Carrer dels Banys Nous, em Barcelona (Natalia Wisniewska/The New York Times)
Guilherme Dearo
Publicado em 7 de julho de 2019 às 07h00.
Última atualização em 7 de julho de 2019 às 07h00.
Na Barcelona de Carlos Ruiz Zafón, a badalada capital da região espanhola da Catalunha, ainda há muito a descobrir abaixo da superfície. "Tesouros sob os ruídos" – é como o romancista cujos best-sellers oferecem um retrato vívido de sua cidade natal descreve seus refúgios favoritos.
O autor de 54 anos, responsável pela série "The Cemetery of Forgotten Books" (a obra mais recente, "The Labyrinth of Spirits", foi publicada em 2018), divide seu tempo entre Barcelona e Los Angeles, onde mora no momento. Seus endereços favoritos podem parecer familiares, mas adquirem um significado totalmente diferente quando vistos através de sua lente fantástica.
Com vocês, cinco recomendações de Ruiz Zafón.
Ruiz Zafón gosta dos contrastes que vê na caminhada da Catedral de Barcelona até o cais, Port Vell, pela Carrer dels Banys Nous. A rota, perfeita para pedestres, começa estreita e escura ao longo de uma muralha romana, corta o centro do Bairro Gótico e termina na luminosidade aberta do porto. "Você passa por muitos séculos, muitos períodos históricos."
A gigantesca catedral de Gaudí, incompleta, fica a uma quadra de onde Ruiz Zafón foi criado e onde seu pai ainda mora. "Quando eu era moleque, era uma ruína! Eu a conhecia como a palma da mão. Subia nas torres, entrava nos túneis e descia nas oficinas, onde guardavam as imagens religiosas." Ainda hoje, continua atraído pelo templo. "É interessante ver como ela deixou de ser um lugar negligenciado, do qual as pessoas zombavam – 'É monstruosa, é espalhafatosa!' –, para se tornar a atração mais visitada da cidade."
Endereço: Carrer de Mallorca, 401
Na parte mais antiga do cemitério há mausoléus e palacetes decorados, erguidos por magnatas do século XIX que faziam questão de exibir a riqueza até na morte. "Tem alguma coisa na combinação de excesso e morte que acho fascinante. Você vê construções extravagantes, mórbidas, com anjos vingadores que parecem ter saído do inferno! É como se o mundo real desaparecesse ali", comenta. E aconselha os visitantes a se manter atentos para não ficarem presos ali após o fechamento dos portões. Fala por experiência própria, pois, quando era adolescente, tentou atravessar o cemitério em uma moto aos pedaços, perdeu-se completamente e quase teve de passar a noite por lá. "Era o cenário perfeito de filme de terror! Mas ainda adoro o lugar, por mais fantasmagórico que pareça."
Endereço: Carrer de la Mare de Déu de Port, 56, 58
Ruiz Zafón gosta de pegar o bondinho para ir ao topo da montanha Tibidabo e, ao chegar lá, apreciar a vista espetacular com um drinque no La Venta, um restaurante centenário. Um pouco mais acima fica o Gran Hotel La Florida, reformado para recuperar o esplendor cinco estrelas, e o Parc d'Atraccions Tibidabo, um parque de diversões revitalizado que, para tristeza do autor, perdeu parte da personalidade em nome da modernização. Mesmo assim, ele continua atraído pela história da montanha, e também por seu nome. "Em latim, 'tibidabo' significa 'eu lhe darei', que são as palavras do Diabo para tentar Jesus. Sempre achei muito apropriado, porque Barcelona tem uma alma bem sombria. Faz todo o sentido do mundo que o demônio suba essa montanha para nos tentar com todos esses prazeres terrenos."
"Dá uma boa ideia de como era a cidade era", ele comenta a respeito desse mercado lendário do século XIX, que começou como uma feira comum onde cozinheiros e chefs se abasteciam para se tornar um destino gourmet, com o que há de melhor da Catalunha. "Ali você encontra as comidas e especiarias mais maravilhosas – e, de quebra, ainda pode degustar tapas excepcionais, de pé mesmo, preparadas por gente que trabalha no ramo há 50 anos."