Azeite extravirgem: necessário ter acidez livre abaixo de 0,8%, extração a frio e ausência de defeitos sensoriais (Rodrigo Matias/Divulgação)
Repórter de Casual
Publicado em 17 de novembro de 2025 às 17h45.
Ingrediente presente na dieta mediterrânea, o azeite extravirgem tornou-se um dos produtos mais cobiçados do mercado gourmet global. O insumo é sinônimo de saúde, sofisticação e pureza — mas nem sempre o que chega à mesa corresponde à promessa do rótulo. Por trás das garrafas de vidro escuro e dos selos dourados, existe uma indústria bilionária em expansão, marcada por avanços tecnológicos, fraudes persistentes e uma crescente demanda por transparência. Hoje, o Brasil é o segundo maior consumidor fora da Europa, atrás apenas dos Estados Unidos.
Segundo o Conselho Oleícola Internacional (COI), o país importou cerca de 110 mil toneladas de azeite em 2024, e o consumo deve continuar crescendo a taxas próximas de 10% ao ano. O paladar brasileiro amadureceu — o azeite deixou de ser um luxo mediterrâneo para se tornar item cotidiano nas cozinhas. Mas, à medida que o mercado se expande, aumentam também os casos de adulteração, rótulos imprecisos e produtos que perdem qualidade ainda na prateleira.
“Encontramos azeites que, embora rotulados como extravirgens, já não se enquadram nessa categoria técnica”, explica a nutricionista Lígia Fernandes, mestre em ciência dos alimentos pela USP. “A cadeia é longa e sensível. Luz, calor e tempo comprometem a qualidade antes mesmo de o produto chegar ao consumidor”, completa.
A definição de um azeite extravirgem é rigorosa: acidez livre abaixo de 0,8%, extração a frio e ausência de defeitos sensoriais. Mas, na prática, nem todos os produtos mantêm essas características.
“O azeite é uma categoria vulnerável porque tem alto valor agregado e difícil rastreabilidade”, diz Ricardo Mansano, chef do restaurante espanhol Andres Una Experiencia. “O consumidor paga caro, mas ainda não tem ferramentas para identificar a autenticidade.” Ele destaca ainda que existem parâmetros técnicos já consolidados que podem ajudar, como o grau de acidez — quanto menor, mais puro e fresco o produto costuma ser.
Ao mesmo tempo em que as irregularidades persistem, o segmento premium vive um boom. Pequenos produtores brasileiros vêm conquistando espaço e prêmios internacionais, especialmente em regiões como a Serra da Mantiqueira, Campos de Cima da Serra e o Sul de Minas. Nessas áreas, a colheita e a prensagem ocorrem no mesmo dia, preservando o frescor e o aroma da azeitona.
“Nosso azeite chega ao consumidor em poucas semanas, o que garante uma vivacidade que muitos importados já perderam”, diz Juan Zan, produtor da Colhida, marca de azeites brasileiros que já conquistou o prêmio de melhor azeite do Brasil no EVO IOOC 2025, um dos concursos mais prestigiados do setor, na Itália, e a medalha Gran Prestigio Oro no Olivinus 2024, em Mendoza, na Argentina. A empresa também ganhou medalha na sexta edição anual do Anatolian International Olive Oil Competition, que aconteceu na Turquia.
Grau de acidez: quanto menor, mais puro e fresco o produto costuma ser (Beatriz Cerri/Divulgação)
"Para o consumidor brasileiro colher os benefícios reais, é preciso olhar além do marketing. Bons azeites devem ser guardados longe do calor e da luz, consumidos preferencialmente até 18 meses após a colheita e escolhidos com base na data de safra, não apenas na validade. Embalagens escuras e selos de procedência ajudam, mas ainda é a educação sensorial que faz a diferença", diz Juan.
Do ponto de vista econômico, o azeite também se tornou um ativo de prestígio — um “ouro líquido” que combina tradição agrícola, inovação e apelo emocional. “O azeite é o espelho de uma nova economia da confiança: o público quer saber de onde vem, como é feito e por que vale o que custa”, resume a chef Paula Gonçalves, à frente do Andres Una Experiencia.
“O azeite é o toque final que transforma um prato. Ele não serve apenas para dar brilho ou untar — é um ingrediente vivo, que carrega aroma, textura e identidade. Um bom azeite extra virgem realça o sabor dos alimentos e equilibra a gordura do prato. Costumo dizer que, se o azeite é ruim, ele derruba o trabalho de horas na cozinha”, diz Denis Orsi, chef do Marena Cucina.
Além disso, Ricardo reforça que, assim como no universo dos vinhos, a degustação de azeites vem ganhando força, com especialistas dedicados a analisar pureza, intensidade aromática e perfil sensorial.
Confira 10 dicas do produtor de azeites Juan Zan, para escolher um azeite de boa qualidade.
A luz é um dos principais inimigos do azeite. Ela acelera a oxidação e destrói compostos fenólicos, responsáveis pelos benefícios à saúde e pela estabilidade do produto. Prefira azeites em garrafas escuras e que não fiquem expostas à iluminação direta no supermercado. Se o rótulo vem em garrafa transparente, o risco de degradação é maior — especialmente se o azeite for importado e tiver ficado meses em transporte e armazenamento.
O azeite é um produto vivo — quanto mais fresco, mais potente. Enquanto a validade costuma indicar dois anos após o envase, o que realmente importa é a data de colheita, que revela quando as azeitonas foram prensadas. O ideal é escolher azeites da última safra (no Brasil, entre janeiro e abril; no Mediterrâneo, entre outubro e dezembro). Aromas herbáceos, picância e amargor são sinais de frescor.
Para ostentar o selo de "extra virgem", o azeite precisa atender critérios químicos e sensoriais definidos pelo Conselho Oleícola Internacional: acidez livre menor que 0,8%, índices de oxidação controlados e, principalmente, ausência de defeitos sensoriais (ranço, mofo, vinagre). “Virgem”, “puro”, “refinado” ou “tipo único” indicam azeites processados ou misturados, que perdem propriedades bioativas. Extra virgem é o único azeite que preserva compostos fenólicos, como oleocantal e oleuropeína, ligados à proteção cardiovascular e à ação anti-inflamatória.
Mais importante do que o país, é a origem, nem sempre o produto importado vai ser um azeite excelente, pelo contrário, existe muito azeite importado com qualidade inferior. Prefira rótulos que trazem a safra do azeite e procure conhecer a origem do azeite que está consumindo. No Brasil, regiões como Serra da Mantiqueira (MG/SP) e Campanha Gaúcha (RS) produzem azeites incríveis e na grande maioria superiores a importados, além de serem premiados internacionalmente, com acidez de 0,3% a 0,1%.
“Isso é um fato, inclusive na Europa, há poucos dias estava conversando com um produtor da Espanha, o custo de produção de alta qualidade, iguais encontrados no Brasil, podem beirar os 36 euros por litro. É só fazer a conversão e verá que o azeite de produção brasileiro está valendo muito a pena, o manejo, custo da cultura, tempo de cultivo, extração a frio e a colheita precoce (com azeitonas ainda verdes), exigem tecnologia e desperdício controlado”, explica. Um azeite extra virgem autêntico raramente custa menos de R$ 90 por 500ml, mesmo nacional. Preços muito baixos podem ser um sinal para um produto com uma entrega muito inferior do que esperamos de um azeite extra virgem.
Amargor e picância são virtudes. O consumidor acostumado a azeites neutros pode estranhar o sabor intenso dos bons azeites, mas é justamente esse leve ardor na garganta e o amargor na língua que revelam alta presença de antioxidantes naturais. Prove um gole puro: se sentir notas de erva fresca, amêndoas verdes ou alcachofra, está diante de um azeite autêntico.
Após aberto, o azeite começa a oxidar. Mantenha em local fresco, escuro e longe do fogão. O ideal é consumir a garrafa em até 90 dias após aberta. Se possível, opte por frascos menores — 250 ml ou 500 ml — para garantir frescor até o fim.
Selos como DOP (Denominação de Origem Protegida), IGP (Indicação Geográfica Protegida) ou prêmios de concursos como EVO IOOC Italy, Terraolivo IOOC e Anatolian IOOC são bons indicadores de qualidade e rastreabilidade. No Brasil, procure azeites com selo de qualidade da EPAMIG ou da Embrapa, que acompanham testes laboratoriais de acidez e peróxidos.
Apesar do destaque no rótulo, a acidez não é perceptível ao paladar — ela não tem relação com o sabor, mas sim com a qualidade da azeitona antes da extração. Azeitonas processadas logo após a colheita resultam em baixa acidez; azeitonas armazenadas por dias geram degradação e alta acidez. Um bom azeite extra virgem apresenta acidez entre 0,2% e 0,4%, indicando frescor e pureza.
Alguns rótulos anunciam “blend de azeites mediterrâneos” ou outros nem sempre isso será uma boa opção. Um blend tem que lhe trazer clareza da entrega, como um blend suave, frutado e intenso, assim sabe que sabor poderá encontrar no que anuncia.