Comissões parlamentares de inquérito atraem muita atenção na largada, pela novidade, mas precisam ser abastecidas por fatos novos para manter a audiência conforme o tempo passa, e o público vai tendendo a se desinteressar. E é natural que cada lado busque achados para alimentar sua própria narrativa. A CPI da Covid não chega a ser original nesse aspecto.
O que a oposição quer? A digital de Jair Bolsonaro em alguma medida oficial que tenha, sem justificativa plausível, atrasado o início da vacinação no país. Num degrau abaixo, imagina também poder responsabilizá-lo pelo estímulo ao uso de medicamentos cuja eficácia para o tratamento da covid-19 ainda não foi cientificamente comprovada, ou já foi descartada.
Este último ponto não será tão difícil assim de operar. O problema é que aqui o presidente está em companhia. Largas porções da comunidade médica navegam com ele no mesmo barco. E há uma divisão nas entidades de medicina. Algumas relevantes mantêm a orientação de que o médico pode receitar o que quiser, desde que de acordo com um paciente devidamente esclarecido sobre a situação.
Nas vacinas a coisa talvez complique um pouco mais para os acusadores. Inclusive porque a Anvisa têm oferecido argumentos para a defesa de Bolsonaro. Por exemplo ao bloquear a indiana Covaxin e a russa Sputnik V. O governo tem, neste caso, base para dizer "viu como eu fui prudente ao dizer que só compraria vacinas que fossem aprovadas pela Anvisa?".
Aliás é um argumento já em circulação no governismo da CPI.
Vai ser curioso ver na CPI senadores dizendo que a Anvisa acertou ao embarreirar certas vacinas mas que Bolsonaro errou ao decidir só comprar os imunizantes depois de terem sido aprovados pela agência. Será preciso alguma ginástica. Mas nada que não possa ser resolvido pelos experientes parlamentares da comissão de inquérito.