Filme conta história de um adolescente que sobrevive a um naufrágio e passa 227 dias à deriva no oceano, contando com a perigosa companhia de um tigre de Bengala (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 20 de dezembro de 2012 às 07h35.
São Paulo - Por trás de uma simplicidade aparente, há grandes ambições em "As Aventuras de Pi", o novo filme do taiwanês radicado nos EUA Ang Lee que todo mundo está esperando ver entre os principais indicados no Oscar, cujos concorrentes serão anunciados em 10 de janeiro de 2013.
Por enquanto, a produção já recebeu três indicações no Globo de Ouro --melhor filme, diretor e trilha sonora (Mychael Danna) e figura na lista dos melhores do ano do respeitado American Film Institute.
A simplicidade enganosa que encobre uma sofisticação que se revela aos poucos, aliás, é marca registrada no trabalho de Lee ("O Segredo de Brokeback Mountain"), que aqui recorre ao 3D com muita propriedade. Um dos pontos altos De "As Aventuras de Pi" é a beleza visual estonteante, resultado do trabalho refinado do supervisor de efeitos especiais Bill Westenhofer e do diretor de fotografia chileno Claudio Miranda.
O visual fantástico serve à história de um adolescente, Pi (o estreante Suraj Sharma), que sobrevive a um naufrágio e passa 227 dias à deriva no oceano, contando com a perigosa companhia de um tigre de Bengala num barco salva-vidas.
Pouquíssimas vezes se veem imagens de um animal real. Na maior parte das cenas, o impressionante tigre é o resultado de um ano de trabalho de centenas de técnicos da empresa Rhythm & Rues, que criaram um felino totalmente convincente.
Neste cenário, alguns poderão até pensar que a história, adaptada do bestseller do autor franco-canadense Yann Martel, seria um tipo de cruzamento de desenho da Disney com filme de natureza do Discovery Channel. Nada mais falso. O real tema do enredo é um radical aprendizado de sobrevivência ao qual não faltam momentos engraçados e cenários de uma beleza magnífica.
Até o naufrágio, o maior desafio na vida de Pi fora lidar com as gozações na escola por conta de seu nome inteiro --nada menos do que Piscine Molitor, homenageando a piscina parisiense preferida de seu tio.
Nem mesmo sua peculiar adesão a diversas religiões --além de hinduísta, desde menino ele se aproximara também do catolicismo, budismo e islamismo-- o preparara para ter a força espiritual necessária a uma longa permanência no mar, parte do tempo privado das provisões a bordo do barco que, para piorar, tornou-se território controlado pelo tigre.
Logo depois do naufrágio, o bote se assemelha a um projeto de Arca de Noé, tornando-se refúgio, além do garoto, de um orangotango, uma zebra e uma hiena, antes da chegada do tigre. Todos eles, animais de um zoológico pertencente ao pai de Pi (Adil Hussain) que, com toda a família, rumava para o Canadá para negociar os bichos e iniciar uma nova vida.
Separado dos pais e do irmão, vivendo uma solidão profunda, que vai sendo complicada pelo manejo dos animais agressivos --além do tigre, a hiena não é exatamente dócil--, Pi tem que contar apenas consigo mesmo.
A natureza não lhe oferece apenas desafios de sobrevivência, mas também espetáculos de grande beleza --caso do encontro com os peixes voadores; a visão noturna de um oceano povoado de águas-vivas fosforescentes; a intrusão das baleias; e a misteriosa ilha povoada de suricatos.
Todas estas experiências se somam no relato que um Pi na meia-idade --interpretado por Irrfan Khan-- faz a um escritor (Rafe Spall) sobre seu passado, um recurso da narrativa para plantar a dúvida no espectador: Afinal, tudo isto é verdade ou não? E é desse jogo entre verdades e mentiras que realmente o filme quer falar.