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'Sudestinos'? Influenciadora mostra que é preciso parar com estereótipos

Incluir pessoas fora do grupo hegemônico não é tudo, ainda mais quando continuamos tratando grupos como “exóticos”

Inverter situações cotidianas nos faz perceber o quanto nossas ações são estereotipadas (Porta dos Fundos/Reprodução)

Inverter situações cotidianas nos faz perceber o quanto nossas ações são estereotipadas (Porta dos Fundos/Reprodução)

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Publicado em 20 de julho de 2021 às 16h42.

Última atualização em 20 de julho de 2021 às 17h13.

Por Beta Boechat*

O humor pode ser uma arma eficaz para gerar reflexão e incômodo entre as risadas. Inverter situações que são cotidianas para muitos grupos minoritários nos faz perceber o quanto nossas interações, dadas por nós como normais e inofensivas, na verdade carregam visões estereotipadas desses grupos. Nesta semana, fui surpreendida por um vídeo do Porta dos Fundos que foi capaz de produzir essa mistura única de gargalhada, incômodo no estômago e tapa na cara.

O vídeo simula uma reunião de trabalho virtual, com funcionários de uma empresa dando as boas vindas ao novo contratado. Mas tem um detalhe: o tal novo funcionário é “sudestino”. Essa expressão, por si só, já causa estranheza. Se você é da região sul ou sudeste deste país, provavelmente nunca ouviu essa palavra, ou pelo menos nunca relacionada a você. No entanto, é só “inverter” a expressão que ela começa a fazer todo o sentido.

Um processo muito comum no tratamento da diversidade é a exotificação de certos grupos. Quando convivemos no espaço de trabalho com a tal “diversidade”, é fácil tratar essas pessoas a partir de estereótipos construídos em cima daquele grupos, seja de LGBTQIA+, pessoas negras, gordas ou até pessoas fora do eixo Rio-São Paulo. O que é “diferente” é sempre visto como um grupo homogêneo, identitário, como se todas as pessoas fossem iguais e como se todos os seus hábitos fossem curiosidades a serem exploradas.

Sabe aquela expectativa de ouvir uma história de superação de toda pessoa que saiu do Recife pra morar em São Paulo? Ou aquela fala mole e cheia de trejeitos quando vê um homem gay que faz as unhas, como se todos tivessem vindo direto de um quadro do Zorra Total?

O problema desse processo, além do óbvio afastamento desses grupos, que são colocados quase como num zoológico identitário, é a falta de percepção de si próprio como identidade. Vemos a cultura afro-brasileira como “étnica”, mas nunca chamamos a cultura italiana de “exótica”. Achamos graça da cultura LGBTQIA+, mas nunca pensamos a paixão pelo futebol como um traço cultural específico de um grupo.

Brincamos com o sotaque de pessoas “do nordeste”, sem pensar que o sudeste também tem suas formas curiosas de falar. Em resumo, a cultura dos grupos chamados hegemônicos é sempre tratada como a norma, o comum, o corriqueiro, enquanto os grupos minoritários são vistos como identitários, específicos, delimitados.

Esse tipo de percepção pode parecer não afetar em nada sua vida ou sua empresa, afinal, você já fez o trabalho de criar uma equipe diversa, o que mais ainda falta? Te convido a assistir o vídeo do Porta dos Fundos pra refletir sobre isso.

Do que adianta termos pessoas deslocadas do eixo cultural hegemônico se essas pessoas ainda são tratadas mais como um troféu do que como uma fonte valiosa de conhecimento? Do que adianta querer estrategicamente ter maior penetração em mercados fora do eixo sul-sudeste se sua empresa ainda representa as regiões mais ao norte do Brasil como seca, areia e cacto? Como trazer para dentro das suas equipes uma narrativa diversa, se todos que não são homens, brancos, cis, heteros, magros e paulistanos são tratados como a mulher barbada do circo: adorada, aplaudida, celebrada, mas só até a hora da cortina se fechar?

Se comprometer com a diversidade é também saber tirar o foco do próprio umbigo. É entender que diversos somos todos e que nós, por mais “comuns” que pareçamos, também somos parte do diferente. Pra isso, é preciso abrir as jaulas desse zoológico conceitual e encerrar o fetiche do museu cultural. Dói? Sem dúvida. Mas, como diria todo sudestino que toma chimarrão na praia: “a vida é loka, meo”.

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*Beta Boechat é publicitária da @FALA.agency e criadora de conteúdo no @betafala. Trans não-binária, é consultora das áreas de diversidade, gênero, LGBTQIA+ e body positivity.

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.

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