48 horas em Santiago é pouco: a cidade merece pelo menos uma semana para ser conhecida e para desvendar seus arredores (Wikimedia Commons)
Da Redação
Publicado em 12 de março de 2012 às 11h06.
São Paulo - Santiago é extremamente modesta, mas é difícil ir embora sem um coração apertado. Não é uma cidade que promete paixão e loucuras, que estimula altas expectativas de destinos manjados como Buenos Aires e Paris. Mas ela te cativa com a beleza das paisagens, a riqueza cultural, o povo simpático que ama os brasileiros.
Nas calçadas, cachorros de rua (de raça!) te acompanham nas caminhadas. Para longas distâncias, o metrô é uma ótima escolha. Limpo e organizado, é uma mão na roda para se locomover pela cidade sem estresse e sem gastar muito. O preço das passagens varia de acordo com o horário, então é bom prever que tipo de bilhete você vai precisar na volta.
48 horas em Santiago é pouco: a cidade merece pelo menos uma semana para ser conhecida e para desvendar seus arredores. Valparaíso, Viña Del Mar e Isla Negra são escolhas acertadas. A primeira e a última têm as outras duas casas do poeta chileno Pablo Neruda (a terceira está na capital, com mais detalhes a seguir). Outro passeio de um dia para quem tiver mais tempo (no inverno) são as estações de esqui Farellones, El Colorado, La Parva, Portillo e Valle Nevado. No verão, aproveite para conhecer a vinícola Concha y Toro.
Mas, se dois dias são tudo o que você tem, aqui vão as dicas para aproveitar cada segundo e sair com a sensação de dever cumprido, sem arrependimentos:
Dia 1
O dia começa, talvez, de uma forma inusitada. Seria cedo demais para sugerir um café da manhã... com pernas? Cafés con piernas são estabelecimentos onde se toma café em pé, no balcão, na presença de garçonetes trajadas com microvestidos e microssaias, em um tablado mais alto. Assim, as pernas ficam mais visíveis aos fregueses, que gostam de ficar de papo-furado com as meninas. Café Caribe (Paseo Ahumada, 120, 56/2/695-7081; 7h/23h) e Café Haiti (Paseo Ahumada, 140, 56/2/698-1284; 7h/22h30) ficam no mesmo quarteirão, mas bem próximo a eles está o ousado Macumba Café (Galeria Edwards, Huérfanos com Ahumada), onde os expressos são servidos por mulheres de biquínis ou de lingeries.
Nada por acaso, os cafés ficam próximos a Plaza das Armas, marco zero da cidade e (quase) do tour. Cercada de casarões coloniais, ganhou o nome ameaçador para inibir o ataque de índios, que arrasaram a vila de Santiago del Nuevo Extremo seis meses após sua fundação, em fevereiro de 1541. Sinta a atmosfera da praça de palmeiras centenárias, pintores, dançarinos de rua e velhinhos jogando xadrez e contemple o belo prédio do Correo Central, de 1882. Entre na Catedral Metropolitana, cuja fachada neoclássica data de 1789 (e a construção já é a quinta feita no mesmo local), e, depois, se quiser, conheça a história chilena em 20 minutos no pequeno Museo Histórico Nacional, em um prédio de 1808.
Na rua Bandera, o Museu de Arte Precolombino guarda múmias chinchorro, povo de pescadores que viveu há mais de 7 mil anos no norte do Chile e sul do Peru. Trata-se da forma mais antiga de preservação de cadáveres humanos conhecida. A coleção também tem esculturas maias, tecidos andinos, chapéus, vasos e outras peças de arte pré-hispânica de todo o continente americano, inclusive de astecas e incas. Vale a pena conhecer.
No mesmo quarteirão, passe no El Rápido para forrar o estômago e aproveitar o resto do passeio sem ficar pensando no almoço. Engane a fome com uma empanada de pino con pebre, popular vinagrete de coentro.
A quatro quadras está o Palacio de La Moneda, uma das poucas sedes de governo no mundo abertas para visita. Foi neste prédio que morreu o presidente socialista Salvador Allende, em setembro de 1973, deposto por um golpe militar liderado pelo general Augusto Pinochet. Nos dois pátios internos dá para ver canhões, fontes e dezenas de laranjeiras, mas antes é preciso passar por uma revista dos guardas. Se quiser ver a troca de guarda, que acontece sempre às 10h em dias alternados, passe lá antes de ir ao Museu Precolombino.
Não deixe de ir ao Centro Cultural Palacio de La Moneda (Plaza de la Ciudadanía, 26, metrô La Moneda, 56/2/355-6502, 2ª/dom 9h/21h); você já está lá mesmo! Ele fica no subsolo do palácio e abriga mostras de arte e cinema interessantes, que podem ser vistas antes do almoço.
Ok, hora de comer. Pegue o metrô Universidad de Chile (antes veja a fachada da universidade em estilo neoclássico francês, de 1872) e vá para a estação Universidad Católica. Na próxima quadra, sentido contrário à Av. Bernardo O’Higgins, sente-se e descanse os pés no restaurante Gatopardo. O concorrido menu de almoço tem bom preço fixo e te dá direito a pisco sour aperitivo, mesa de saladas, prato principal, vinho ou suco, sobremesa e café. Ou seja, é uma bênção após a atribulada manhã.
Vá com calma ao Museo de Bellas Artes, um dos edifícios mais bonitos de Santiago, de estilo neoclássico com detalhes em art noveau. Se você estiver cansado demais para ver as 5.600 pinturas e esculturas de artistas europeus e chilenos, entre pelo visual interno do prédio e aproveite o café do museu para descansar.
Agora se prepare psicologicamente para fazer força nas pernas. O Cerro Santa Lucía requer certo esforço para se chegar ao topo, mas a vista panorâmica com a Cordilheira dos Andes ao fundo vale cada pernada. E a subida de 20 minutos é agradável aos olhos: é permeada de murais, estátuas e até uma fonte inspirada na Fontana di Trevi, de Roma. Além da vista geral da cidade, uma vez na pequena praça do cume, é possível ver Santiago de perto com a ajuda dos binóculos fixos do mirante (basta inserir uma moneda).
Para acompanhar a gostosa sensação pós-caminhada, que tal uma cerveja? O pub Berri, de teto baixo e clima intimista, é frequentado por estudantes da Universidad Católica, que vão lá para beber, conversar e escutar black music.
O fofíssimo bistrô Les Assassins é a indicação para o jantar. É romântico para os casais e cool para amigos, com luz baixa, teto xadrez preto e vermelho e painel rabiscado atrás do bar. Além do cardápio francês, tem boas receitas de mariscos chilenos, e os garçons são educados e atenciosos.
Se ainda tiver energia, vá a uma salsoteca! No bairro Providencia, o Maestra Vida (56/2/777-5325) é uma casa de salsa pequena, cheia de jovens. Caso prefira público mais sossegado, a pedida é o cubano Ilé Habana (56/2/231-5711), do outro lado do Rio Mapocho.
Dia 2
A primeira missão do dia é visitar o Cerro San Cristóbal, uma montanha de 880 metros que os santiaguinos gostam de subir de bicicleta aos domingos. Em uma de suas encostas, na Providencia (que agora você vai conhecer à luz do dia), está o Jardin Botânico Mapumelu, com cerca de 80 espécies nativas.
No mesmo bairro, o Parque de las Esculturas traz uma experiência interessante. Por uma área de 21 mil metros quadrados espalham-se 30 esculturas de diferentes tamanhos, formas e materiais, assinadas por artistas como Marta Colvin, Claudio Girola, Federico Assle, Juan Egenau, entre outros. O resultado disso é a união entre o ambiente natural e o visual lúdico e desafiador das obras de arte. Não chega ao tamanho e à dimensão do Instituto Inhotim, em Minas Gerais, mas a proposta é parecida. É uma delícia se sentar em um dos banquinhos e pensar na vida, aproveitar o clima plácido do parque.
Antes de deixar o bairro, almoce mais cedo no Astrid y Gastón, provavelmente uma das melhores refeições na cidade. As receitas de base peruana foram reinventadas com toques espanhóis, japoneses e franceses para o cardápio do restaurante. Caso queira investir no produto chileno, uma boa opção é o Aqui Está Coco, que já foi considerado um dos melhores restaurantes de Santiago. Peça uma ronda de mariscos especial para experimentar ostras, maltones, lagostim, salmão defumado, machas, ceviches, lulas...
A sobremesa pode ser na sorveteria mais tradicional da cidade? Pode. A filial da Bravissimo em Providencia fica aberta até tarde e não é difícil de ser encontrada: a fachada tem uma placa ultracolorida.
Devidamente alimentado, vá à Bellavista e conheça o outro lado do Cerro San Cristóbal. Uma forma legal de se chegar ao topo é pegando o funicular, um trenzinho que sai da Calle Pio Nono. Os 10 minutos de subida garantem uma vista privilegiada da cidade, e no cume está a estátua da Virgen de La Inmaculada Concepción, com 14 metros de altura sobre um pedestal de 8,5 metros. Abaixo da virgem, é comum as pessoas se sentarem nas largas e altas escadas para contemplar o panorama de Santiago.
Chegou a hora da principal atração da cidade, a Casa Museo La Chascona, uma das três casas chilenas do poeta Pablo Neruda. Passe lá para agendar a visita guiada de 40 minutos e, caso tenha que esperar, passeie nos arredores e observe a arte de rua nos muros e nas paredes das casas. A Calle Constituición tem os bares e restaurantes mais badalados da capital. Os estabelecimentos são construções baixas e bem acabadas, com decorações interessantes; você nem vai notar o tempo passar.
Outra opção é provar a cerveja chilena Kunstmann no boteco Galindo. Para acompanhar a bebida, experimente algumas iguarias típicas como empanada de pino (carne em cubos com cebola), pastel de choclo (milho), humita (pamonha chilena) ou um caldillo de congrio. A sopa de congrio é tão emblemática no país que Neruda escreveu a ela o poema Ode al caldillo de congrio.
Pronto para ser surpreendido? Pois bem, durante a visita à insólita casa do poeta chileno, você terá o prazer de ver como ele era criativo, engraçado e excêntrico. Apesar de ter medo d’água e de ter aprendido a nadar apenas com 48 anos, Neruda era apaixonado pelo mar. A casa foi construída para simular a sensação de se estar em um barco. O teto baixo, os objetos (muitos, de colecionador compulsivo), o revestimento de madeira e a iluminação ajudam a criar a ilusão. Imperdível.
No restaurante latino-americano Santería é onde você pode provar ceviche, peixe marinado típico da culinária peruana, presente em todos os cardápios de Santiago. Depois, vá ao interessantíssimo KY, um bar/restaurante que fica em um casarão com mais de 10 ambientes decorados com uma livre associação de ideias quase surrealista. Os garçons são simpáticos, a comida é gostosa, a decoração é inusitada (mas o preço pode ser um tanto salgado). Mesmo assim, não deixe de ir: peça apenas um drink, que seja, para conhecer o ambiente. E não se iniba pela falta de placa na porta: faz parte da faceta “cool/ exclusiva” do lugar.
Uma boa balada para fechar a viagem? Vá à Las Urracas, uma das preferidas dos santiaguinos (que tem muitos gringos também). É grande, com vários ambientes, e o público é variado. Santiago é muito maior do que dois dias, mas com esses programas já dá para se apaixonar.