma como as pessoas compram e recebem mercadorias.

      "Todos os avós dos EUA sabem como usar o Zoom agora, porque foi assim que falaram com seus netos nos últimos seis meses, por isso não são apenas os jovens. Toda a população se tornou muito mais confortável com a tecnologia e a capacidade de encomendar as coisas de forma diferente", disse Rougeot.

      E acrescentou: "Há um grupo inteiro de consumidores que literalmente descobriu o e-commerce durante esse período. Essas pessoas, por causa da Covid, começaram a fazer isso, e não acho que vão voltar ao que era antes."

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