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Ser humano não é máquina, e saúde mental é assunto para 365 dias do ano

Vida profissional e pessoal não se separam; é preciso romper com discursos de meritocracia e teologia da prosperidade

Cuidar da saúde mental de colaboradores é o que faz alguém ser bom líder (Pikisuperstar/Freepik/Divulgação)

Cuidar da saúde mental de colaboradores é o que faz alguém ser bom líder (Pikisuperstar/Freepik/Divulgação)

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Publicado em 22 de setembro de 2021 às 13h58.

Por Beta Boechat*

Não acredito ser romântica a ideia de que seja possível construir um local de trabalho mais humano. Com tantos anos trabalhando para ajudar empresas a repensarem a forma de lidar com seus colaboradores e clientes, coleto histórias de transformações pessoais que se deram em horário comercial.

Digo isso, porque há uma certa concepção de que emoções e trabalho não se misturam. Talvez por uma invasão dos discursos de meritocracia e teologia da prosperidade que, há algumas décadas, definem essa tal “nação empreendedora” que valorizamos tanto hoje.

Dentro dessa concepção moderna de trabalho, aprendemos que devemos deixar nossos problemas pessoais na porta do escritório. Que, assim como uma roupa, devemos nos despir de tudo que nos faz humanos para nos tornar uma máquina de produtividade e resultados. Para manter essa ilusão de pé, damos uma voz exagerada aos discursos de superação, citamos Darwin e sua suposta conclusão de que “o mundo é dos mais fortes” mais do que o próprio em sua obra. Tudo isso para facilitar o processo de “engolir o choro” e produzir.

Pois olhemos em volta para entender o que isso nos custou. Hoje, a depressão é uma das doenças mais incapacitantes que existem. Os números de suicídio aumentam anos após ano, com uma taxa extremamente preocupante entre jovens e até crianças. Saúde mental deixou de ser uma área desconhecida para virar quase um mantra, mesmo que com poucas ações práticas.

Vamos aceitar o óbvio: seres humanos não são máquinas. Há até quem diga que não somos seres racionais, mas sim seres emocionais que racionalizam. A emoção é nosso drive principal, enquanto a razão é só uma ferramenta de tentar organizar esses pensamentos.

Não é possível deixar as emoções do lado de fora. Sem elas, a gente não existe. Uma decepção amorosa, muito tempo ser ver os familiares, falta de conexões verdadeiras, tudo isso, vai sim afetar o trabalho. Porque o trabalho não está desconectado da vida. Nada está desconectado.

Então por que como gestores ainda estamos alimentando essa fantasia? Por que ainda estamos fingindo que pessoas são unidimensionais e que são capazes de se mortificar por uma causa que, muitas vezes, nem é dela? Por que ainda ignoramos que cuidar do emocional da sua equipe também faz parte de um bom líder?

Para cada história de sucesso, existem muitas pessoas que ficaram pelo caminho. Será que é esse tipo de história que ainda queremos contar?

Quando a gente começa a cair na real e perceber sobre nossas motivações, e até sobre nossas limitações, não precisaremos mais de um Setembro Amarelo para fazer um carnaval de bandeirinhas amareladas em todos os campos, ignorando o motivo principal da existência deste mês.

Falar de uma relação mais humana entre humanos é trabalho para todos os 12 meses, todos os 365 dias do ano.

*Beta Boechat é publicitária da @FALA.agency e criadora de conteúdo no @betafala. Trans não-binária, é consultora das áreas de diversidade, gênero, LGBTQIA+ e body positivity.

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.

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